Charlie Munger: conheça o "braço direito" de Warren Buffett

Charlie Munger: o “braço direito” de Buffett que se tornou ícone do mercado financeiro

Sócio e amigo próximo de Warren Buffett, Charlie Munger faleceu em 28 de novembro de 2023 na Califórnia, aos 99 anos

Charlie Munger
Nome completo:Charles Thomas Munger
Apelido:“Charlie”
Nascimento:1º de janeiro de 1924 – Omaha, Nebraska, EUA
Falecimento:28 de novembro de 2023 – Califórnia, EUA
Formação:Direito pela Universidade de Harvard, com distinção acadêmica em Jurisprudência
Ocupação:Advogado, investidor e filantropo
Principais atividades profissionais:Vice-presidente do Berkshire Hathaway
Fortuna:US$ 2,2 bilhões (2023)*
* Dados da Forbes

Sócio de Warren Buffett na Berkshire Hathaway e amigo do megainvestidor há mais de 60 anos, Charlie Munger faleceu no dia 28 de novembro de 2023 em um hospital na Califórnia, aos 99 anos.

Em comunicado oficial da holding, Buffett – então CEO da empresa – afirmou que “A Berkshire Hathaway não poderia ter chegado ao seu status atual sem a inspiração, sabedoria e participação de Charlie”.

Charles Thomas Munger – ou Charlie, como ficou conhecido – era vice-presidente do conglomerado Berkshire Hathaway – comandado por Buffett, e influenciou gerações como um dos grandes pensadores e estrategistas do mundo dos investimentos.

Discípulo do economista Benjamin Graham (1894-1976), considerado o pioneiro na estratégia “buy and hold” de investimento em ações –  jargão do mercado financeiro que significa, em tradução livre, “comprar e segurar”, quando o investidor compra ativos e os mantém por um longo período – Munger também se valia de conceitos relacionados à psicologia para interpretar o comportamento de investidores e fazer prognósticos sobre o mercado. 

Segundo a Forbes, Charlie Munger deixou uma fortuna de US$ 2,2 bilhões.

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Quem foi Charlie Munger?

Charlie Munger nasceu em Omaha, no estado de Nebraska, nos Estados Unidos, em  1º de janeiro de 1924. Filho do advogado Alfred Charles Munger e de Florence Munger, ele foi fortemente influenciado pelo avô, o juiz Thomas Charles Munger, muito rigoroso com a vida financeira da família – eram frequentes seus conselhos para que o garoto economizasse e evitasse jogos de azar e outros “vícios” na vida adulta.

Quando criança, Charlie teve uma vida sem regalias e começou a trabalhar logo cedo na mercearia Buffett & Son, cujo dono era o avô de Warren Buffett. O garoto ganhava US$ 2 por hora de trabalho e, seguindo as orientações que recebia em casa, evitava extravagâncias e procurava economizar o máximo possível. 

Aos 19 anos, matriculou-se na Universidade de Michigan para estudar matemática. Teve de interromper o curso em 1943, quando se alistou no Exército para a Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Serviu nas Forças Armadas até 1946, deixando a corporação como Segundo Tenente da Força Aérea dos EUA. Durante o serviço militar, estudou no California Institute of Technology (Caltech), em Pasadena. 

Passando por algumas universidades, Charlie estudou matemática, física e meteorologia – mas não tinha um diploma de graduação, apenas cursos avançados. Isso quase o impediu de estudar Direito na Universidade de Harvard, mas a influência do pai advogado – amigo do reitor da instituição – foi determinante para garantir os estudos do jovem. Formou-se em Direito em 1948, obtendo uma distinção acadêmica em Jurisprudência, e seguiu rumo à Califórnia para exercer a profissão. 

O advogado recém-formado começou a trabalhar no escritório Weight & Garrett, mas não demorou a abrir o seu próprio escritório de advocacia em Los Angeles: o Munger, Tolles & Olson, com foco no mercado imobiliário. 

Casamentos, divórcio e a morte trágica do filho

Charlie também se casou cedo, aos 21 anos, em 1945, com Nancy Huggins Freeman. O casal teve três filhos. O casamento aconteceu quando Munger ainda era estudante de Direito. 

Mas as responsabilidades da vida adulta e a necessidade de conciliar os estudos acadêmicos com as tarefas profissionais e obrigações familiares afetaram a relação conjugal. O casal se divorciou em 1953, depois de oito anos. Nancy morreu em julho de 2002, aos 76 anos, em decorrência de um câncer. 

O divórcio, ainda muito estigmatizado na época, foi um trauma para Charlie. O processo se arrastou nos tribunais e, ao fim do litígio, Nancy ficou com a única propriedade da família, uma casa em Pasadena. Amigos próximos afirmam que Charlie se abateu, passou por uma depressão e sofreu um colapso financeiro. 

Em meio a tanto sofrimento, o pior ainda estaria por vir. Um ano após o divórcio, o filho mais novo de Charlie e Nancy, Teddy, de oito anos, foi diagnosticado com leucemia. O duro tratamento não deu os resultados esperados, pois a doença já se encontrava em estágio avançado. A criança perdeu a visão de um dos olhos e morreu um ano depois do diagnóstico. 

Tentando se reconstruir emocional e financeiramente, Charlie Munger se casou novamente em 1956 e voltou para Omaha. Sua segunda esposa foi a economista Nancy Barry, que já era mãe de duas crianças. O casal teve outros quatro filhos juntos. Eles ficaram casados por mais de 50 anos, até 6 de fevereiro de 2010, data da morte de Nancy, aos 86 anos. 

Como Charlie Munger e Warren Buffett se conheceram

Foi em uma confraternização no Johnny Café, em Omaha, em 1959, que os destinos de Charlie Munger e Warren Buffett se cruzaram. Um amigo em comum os apresentou durante um jantar, e a afinidade foi recíproca e imediata.

Charlie e Buffett passaram a conversar com frequência e quase não acreditaram na coincidência de Munger ter trabalhado, quando criança, na mercearia do avô de Warren. Como Charlie é seis anos mais velho, eles não haviam se conhecido naquela época – Buffett ainda era muito novo.

Quando se tornou amigo de Munger, Buffett já engatinhava no mundo dos investimentos. Ele tinha o próprio escritório e fazia “bicos” como vendedor na empresa do pai. À medida que a relação entre os dois se estreitava, Buffett se consolidava como uma espécie de consultor informal de Charlie, orientando-o sobre decisões financeiras. 

Um império chamado Berkshire Hathaway

A origem da empresa hoje comandada por Warren Buffett remete a 1841, ano de fundação da Valley Falls Company, destinada à fabricação de produtos têxteis. Em 1923, houve a fusão da Valley Falls com a Companhia de Algodão Berkshire (criada em 1889), dando origem à Berkshire Fine Spinning Associates. 

Em 1955, uma nova fusão: desta vez entre a Berkshire Fine Spinning e a Companhia Manufaturada Hathaway, fundada em 1888. Sete anos depois, a partir de 1962, Warren Buffett iniciou a compra de algumas ações da empresa. Pouco depois, já havia adquirido papéis suficientes para comandar a companhia. 

No mesmo ano de 1962, Charlie se uniu a Jack Wheeler para fundar sua própria empresa de investimentos, a Wheeler & Munger Company. Em um período de 13 anos, até 1975, a parceria foi muito bem sucedida: Munger obteve uma taxa de retorno anual de quase 20% (quatro vezes a taxa média de juros do mercado naquele momento). 

Diante de um desempenho tão bem sucedido, Buffett não teve dúvidas: convidou o amigo para ser vice-presidente da Berkshire Hathaway. Na verdade, a oferta já havia sido feita em outras ocasiões, mas Charlie não se sentia seguro para abandonar a advocacia. 

Em 1978, ele finalmente decidiu fechar o escritório, abandonar o trabalho como advogado e se unir ao amigo na empreitada. Antes de ocupar a vice-presidência do conglomerado de Buffett, Charlie Munger também foi presidente da Wesco Financial Corporation (hoje subsidiária da Berkshire).

Atualmente, a Berkshire Hathaway é um gigante avaliado em mais de US$ 870 bilhões e conta com participações em uma série de empresas de escala global, entre as quais Coca-Cola, Kraft-Heinz, Geico e Bank of America.

Uma vez por ano, a Berkshire promove um encontro entre seus acionistas em Omaha. O último foi realizado em abril de 2022, depois de um hiato de dois anos sem reuniões presenciais em decorrência da pandemia de Covid-19. O evento é conhecido como a “Woodstock dos capitalistas”, em alusão ao icônico festival de rock realizado em 1969, e costuma atrair milhares de pessoas à cidade. 

Em seus encontros anuais, os acionistas da Berkshire Hathaway definem os rumos da empresa para os anos seguintes e compartilham experiências e análises sobre o mercado financeiro.

As reuniões servem como balizas para investidores, economistas, empresários e também para os demais acionistas, que têm acesso a informações sobre o cenário econômico, tendências, dados de governança corporativa, entre outros temas. 

Charlie Munger e o “Value Investing”

Guiado pela estratégia “buy and hold”, Charlie Munger se notabilizou por atuar como um investidor focado no longo prazo. Segundo ele, é necessário ter prudência e paciência ao comprar ações, além de um profundo conhecimento acerca dos fundamentos de uma empresa antes da tomada de decisão no mercado. Munger dizia ainda que o bom investidor deve saber esperar, mas precisa estar atento para não desperdiçar uma boa oportunidade. 

A estratégia de investimento de Charlie Munger se baseava no conceito de “value investing” (“investimento em valor”, em tradução livre). Trata-se de um tipo de atuação que aposta no potencial de valor das empresas no longo prazo, e não simplesmente em seu valor de mercado atual ou no volume de transações efetuadas na Bolsa. Em linhas gerais, os adeptos do “value investing” buscam investir em empresas nas quais têm maior confiança e com as quais têm alguma identificação. 

Para ter sucesso por meio do “value investing”, Munger enumerava alguns pontos considerados essenciais para o investidor. Ele recomendava que esses itens fossem acompanhados em todas as análises e rigorosamente cumpridos. É quase uma receita para o sucesso, composta por dez tópicos:

  • Risco
  • Independência
  • Preparação
  • Humildade intelectual
  • Rigor analítico
  • Diversificação
  • Paciência
  • Determinação
  • Mudança
  • Foco

Como se tornar um milionário

Nos últimos anos de vida, Charlie Munger costumava afirmar publicamente que está muito mais difícil para os investidores de hoje se tornarem milionários do que na época em que ele e Warren Buffett eram jovens. 

Segundo o vice-presidente da Berkshire, por muito tempo, bastava “possuir um portfólio diversificado de ações ordinárias” para alcançar potencial retorno de 10% – o que não seria mais uma garantia atualmente, dada a maior complexidade dos investimentos e a volatilidade do mercado.  

“Quando eu estava na Harvard Law School, raramente negociávamos 1 milhão de ações por dia. Agora negociamos bilhões. Não precisamos de um mercado de ações tão líquido”, afirmou em entrevista à CNBC. 

De acordo com Munger, tem sido uma tarefa ingrata dar conselhos de “investimento de tamanho único” aos jovens. “Não acho que o futuro dará a quem sai hoje da faculdade uma oportunidade real de investimento tão fácil”, admite. 

De qualquer forma, apesar de um cenário bem mais hostil na atualidade, Charlie Munger continuou sendo muito procurado por investidores iniciantes até o final de sua vida.

O bilionário afirmava ainda que é crucial aceitar as mudanças do mercado, aprender sempre, conhecer as próprias competências, ter uma visão ampla das empresas e estudar muito, preferencialmente lendo livros especializados no assunto. 

Segundo a filosofia de investimento defendida por Munger, o foco deve ser sempre o de minimizar os riscos. Para isso, é importante limitar a carteira de investimentos a um seleto grupo de ações. A simplicidade, para Charlie, é um ativo do qual não se deve abrir mão.  

“Ao nos permitirmos entender melhor o que estamos fazendo, a simplicidade é capaz de melhorar o desempenho. Se algo for muito difícil, recorremos a outra situação, a outro ativo. O que pode ser mais fácil do que isso? Somos apaixonados por tornar as coisas simples”, diz. 

Pouco antes de morrer, Charlie Munger doou parte de sua fortuna a um gestor de fundos que está tentando construir uma versão australiana da Berkshire Hathaway. 

Com décadas de vivência no mercado financeiro e forjado em um ambiente marcado por incertezas e instabilidades, Charlie Munger propagou seus ideais e uma filosofia de investimento que, em última análise, pode ser interpretada como um modo de enxergar a própria vida. 

“A economia às vezes cresce, às vezes não. Você deve viver sua vida em ambos os momentos. Sua atitude deve ser continuar nadando”, explicou em entrevista ao canal Freenvesting no YouTube, em agosto de 2022. 

“Às vezes, a maré está a nosso favor. Em outras situações, está contra nós. Mas continuamos nadando de qualquer maneira.” Charlie não parou de nadar até o fim.