As pessoas de Almada, Seixal e Sesimbra suportam agora, a partir do passado dia 1 de Julho, o péssimo serviço que a Carris Metropolitana lhes enfiou pela garganta abaixo. Há menos carreiras e menos autocarros a circular; ficaram sem a ligação de Almada ao Areeiro, uma estupidez imperdoável que as privou do acesso directo à estação de comboios, do Metro, de várias carreiras de autocarros e da saída em linha recta para o aeroporto. Os moradores dizem que se “sentem enganados”; que Porto Brandão “está agora mais isolado do que antes”, que quem precisar de vir para Lisboa tem apenas três horários da parte da manhã. Nas palavras deles, “só quem não conhece a população é que podia ter feito um percurso e um horário assim”; e o serviço, tal como está, “não é compatível com as suas necessidades”.

Existe agora, desde esta última invenção, uma empresa chamada Transportes Metropolitanos de Lisboa (TML), entidade intermunicipal encarregada de gerir outra empresa, chamada Carris Metropolitana; e existe um cavalheiro, chamado Faustino Gomes, que preside a isto e presta declarações. Disse que “há questões estruturantes que não podem ser resolvidas de um dia para o outro”, uma resposta admirável pois “de um dia para o outro” é como ele chama aos três anos de idade que tem o projecto. E disse que tem “falta de motoristas para uma alteração total da rede”; só reparou agora?, em três anos não teve tempo de os contratar?

Este espantoso presidente, e os decisores políticos que o descobriram debaixo de uma pedra, já atiraram com o arranque total da operação lá para Janeiro de 2023, um adiamento superior a cinco meses. A TML aponta o dedo aos operadores privados, declarando que “a responsabilidade é dos prestadores de serviços”. Os operadores privados explicam-se com a escassez de matéria prima e de componentes no mercado internacional, em consequência da epidemia de covid-19 e, mais recentemente, da guerra na Ucrânia.

Já no princípio de Junho, há cerca de um mês, se ouviram queixas iguaizinhas sobre a balbúrdia que se passava nos concelhos de Alcochete, Moita, Montijo, Palmela e Setúbal, quando a Carris Metropolitana começou a perpetrar ali o seu lindo serviço. Ainda foi pior. Cerca de 90 porcento das carreiras, urbanas e interurbanas, não se realizaram porque os motoristas não conheciam os percursos, nem conheciam as paragens definidas pelo novo operador. Seguiam por caminhos errados e tinham de voltar para trás. Até que fizeram uma “paragem espontânea”, segundo informação do sindicalista da Fectrans – surpreendentemente, os sindicatos já tomaram conta disto.

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A ideia vem de 2018 e aprovaram-na em princípios de 2019. Foi o famoso “passe único”, de valor fixo em 30 ou 40 euros, consoante incluísse apenas um município ou a totalidade da Área Metropolitana de Lisboa – constituída por dezoito municípios. Uma ideia cozinhada entre Fernando Medina, na altura, presidente da Câmara Municipal de Lisboa, e o primeiro-ministro António Costa. É bom lembrar que, durante estes anos, Fernando Medina era também presidente, por inerência, da Área Metropolitana de Lisboa. Uma inerência que foi rapidamente afastada do caminho socialista assim que Carlos Moedas ganhou as eleições em Lisboa.

E foi sempre uma ideia muito mal explicada, percebendo-se desde a primeira hora que os valores não batiam certo. Como é que seria possível ter passes tão baratos? Afinal, contra os hábitos da Pátria, os dinheiros saíram dos orçamentos municipais mas também saíram do orçamento geral do Estado. Digamos as coisas de outra maneira, para bom entendimento dos simples: os dinheiros para pagar borlas de Lisboa e Porto saíram do bolso de todos os portugueses, dos que vivem nestes concelhos mas também dos que vivem no Alandroal, em Odemira, em Esposende ou na ilha do Corvo.

Mesmo assim, ou por isto mesmo, o projecto tinha tudo para correr mal, pela centralização no Estado, pela desresponsabilização, e pelo reforço do poder dos sindicatos. É o tipo de políticas clássicas dos governantes do PS: a empresa pública centraliza o poder e a glória; perante o fracasso, despejam-se as culpas no colo dos privados. E veremos quanto tempo vai durar este passe a 30 e a 40 euros, outro traço próprio dos governantes saídos daquela escola de benfeitores: plantam expectativas nas pessoas para, dois metros à frente, se perceber que o modelo fracassou e deu um estoiro no orçamento. Se Deus quiser, cá estará um governo da direita para acudir à bancarrota e para servir aos portugueses as políticas impopulares.

Por fim, a Área Metropolitana de Lisboa tem 2.821.316 habitantes. São quase três milhões. Esta irresponsabilidade interfere na vida de todos eles. Os pequenos estadistas Costa e Medina têm bons motivos para se orgulhar do que fabricaram. Só aqui, vão prejudicar, grave e directamente, quase 30 porcento da população portuguesa.