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REINO UNIDO
"Essa não é a vontade de Deus", dizem pais, que sabem que ao menos uma das crianças morrerá na cirurgia
Juiz ordena separação de irmãs siamesas
RICARDO GRINBAUM
DE LONDRES
A Justiça britânica autorizou
ontem cirurgiões a separar gêmeas siamesas, apesar da resistência dos pais. Eles são contra a
operação porque sabem que uma
das crianças morrerá.
Jodie e Mary nasceram em 8 de
agosto unidas pelo abdômen. Enquanto Jodie é ativa e alerta, Mary
depende das funções pulmonares
e do coração da irmã para sobreviver.
Sem a cirurgia, os médicos dizem que as crianças têm entre três
e seis meses de vida. Jodie tem
chances de levar uma vida normal
se for separada da irmã, segundo
os cirurgiões.
"Os pais amam ambas as crianças e, como o amor é igual, simplesmente não podem decidir sobre a vida de uma à custa de outra", disse o juiz Robert Johnson
na sentença.
Mas, prosseguiu o juiz, as evidências médicas indicam que a
criança mais saudável também
acabaria morrendo pela sobrecarga em seus pulmões e no coração.
"O sangue e o oxigênio que
mantêm a vida de Mary vêm de
Jodie. Nas palavras de um médico, Jodie é a sua máquina de sustentação da vida", disse o juiz.
Além disso, Johnson disse que
haveria o risco de ocorrer o que os
médicos chamam de "cenário
horrendo" -como Mary não
tem pulmões, não conseguiria
chorar e reagir se Jodie a arrastasse e a ferisse.
Os pais não compareceram à seção da Justiça porque estão muito
abalados emocionalmente. Muito
religiosos, eles são de um povoado no Leste Europeu não identificado pela Justiça.
Como os hospitais de seu país
não estão aparelhados para cuidar das gêmeas, o casal veio para o
Reino Unido. O parto foi realizado no hospital St. Mary's, em
Manchester, mas a cirurgia de separação das gêmeas deve ser feita
em Londres.
"Nós não podemos aceitar ou
contemplar a possibilidade de
que uma de nossas filhas morra
para permitir que a outra sobreviva. Essa não é a vontade de Deus",
disseram os pais.
Em sua sentença, o juiz diz ter
levado em conta a opinião dos
pais, mas a decisão foi favorável
ao julgamento médico. "Se as
crianças forem separadas, Jodie
poderá ter uma vida relativamente normal, provavelmente andando sem ajuda, frequentando a escola e apta a ter filhos."
A decisão criou um precedente
na Justiça do Reino Unido, dando
maior peso à palavra dos médicos
do que ao desejo dos pais. Também já começou a provocar polêmica.
Richard Nicholson, editor do
Boletim de Ética Médica, disse
que a decisão foi simplista. "Pode
até haver momentos em que, talvez, os pais estejam certos e nenhuma instituição deva fazer esse
tipo de escolha entre crianças."
Mas a decisão não significa que
a sorte das duas crianças já está
definida. Os pais querem recorrer
da sentença e impedir a operação.
Além disso, a cirurgia de separação das siamesas oferece muitos
riscos.
De doze operações de separação
de siameses realizadas no hospital
Great Ormond, de Londres, sete
pares de gêmeos sobreviveram.
Na Itália, ocorreu um caso parecido com o de Marie e Jodie recentemente, mas as gêmeas morreram. As duas crianças peruanas
nasceram unidas pelo coração, e
os médicos italianos escolheram a
mais forte delas para viver. Mas a
pressão sobre o coração durante a
cirurgia foi muito grande e as
duas garotas morreram.
A Igreja Católica não se opôs à
tentativa de separar as gêmeas.
Segundo um representante da
igreja, a operação era legítima e
não poderia ser condenada porque o objetivo era salvar a vida de
pelo menos uma das crianças.
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