Principais Notícias do Mês – Abril de 2024

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA – STJ

01/04/2024

Valor da causa em ação monitória não embargada pode ser alterado só até expedição do mandado

Nos processos de conhecimento pelo rito da ação monitória, nos casos em que não houver a oposição de embargos monitórios, o juízo só pode alterar o valor da causa de ofício ou por arbitramento até a expedição do mandado de pagamento. Após a publicação da sentença, o juízo pode modificar o valor da causa apenas para corrigir – de ofício ou a requerimento da parte – imprecisões materiais ou erros de cálculo, ou, ainda, em decisão em embargos de declaração, nos termos do artigo 494 do Código de Processo Civil (CPC).

O entendimento foi estabelecido pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao reformar acórdão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) segundo o qual seria dever do juízo, caso constate que o conteúdo patrimonial em discussão não corresponde ao valor atribuído à ação monitória, corrigir de ofício o valor da causa, na forma do artigo 292 do CPC.

De acordo com os autos, a ré da ação monitória fez o depósito judicial do valor que constava tanto da petição inicial quanto do mandado de pagamento expedido pelo juízo. Após a quitação, contudo, a autora da ação impugnou a quantia e requereu o aditamento da petição inicial para retificação do valor da causa.

Em primeiro grau, o juízo entendeu que a autora comprovou a ocorrência de erro material e, assim, autorizou a correção do valor da causa e determinou que a ré complementasse o montante depositado judicialmente. A decisão foi mantida pelo TJDFT.

Sem os embargos, decisão que expede o mandado tem eficácia de sentença condenatória

A relatora do recurso especial, ministra Nancy Andrighi, explicou que, na ação de conhecimento pelo rito da monitória, quando não há oposição dos embargos monitórios, a decisão que determina a expedição do mandado de pagamento tem eficácia de sentença condenatória e faz coisa julgada, tendo como resultado ou a formação do título executivo judicial ou o cumprimento do mandado de pagamento pelo réu antes da constituição do título executivo.

Em relação ao valor da causa, a ministra comentou que a correção do montante indicado na petição inicial, quando ele não corresponder ao conteúdo patrimonial ou ao proveito econômico buscado, pode ser feita pelo juízo até a prolação da sentença – ou seja, até a decisão que determina a expedição do mandado de pagamento, caso não tenha havido oposição de embargos.

“Após a publicação da sentença, o juiz apenas poderá alterá-la para corrigir, de ofício ou a requerimento da parte, inexatidões materiais ou erros de cálculo; ou por meio de embargos de declaração, nos termos do artigo 494 do CPC”, completou.

Na hipótese dos autos, Nancy Andrighi entendeu que, como a correção do valor da causa ocorreu após a expedição do mandado de pagamento, a determinação violou o princípio da inalterabilidade das decisões judiciais.

“Por se tratar de ação com rito monitório em que não houve oposição de embargos, a decisão que expediu o mandado de pagamento teve eficácia de sentença condenatória. Com o cumprimento do mandado de pagamento pela recorrente, a sentença fez coisa julgada, de forma que o juiz não poderia ter alterado o valor da causa após o depósito judicial”, apontou.

Ao dar provimento ao recurso para manter o valor inicial da causa, a relatora disse que o caso dos autos não envolveu simples erro material, pois a suposta incorreção decorreu de falta de diligência da parte autora. Adicionalmente, a ministra considerou que, caso houvesse a correção do valor da causa após o pagamento do montante indicado no mandado, haveria efetivo prejuízo à parte ré.

Leia o acórdão no REsp 2.038.384.

02/04/2024

Tribunais não entenderam precedentes do STJ sobre Airbnb, diz ministra

A 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça começou a julgar nesta terça-feira (2/4) mais um caso em que um condomínio tenta se opor à locação de unidades por temporada, usualmente feita por meio de aplicativos como o Airbnb.

O recurso foi levado a julgamento porque, apesar de ambas as turmas de Direito Privado do STJ já terem se posicionado sobre o tema, os tribunais de segundo grau não compreenderam bem as razões de decidir, e isso vem causando dispersão jurisprudencial.

A análise é da ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso especial que ataca um acórdão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais. O julgamento foi interrompido por pedido de vista do ministro Moura Ribeiro, para melhor análise.

“Está acontecendo que o tribunal de origem interpretou nossos leading cases de forma parcialmente correta. Por isso, precisamos trazer esse caso para que, em um voto longo, bem fundamentado, se esclareça o que quisemos dizer”, disse a relatora.

Em sua análise, isso está ocorrendo também porque os votos nos precedentes são profundamente longos e complexos. “Por isso os tribunais não estão entendendo. Está na hora de esclarecermos.”

Pode ou não pode?

No recurso em questão, um condomínio tenta impedir o proprietário de uma unidade de fazer locação por temporada. A alegação é de que a relação jurídica entre o dono do apartamento e o Airbnb é atípica e, assim, assemelha-se ao contrato de hospedagem.

Como a convenção do condomínio proíbe a prática da atividade de hotelaria e a locação para fins de comércio ou qualquer atividade não residencial, o autor da ação defende que é possível obrigar o proprietário a se abster de anunciar o imóvel em plataformas digitais como o Airbnb.

Como houve pedido de vista, a ministra Nancy Andrighi não leu o voto, mas apontou na ementa que os precedentes do STJ, de fato, fixaram que o contrato celebrado entre proprietários de imóveis e locadores por meio de apps é atípico.

Isso significa que não se aplicam as regras de locação residencial por temporada da Lei de Locações (Lei 8.245/1991) e também as normas de hospedagem e hotelaria da Lei Geral de Turismo (Lei 11.771/2008).

Assim, na prática, esse tipo de contrato atípico só pode produzir efeito quando existir uma permissão de destinação híbrida dos imóveis na convenção do condomínio.

“Ou seja, tais contratos são válidos entre os contratantes (proprietário e hóspede), porém ineficazes perante o condomínio enquanto houver previsão em convenção de destinação pura e exclusivamente residencial”, explicou a ministra Nancy.

O voto da relatora é por negar provimento ao recurso especial do condomínio, mantendo o resultado do TJ-MG. Mas a fundamentação, no que importa, é diferente.

O tribunal mineiro entendeu que se a convenção de condomínio não veda expressamente a locação da unidade por curta temporada, não cabe a vedação que se tenta impor ao proprietário da unidade.

Dispersão de argumentação

Nas duas vezes em que enfrentaram o tema, as turmas de Direito Privado do STJ entenderam que é possível ao condomínio impor restrições ao uso de suas unidades para aluguel por temporada, como os praticados por plataformas como o Airbnb.

Como mostrou a revista eletrônica Consultor Jurídico, nas duas oportunidades houve votos divergentes e dispersão de argumentação, resultados que dividiram opiniões dos advogados especialistas consultados.

No caso julgado pela 4ª Turma, o ministro Antonio Carlos Ferreira chegou a contestar se o recurso sequer formaria precedente.

Já na 3ª Turma, o resultado foi unânime, mas as diferenças de fundamentação foram substanciais. Não houve unanimidade, por exemplo, sobre o caráter de atípico desse contrato de hospedagem, que acabou sendo fundamental para resolver a questão.

Essas diferenças reverberam ainda hoje. O ministro Villas Bôas Cueva, por exemplo, citou a distinção feita no voto da ministra Nancy Andrighi no sentido de que a exigência não é de que a convenção de condomínio proíba o aluguel por temporada, mas que haja uma permissão. “Será que foi isso que decidimos? Creio que não.”

Para o ministro Marco Aurélio Bellizze, a discussão a ser travada pela 3ª Turma é sobre se o contrato por temporada, previsto na Lei de Locação, descaracteriza a locação residencial.

“Se entendermos que sim, não vamos aceitar (ou seja, não será possível a locação por Airbnb). Se entendermos que não, o condomínio até poderá, futuramente, proibir a locação de curta temporada. Mas, se ela mantém o caráter residencial, então até agora (no caso concreto) isso não se choca com a convenção. É isso que vou aguardar da vista, para pensar melhor.”

REsp 2.121.055

 

https://www.conjur.com.br/2024-abr-02/tribunais-nao-entenderam-precedentes-do-stj-sobre-airbnb-diz-ministra/

 

04/04/2024

Uso de água mineral retirada do subsolo para processos industriais depende de autorização federal

A Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu que é indispensável a autorização federal para utilização de água mineral obtida diretamente do solo como insumo em processo industrial, ainda que ela não seja destinada ao consumo humano.

O entendimento foi fixado pelo colegiado ao reformar acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) que, confirmando sentença de improcedência de ação popular, considerou suficiente a autorização do poder público estadual para o uso de água termomineral por uma indústria de café.

Segundo o TRF4, não haveria obrigatoriedade de prévia autorização do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) – substituído pela Agência Nacional de Mineração (ANM) – para uso da água retirada do solo em processos industriais, pois a permissão seria necessária apenas nas hipóteses de extração para consumo humano ou para fins balneários.

Relator do recurso do Ministério Público Federal, o ministro Paulo Sérgio Domingues lembrou que o artigo 20, inciso IX, da Constituição Federal prevê que são bens da União os recursos minerais, inclusive aqueles depositados no subsolo.

O ministro também explicou que, conforme definido no artigo 1º do Decreto-Lei 7.841/1945, águas minerais são aquelas oriundas de fontes naturais ou fontes artificialmente captadas que possuam composição química distinta das águas comuns, com características que lhes confiram ação medicamentosa.

Caracterização da água como mineral não advém de sua destinação

Para Paulo Sérgio Domingues, diferentemente do entendimento do TRF4, o que caracteriza a água como mineral – e, por consequência, define a necessidade de autorização e fiscalização federais para sua exploração – é a composição química, e não a finalidade para a qual será destinada (industrial ou consumo humano, por exemplo).

O relator reforçou que a legislação brasileira protege o possível interesse da União por um ativo econômico natural do poder público, de forma que o recurso não poderia ser explorado sem a autorização federal.

“A fiscalização e a análise da água pelo DNPM, hoje realizadas pela ANM, não têm como objetivo somente a verificação de suas propriedades para fins de saúde da população que pode vir a consumi-la. É uma atividade que visa o resguardo dos interesses da União no bem natural, respeitando imperativos de predominância do interesse público sobre o particular e de desenvolvimento no interesse nacional”, concluiu o ministro ao julgar procedente a ação popular.

Leia o acórdão no REsp 1.490.603.

https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/2024/04042024-Uso-de-agua-mineral-retirada-do-subsolo-para-processos-industriais-depende-de-autorizacao-federal.aspx

08/04/2024

Prazo para pedido principal após efetivação da tutela cautelar antecedente é contado em dias úteis

Em julgamento de embargos de divergência, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu que o prazo de 30 dias para a formulação do pedido principal, após a efetivação da tutela cautelar antecedente (artigo 308 do Código de Processo Civil), tem natureza processual e, portanto, deve ser contado em dias úteis, nos termos do artigo 219 do CPC.

Com essa decisão, o colegiado pacificou entendimentos divergentes entre a Terceira Turma (que entendia que o prazo seria processual e deveria ser contado em dias úteis) e a Primeira Turma (segundo a qual o prazo seria decadencial e deveria ser contado em dias corridos).

O relator dos embargos de divergência foi o ministro Sebastião Reis Junior. Para ele, a regulação da tutela cautelar antecedente sofreu alterações importantes entre o CPC/1973 e o CPC/2015, especialmente porque o pedido principal, após a efetivação da tutela cautelar, deixou de ser apresentado em ação autônoma e passou a integrar o mesmo processo do requerimento cautelar.

Citando doutrina, ele explicou que o prazo material (prescricional ou decadencial) diz respeito ao momento para a parte praticar determinado ato fora do processo, enquanto o prazo processual se relaciona ao momento para praticar atos que geram efeitos no processo. Nesse sentido, reforçou o ministro, as normas processuais operam exclusivamente dentro do processo, disciplinando as relações inerentes a ele.

Novo CPC definiu processo único, com etapas para análise da cautelar e do pedido principal

Segundo Sebastião Reis Junior, com o novo CPC, existe apenas um processo, com uma etapa inicial relativa à tutela cautelar antecedente e uma etapa posterior de apresentação do pedido principal, com possibilidade de ampliação da abrangência da ação.

“Resta claro que o prazo de 30 dias previsto no artigo 308 do CPC é para a prática de ato no mesmo processo. A consequência para a não formulação do pedido principal no prazo de 30 dias é a perda da eficácia da medida concedida (artigo 309, inciso II, do CPC/2015), sem afetar o direito material”, completou.

No entendimento do ministro, a inovação legislativa, com a alteração profunda do sistema da tutela cautelar antecedente, deixa claro que o prazo do artigo 308 do CPC/2015 é processual. “Como desdobramento lógico, sua contagem deverá ser realizada apenas considerando os dias úteis”, concluiu.

https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/2024/08042024-Prazo-para-pedido-principal-apos-efetivacao-da-tutela-cautelar-antecedente-e-contado-em-dias-uteis.aspx

09/04/2024

Lucros cessantes não são presumidos quando comprador de imóvel pede rescisão do contrato por atraso

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, por maioria de votos, que o dano que poderia justificar a indenização por lucros cessantes decorrentes do atraso na entrega de imóvel não é presumível, caso o comprador, em razão da demora, tenha pedido a rescisão contratual.

Ao dar provimento ao recurso de uma construtora, o colegiado estabeleceu uma distinção entre o caso sob análise e a jurisprudência da corte, que admite a presunção de lucros cessantes em razão do descumprimento do prazo para entrega de imóvel, nos casos em que o comprador deseja manter o vínculo contratual – circunstância em que ele não precisa provar os lucros cessantes, pois estes são presumidos.

“Como o autor escolheu a rescisão do contrato, nunca terá o bem em seu patrimônio, de forma que sua pretensão resolutória é incompatível com o postulado ganho relacionado à renda mensal que seria gerada pelo imóvel”, afirmou a ministra Isabel Gallotti, autora do voto que foi acompanhado pela maioria da turma julgadora.

Recorrentes alegam que deixaram de lucrar com aluguel do imóvel

Na origem do caso, os sucessores do comprador acionaram a Justiça buscando a rescisão do contrato, além de perdas e danos, em função do atraso na entrega do imóvel vendido na planta pela construtora.

Em primeira instância, a empresa foi condenada a pagar indenização por lucros cessantes. O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), entretanto, reformou a decisão para reconhecer que não seria possível acumular essa indenização com o pedido de rescisão contratual.

Ao STJ, os autores da ação defenderam o direito à indenização, alegando que o atraso da obra impediu que eles lucrassem com o aluguel do imóvel. Amparado pela jurisprudência da corte, o relator, ministro Marco Buzzi, em decisão monocrática, restabeleceu a condenação da construtora, sob o fundamento de que os lucros cessantes seriam presumidos no caso de atraso na entrega de imóvel.

Caso difere de precedentes do STJ

No colegiado, porém, prevaleceu o voto divergente da ministra Isabel Gallotti, no sentido de distinguir o caso dos precedentes julgados pelo tribunal. De acordo com a magistrada, a situação na qual o adquirente busca a resolução do contrato é diferente daquela em que ele ainda espera receber o imóvel comprado na planta.

Nessa última hipótese, detalhou a ministra, a presunção de lucros cessantes ocorre de acordo com a regra do artigo 475 do Código Civil, pois o comprador se viu privado da posse do bem na data combinada e, por isso, precisou custear outra moradia, ou deixou de alugar o imóvel durante o período de atraso.

“Neste caso, a jurisprudência do STJ é firme em estabelecer que são presumidos os lucros cessantes, pois esses abrangeriam o ‘interesse positivo’ ao trazer ao compromissário a mais-valia do negócio”, explicou.

Resolução contratual repõe o patrimônio do comprador

No entanto, Isabel Gallotti explicou que, se o credor opta pela resolução do contrato, ele tem direito à restituição integral do valor corrigido e aos juros aplicáveis – o que corresponderia à reposição de seu patrimônio caso não tivesse efetivado o negócio.

Dessa forma, prosseguiu a ministra, os prejuízos materiais decorrentes seriam sanados pela devolução de toda a quantia com os encargos legais, o que torna indevida a indenização por aluguéis desse mesmo imóvel, afastando-se a presunção de prejuízo.

Assim, de acordo com Gallotti, os lucros cessantes – na hipótese de interesse contratual negativo – não são presumidos, devendo ser cabalmente demonstrados se houver a alegação de que a devolução integral da quantia paga, com os encargos legais, não é suficiente para recompor a situação patrimonial do credor caso o negócio não houvesse existido.

09/04/2024

STJ veta seguidas revisões de multa por decisão descumprida

A multa por descumprimento de decisão judicial pode ser alterada ou até excluída pelo juiz a qualquer momento. Uma vez feita a alteração, no entanto, não serão lícitas novas e sucessivas revisões, sob pena de desestimular que o devedor cumpra a obrigação.

Essa é a conclusão da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, que decidiu por maioria apertada de votos que o Poder Judiciário deve ser mais rigoroso no trato daqueles que se recusam a cumprir uma ordem judicial.

O caso julgado trata de um banco que firmou acordo com um devedor. O homem se dispôs a quitar dívida de R$ 1,9 mil e a instituição se comprometeu a retirar o gravame que incidia sobre seu nome.

A obrigação foi firmada em 2010 e, 14 anos depois, o banco ainda não fez a sua parte. Nesse período, a única medida tomada pela instituição financeira foi solicitar várias vezes a redução da multa diária aplicada contra ela pelo descumprimento da obrigação.

Tanto o valor da multa diária quanto o montante total que ela alcançou foram alterados pelo Judiciário mais de uma vez e, mesmo assim, a instituição financeira não cumpriu a obrigação de retirar o gravame.

A última impugnação foi feita quando o homem promoveu execução no valor de R$ 529 mil, valor que hoje, atualizado, já ultrapassa R$ 735 mil. Essa tentativa do banco foi rejeitada por 6 a votos a 5 pela Corte Especial do STJ.

Efeito prospectivo

A corrente vencedora, que rejeitou o pedido do banco, foi formada por duas linhas de argumentação.

O primeiro voto divergente foi do ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, para quem a decisão que altera o valor da multa diária deve ter efeitos prospectivos — ou seja, o valor acumulado até esse momento específico não deve ser alterado.

Para Cueva, essa foi a intenção do legislador quando colocou no artigo 537, parágrafo 1º, do Código de Processo Civil que o juiz poderá modificar o valor ou a periodicidade da “multa vincenda”.

“Só tem direito à redução da multa aquele que abandona a recalcitrância. Trata-se de espécie de sanção premial, consequência jurídica positiva para estimular o comportamento indicado pela norma legal, independentemente de sua natureza”, disse o magistrado.

Além disso, ele defende a ocorrência da preclusão pro judicato ao caso, segundo a qual não cabe ao juiz apreciar uma questão que já foi decidida. No julgamento da semana passada, após voto-vista do ministro Raul Araújo, Cueva esmiuçou melhor essa posição.

“É possível, sim, modificar uma decisão que comina multa por descumprimento de decisão judicial. Mas não é licito modificar o que já foi modificado.”

Em sua análise, essa posição não fere a tese do Tema 706 dos recursos repetitivos, segundo a qual “a decisão que comina astreintes não preclui, não fazendo tampouco coisa julgada”.

“Uma vez fixada a multa, é possível alterá-la ou excluí-la a qualquer momento. No entanto, uma vez reduzido o valor, não serão lícitas sucessivas revisões ao talante do inadimplente recalcitrante, sob pena de estimular e premiar renitência sem justa causa.”

Depende do motivo

A outra linha de argumentação foi apresentada em voto da ministra Nancy Andrighi. Para ela, o valor da multa ou o montante total acumulado podem ser seguidamente alterados, desde que exista causa superveniente para isso em cada ocasião.

“A mudança sem uma circunstância superveniente que a justifique não deve ser admitida”, explicou a magistrada. Em sua análise, esse é o caso julgado: não há motivo que autorize o banco a, mais uma vez, solicitar a redução do valor da multa.

Na conclusão, o voto dela acompanha o do ministro Cueva. Também chegaram ao mesmo resultado e formaram a maioria os ministros Herman Benjamin, Benedito Gonçalves, Antonio Carlos Ferreira e Sebastião Reis Júnior.

Engessamento desnecessário

Ficou vencido o relator, ministro Francisco Falcão, que votou por autorizar a redução do excessivo valor acumulado a título de multa. Ele foi acompanhado pelos ministros Humberto Martins, Luis Felipe Salomão, Mauro Campbell e Raul Araújo.

Para Salomão, o STJ não deveria “engessar” a análise do tema. “Se amarramos o julgador, estamos em uma situação em que se poderá verificar uma enorme dificuldade em situações extraordinárias. Ficaríamos aqui de mãos atadas.”

Já Raul Araújo afirmou que a posição da divergência afronta a tese do Tema 706. “Quando dizemos que o juiz pode rever a multa a qualquer tempo, não estamos tirando a segurança jurídica. Cabe ao julgador aplicar ou não essa possibilidade.”

EAREsp 1.766.665

10/04/2024

Plano de saúde deve custear transporte se município ou cidades vizinhas não oferecem atendimento

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a operadora de plano de saúde, quando não houver possibilidade de atendimento do beneficiário no município onde surgiu a demanda, ou em outro que faça fronteira com ele, deve custear o transporte de ida e volta para uma cidade que ofereça o serviço médico necessário, na mesma região de saúde ou fora dela, e independentemente de ser o prestador do serviço credenciado ou não pelo plano.

As regiões de saúde, nos termos do artigo 2º do Decreto 7.508/2011, são áreas geográficas formadas por agrupamentos de municípios limítrofes, organizados com a finalidade de integrar o planejamento e a execução de serviços de saúde – tanto os prestados pelas operadoras de saúde suplementar quanto os do Sistema Único de Saúde (SUS).

De acordo com a Terceira Turma, se não existir prestador de serviço credenciado na cidade em que houve a demanda de saúde do beneficiário, a operadora deverá garantir o atendimento em: a) prestador não integrante da rede de assistência no município da demanda; b) prestador integrante ou não da rede de assistência, em município limítrofe ao da demanda; c) prestador integrante ou não da rede de assistência, em município não limítrofe ao da demanda, mas que pertença à mesma região de saúde – garantindo, nesse caso, o transporte do beneficiário; d) prestador integrante ou não da rede de assistência, em município que não pertença à mesma região de saúde – também custeando o transporte de ida e volta.

O entendimento foi estabelecido pela turma julgadora ao manter decisão da Justiça de São Paulo que condenou uma operadora a fornecer transporte a um beneficiário do plano, morador de Tatuí, para o tratamento em hospital de Sorocaba. A condenação foi fixada em primeira instância e mantida pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP).

Em recurso especial, a operadora sustentou que não estaria obrigada a custear ou reembolsar as despesas de transporte, porque já garantia ao beneficiário o atendimento em hospital que não ficava na cidade onde ele morava, embora pertencesse à mesma região de saúde.

Organização das regiões de saúde não pode prejudicar coberturas contratadas no plano

Relatora do recurso, a ministra Nancy Andrighi explicou que a Resolução Normativa 566/2022 da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) prevê que a operadora deve garantir o atendimento integral das coberturas contratadas no plano de saúde, no município em que o beneficiário as demandar, desde que seja integrante da área geográfica de abrangência do plano.

Contudo, diante da impossibilidade de que as operadoras mantenham, em todos os municípios brasileiros, todas as coberturas de assistência à saúde contratadas pelos beneficiários, a ministra apontou que a saúde suplementar – assim como o SUS – trabalha com o conceito de regiões de saúde.

Nancy Andrighi afirmou que o conceito de região de saúde é dirigido às operadoras “com a única finalidade de permitir-lhes integrar a organização, o planejamento e a execução de ações e serviços de saúde que prestam”. Portanto, segundo ela, esse conceito “não pode ser utilizado como um mecanismo que dificulta o acesso do beneficiário às coberturas de assistência à saúde contratadas”.

A relatora também destacou que, nos termos do artigo 4º, parágrafo 2º, da Resolução Normativa 566/2022 da ANS, caso não exista prestador de saúde habilitado (integrante ou não da rede de assistência) no mesmo município ou nas cidades limítrofes, a operadora deve garantir o transporte do beneficiário até a localidade apta a realizar o atendimento, assim como o seu retorno ao local de origem.

Na avaliação de Nancy Andrighi, apesar de a norma da ANS prever distinções sobre a responsabilidade pelo transporte do beneficiário fora do município da demanda nas hipóteses de indisponibilidade e de inexistência de prestador no local, “não há como adotar soluções jurídicas distintas para a situação do beneficiário que, seja por indisponibilidade ou por inexistência de prestador da rede assistencial no município de demanda, é obrigado a se deslocar para outro município, ainda que da mesma região de saúde, para receber a cobertura de assistência à saúde contratada”.

Região de saúde de Sorocaba tem cidades separadas por mais de 300 km

A título ilustrativo, a relatora citou que a distância entre os municípios integrantes da região de saúde de Sorocaba pode passar de 300 km. Nancy Andrighi considerou desproporcional que o beneficiário seja obrigado a custear o deslocamento para receber tratamento em cidade que, embora faça parte da mesma região de saúde, seja distante do local em que a demanda deveria ter sido atendida.

“A operadora tem a obrigação de custear o transporte sempre que, por indisponibilidade ou inexistência de prestador no município de demanda, pertencente à área geográfica de abrangência do produto, o beneficiário for obrigado a se deslocar para município não limítrofe àquele para a realização do serviço ou procedimento de saúde contratado”, concluiu a ministra.

Leia o acórdão no REsp 2.112.090.

https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/2024/10042024-Plano-de-saude-deve-custear-transporte-se-municipio-ou-cidades-vizinhas-nao-oferecem-atendimento.aspx

12/04/2024

Para ministro Salomão, I Jornada de Direito da Saúde fará debate amplificado e inédito no Brasil

I Jornada de Direito da Saúde recebeu 589 propostas de enunciados, que serão discutidas por especialistas na sede do Conselho da Justiça Federal (CJF), em Brasília, nos dias 13 e 14 de junho.

O ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Luis Felipe Salomão, atual corregedor nacional de Justiça,  é um dos coordenadores científicos do evento. Nesta entrevista, ele compartilha suas expectativas sobre o encontro e fala das dificuldades dos juízes diante dos processos que envolvem questões de saúde.

Quais os principais desafios enfrentados pelos magistrados ao abordar questões ligadas à saúde pública e à saúde suplementar?

Luis Felipe Salomão – Os magistrados enfrentam diversos desafios nas demandas relacionadas à saúde, tanto a pública como a suplementar. Além, é claro, da massiva judicialização, como também é possível verificar em outras áreas do direito, questões como a eficaz obtenção de informações atualizadas e precisas da medicina, baseadas em evidências para o bom julgamento dos processos, apresentam-se como desafios inerentes à atuação jurisdicional.

Aos magistrados, cabe a coleta de informações atualizadas a respeito das evidências científicas em saúde, a fim de que sejam esclarecidos na decisão os critérios para permitir a possibilidade de oferecer à população determinado serviço ou produto de saúde, tanto no aspecto da saúde pública como no da suplementar.

O grande desafio, entretanto, é a redução da judicialização, sem limitar o exercício da cidadania, possibilitando que o direito de cada um seja entregue na forma da legislação, mas sem a inviabilização do sistema como um todo, seja o Sistema Único de Saúde (SUS), sejam os planos de saúde. Os juízes devem atentar para a análise precisa dos fatos que foram levados à apreciação jurisdicional, sem descuidar das consequências práticas de suas decisões nos sistemas que, obviamente, possuem limitações orçamentárias e um caráter coletivo.

Qual o papel de instituições como a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec) e a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) na regulação e no desenvolvimento das políticas de saúde no Brasil?

Luis Felipe Salomão – As instituições como Anvisa, Conitec e ANS exercem papéis fundamentais na regulamentação das políticas públicas de saúde. Por consequência, o juiz que atua na área da saúde pública e da suplementar deve estar atento às regulamentações e funções de cada uma dessas entidades para que as decisões proferidas estejam em consonância com o sistema de saúde como um todo.

Ainda, as referidas instituições exercem importantes funções técnicas na administração do sistema de saúde integral, no que diz respeito ao gerenciamento das informações, às evidências científicas dos produtos e serviços em saúde e às capacidades orçamentárias dos órgãos administrativos. Portanto, o envolvimento de juízes e de demais instituições administrativas na discussão conjunta da dualidade entre as prestações jurisdicionais positivas em matéria de saúde, com as evidências científicas e as limitações orçamentárias, propiciará, sem dúvida, melhorias na prestação jurisdicional e no funcionamento dos sistemas administrativos de saúde.

Como as discussões acerca de oncologia, doenças raras e regulação de filas têm o potencial de influenciar tanto a legislação quanto a prática jurídica nessas áreas?  

Luis Felipe Salomão – Essas discussões possuem tratamento diferenciado, especialmente na saúde pública, sobretudo diante da manifesta complexidade dos temas e da diversidade de abordagens em relação às outras situações mais corriqueiras na saúde.

A oncologia e as doenças raras possuem tratamento diferenciado pela legislação em razão de envolverem procedimentos de alta complexidade, além de tratamentos e produtos de maior custo. Esse contexto potencializa a necessidade de discussões específicas, propiciando uma melhoria da atuação jurisdicional nesses temas, que pode ter reflexo inclusive em propostas de incremento da legislação já existente.

O mesmo pode ser dito em relação à regulação das filas de atendimento, sobretudo no Sistema Único de Saúde. Evidentemente, a situação ideal na prestação de serviços públicos em saúde não deveria envolver uma espera, até mesmo porque, muitas vezes, a saúde das pessoas não pode esperar. Mas, na prática, as filas acontecem e existem centrais de regulação estaduais ou municipais para o gerenciamento delas, provocando diversos tipos de questionamentos, tais como: “Qual o lugar na fila?”, “Há risco à saúde durante a permanência da pessoa na fila de espera?”, “A pessoa pode esperar?”, “Podem existir alterações nas filas?”.

Todos esses questionamentos sugerem a importância da discussão dessas temáticas em apartado dos temas mais genéricos em saúde pública e suplementar, congregando especialistas da área médica e da área jurídica. O resultado é apenas um: a melhoria da prestação jurisdicional na judicialização da saúde.

Como os enunciados aprovados, após as discussões das comissões, auxiliarão o Poder Judiciário? 

Luis Felipe Salomão – As comissões da Jornada, compostas por um ministro do STJ e por especialistas e juristas renomados tanto na área jurídica em saúde, como propriamente na área médica, analisarão as 589 propostas de enunciados aceitas. Elas serão encaminhadas para um debate generalizado entre todos os participantes do evento, proponentes das propostas aceitas e demais integrantes das comissões.

A amplitude do debate e dos temas na área de saúde propiciará uma discussão inédita a respeito destes temas na Justiça brasileira, provocando uma melhor reflexão a respeito dos conteúdos para, ao final, gerarem enunciados que serão encaminhados aos juízes brasileiros para conhecimento e melhoria da prestação jurisdicional na área da saúde.

Este contexto promove um ambiente de enfrentamento sério e consistente dos reais desafios afetos à judicialização da saúde no Brasil. Os resultados poderão caminhar num sentido profícuo de redução da judicialização de tão sensível tema, sem o descuido da tutela jurisdicional dos direitos fundamentais sociais.

Quais as diferenças entre esta Jornada e os encontros sobre judicialização da saúde realizados pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ)?

Luis Felipe Salomão – A Jornada de Saúde e os encontros sobre judicialização da saúde realizados pelo CNJ possuem o objetivo maior de amadurecimento dos temas enfrentados diariamente pela Justiça e pelos operadores na área de saúde pública e suplementar, propiciando a melhoria da prestação jurisdicional.

Entretanto, a Jornada de Direito da Saúde, por congregar instituições como o CNJ, a Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam) e o Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal (CEJ/CJF), além de ministros do STJ e renomados profissionais atuantes nas mais diversas áreas jurídicas e médica, propõe um debate bastante amplificado sobre o tema, de forma, inclusive, inédita no Brasil, sobretudo, quanto ao alcance que as discussões propiciarão, com a possibilidade de produção de enunciados importantes para o incremento de toda a Justiça brasileira nessa tão sensível área da saúde.

16/04/2024

Quarta Turma não vê abuso em voto de banco contra plano de recuperação que reduzia seu crédito em 90%

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, reformou acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que havia considerado abusivo o voto de um banco credor contra a aprovação de plano de recuperação judicial que previa deságio de 90% em seu crédito.

Para o colegiado, não seria razoável exigir do banco, titular de cerca de 95% das obrigações da empresa devedora, que concordasse incondicionalmente com a redução quase total do seu crédito de cerca de 178 milhões de euros, em benefício da coletividade de credores e em detrimento de seus próprios interesses.

Por considerar abusivo o voto do banco contra o plano apresentado pela devedora, o juízo de primeiro grau flexibilizou as regras para concessão da recuperação judicial, aplicando o instituto conhecido como cram down, o qual permite ao magistrado impor o plano ao credor discordante mesmo que não tenha sido alcançado o quórum legal para sua aprovação.

Ao julgar recurso do banco contra a decisão de primeiro grau, o TJSP, por maioria, manteve o reconhecimento de abuso no exercício do direito de voto. De acordo com o tribunal, o banco não conseguiu demonstrar que a decretação da falência da empresa lhe seria mais benéfica do que a recuperação nos moldes propostos no plano.

No recurso ao STJ, o banco alegou que a recuperação foi concedida sem o preenchimento cumulativo de todos os requisitos do artigo 58, parágrafo 1º, da Lei de Falência e Recuperação Judicial (LFR).

Dois dos três requisitos legais para aplicação do cram down não foram cumpridos

O relator do recurso, ministro Antonio Carlos Ferreira, apontou um precedente do STJ (REsp 1.337.989) que admitiu, em circunstâncias extremamente excepcionais, a concessão da recuperação na ausência do quórum estabelecido pelo artigo 45 da LFR e sem o atendimento simultâneo dos requisitos do artigo 58, parágrafo 1º, a fim de evitar o abuso do direito de voto por alguns credores e visando a preservação da empresa.

Contudo, o ministro destacou que não se pode transformar essa exceção em regra. Segundo ele, o cram down é medida excepcional, cujo objetivo é superar impasses e permitir a continuidade da empresa. Justamente porque esse instituto exclui o voto divergente do credor, a LFR restringe o seu uso ao exigir o cumprimento cumulativo de três requisitos.

Desses três, Antonio Carlos Ferreira afirmou que dois não foram atendidos no caso em julgamento: o voto favorável de credores que representem mais da metade do valor de todos os créditos presentes à assembleia, independentemente de classes (artigo 58, parágrafo 1º, inciso I); e o voto favorável de mais de um terço dos credores na classe que tiver rejeitado o plano (artigo 58, parágrafo 1º, inciso II).

Banco não incorreu em abuso do direito de voto

O ministro também ressaltou que o deságio de 90% previsto no plano era mais significativo para o banco do que para os outros credores, considerando que seu crédito é de cerca de 178 milhões de euros, enquanto a soma total dos demais créditos não chega a 5% disso.

O relator ainda ponderou que o banco não pretendeu a decretação de falência, mas apenas a convocação da assembleia de credores para a aprovação de um novo plano. Assim, segundo o ministro Antonio Carlos, sob qualquer perspectiva que se examine a controvérsia, o banco não incorreu em abuso do direito de voto, pois estava buscando de forma legítima a satisfação de seu crédito.

Ao dar provimento ao recurso, a Quarta Turma determinou a intimação da devedora para a apresentação de um novo plano, a ser submetido aos credores.

Leia o acórdão no REsp 1.880.358.

19/04/2024

Segurado que se obrigou a manter ex-esposa em seguro de vida por acordo judicial não pode retirá-la unilateralmente

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) considerou nula a alteração de beneficiária de seguro de vida em grupo realizada por segurado que se obrigou, em acordo de divórcio homologado judicialmente, a manter a ex-esposa como única favorecida do contrato. Para o colegiado, ao se comprometer a manter a ex-mulher como beneficiária, o segurado renunciou à faculdade de livre modificação da lista de agraciados e garantiu a ela o direito condicional (em caso de morte) de receber o capital contratado.

No mesmo julgamento, o colegiado entendeu que o pagamento feito a credores putativos – ou seja, credores aparentes – não poderia ser reconhecido no caso dos autos, pois a seguradora agiu de forma negligente ao não tomar o cuidado de verificar quem, de fato, tinha direito a receber o benefício.

Na origem, a mulher ajuizou ação contra a seguradora para anular a nomeação dos beneficiários de seguro de vida deixado por seu ex-marido falecido, que refez a apólice após o segundo casamento e a excluiu da relação de favorecidos. No processo, a ex-esposa provou que fez um acordo judicial de divórcio com o segurado, em que constava que a mulher seria a única beneficiária do seguro de vida em grupo ao qual ele havia aderido.

O juízo de primeiro grau julgou improcedente a ação por considerar que a seguradora agiu de boa-fé ao pagar a indenização securitária aos beneficiários registrados na apólice, de modo que não poderia ser responsabilizada pela conduta do segurado. O Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR), entretanto, reformou a sentença e determinou que a ex-esposa recebesse a indenização sob o fundamento de que a estipulação feita no acordo de divórcio tornava ilícita a exclusão da mulher como beneficiária do seguro.

Ao STJ, a seguradora alegou que o pagamento feito por terceiro de boa-fé a credor putativo é válido. Dessa forma, argumentou, ela não poderia ser responsabilizada por seguir o disposto na apólice, em situação de aparente legalidade.

Segurado desrespeitou direito garantido à ex-esposa

Segundo o relator do caso, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, o artigo 791 do Código Civil permite a substituição de beneficiários do contrato de seguro de vida pelo segurado, a menos que a indicação esteja vinculada à garantia de alguma obrigação ou o próprio segurado tenha renunciado a tal faculdade.

Nesse contexto, apontou, se o segurado abrir mão do direito de substituição do beneficiário, ou se a indicação não for feita a título gratuito, o favorecido deve permanecer o mesmo durante toda a vigência do seguro de vida. Segundo explicou o relator, nessa situação, o beneficiário “não é detentor de mera expectativa de direito, mas, sim, possuidor do direito condicional de receber o capital contratado, que se concretizará sobrevindo a morte do segurado”.

No caso dos autos, em razão do acordo homologado pela Justiça em que havia obrigação de manter a ex-esposa como beneficiária exclusiva do seguro de vida, o ministro Cueva entendeu que “o segurado, ao não ter observado a restrição que se impôs à liberdade de indicação e de alteração do beneficiário no contrato de seguro de vida, acabou por desrespeitar o direito condicional da ex-esposa, sendo nula a nomeação na apólice feita em inobservância à renúncia a tal faculdade”, observou.

Devedor deve demonstrar boa-fé e postura diligente

Em relação ao pagamento feito aos credores que aparentemente teriam direito ao crédito (credores putativos), Villas Bôas Cueva destacou que sua validade depende da demonstração da boa-fé objetiva do devedor. Dessa forma, segundo ele, seria necessária a existência de elementos suficientes para que o terceiro tenha sido induzido a acreditar que a pessoa que se apresenta para receber determinado valor é, de fato, o verdadeiro credor.

Por outro lado, o relator ressaltou que a negligência ou a má-fé do devedor tem como consequência o duplo pagamento: uma, ao credor putativo e outra, ao credor verdadeiro, sendo cabível a restituição de valores a fim de se evitar o enriquecimento ilícito de uma das partes.

Para o ministro, a situação do processo indica que a seguradora não adotou a cautela necessária para pagar o seguro à verdadeira beneficiária.

“Ao ter assumido a apólice coletiva, deveria ter buscado receber todas as informações acerca do grupo segurado, inclusive as restrições de alteração no rol de beneficiários, de conhecimento da estipulante. Diante da negligência, pagou mal a indenização securitária, visto que tinha condições de saber quem era o verdadeiro credor, não podendo se socorrer da eficácia do pagamento a credor putativo”, concluiu o ministro ao negar provimento ao recurso especial.

Leia o acórdão no REsp 2.009.507.

https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/2024/19042024-Segurado-que-se-obrigou-a-manter-ex-esposa-em-seguro-de-vida-por-acordo-judicial-nao-pode-retira-la.aspx

22/04/2024

Venda prematura do bem pelo credor fiduciário não justifica multa se busca e apreensão foi julgada procedente

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a multa de 50% sobre o valor originalmente financiado em contrato de alienação fiduciária, prevista no artigo 3º, parágrafo 6º, do Decreto-Lei 911/1969, não pode ser aplicada quando a sentença de improcedência da ação de busca e apreensão é revertida em recurso.

Na origem do caso, o banco credor, alegando falta de pagamento das prestações, ajuizou ação de busca e apreensão de um carro comprado mediante alienação fiduciária. O veículo foi apreendido liminarmente, mas o devedor quitou as parcelas em aberto, e o juízo determinou que o bem lhe fosse devolvido imediatamente. O veículo, entretanto, não pôde ser restituído porque já havia sido alienado a terceiro pelo banco.

O juízo, então, proferiu sentença de improcedência do pedido e determinou que o banco pagasse ao devedor fiduciante o equivalente ao valor de mercado do carro na data da apreensão, além da multa de 50% do valor financiado, conforme o disposto no Decreto-Lei 911/1969.

O Tribunal de Justiça de Alagoas (TJAL) reformou a sentença para que a ação de busca e apreensão fosse julgada procedente, por entender que, ao purgar a mora, o devedor teria reconhecido implicitamente a procedência da ação. No entanto, como o banco alienou o carro prematuramente e sem autorização judicial, o acórdão manteve a condenação da instituição financeira a pagar o valor do bem acrescido da multa de 50% sobre o financiamento.

Multa exige duas condições cumulativas

O relator do recurso do banco no STJ, ministro Marco Aurélio Bellizze, afirmou que a multa prevista no artigo 3º, parágrafo 6º, do Decreto-Lei 911/1969 tem por objetivo “a recomposição de prejuízos causados pelo credor fiduciário em razão da ação de busca e apreensão injustamente proposta contra o devedor fiduciante”, conforme definido pela Terceira Turma ao julgar o REsp 799.180.

De acordo com o ministro, esse dispositivo legal estabelece duas situações cumulativas para a aplicação da multa equivalente a 50% do valor originalmente financiado: a sentença de improcedência da ação de busca e apreensão e a alienação prematura do bem.

No caso dos autos, embora o carro tenha sido alienado antecipadamente pelo banco credor, o relator assinalou que o tribunal estadual julgou a busca e apreensão procedente, o que torna inaplicável a multa de 50% em favor do devedor.

Bellizze comentou também que o devedor não recorreu do acórdão que reformou a sentença para julgar a ação procedente, “de modo que não há como alterar essa questão no presente recurso especial“.

“Assim, havendo julgamento de procedência do pedido, tendo em vista o reconhecimento da dívida pelo devedor ao purgar a mora, não há como aplicar a multa prevista no artigo 3º, parágrafo 6º, do Decreto-Lei 911/1969, visto que a ação de busca e apreensão não foi injustamente proposta contra o devedor fiduciante”, declarou o ministro.

Leia o acórdão no REsp 1.994.381.

25/04/2024

Expositores debatem uso medicinal da cannabis na primeira parte da audiência pública

Em audiência pública realizada nesta quinta-feira (25) pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), representantes de órgãos públicos e entidades privadas discutiram a possibilidade de importação de sementes e plantio de variedades de Cannabis sativa com baixo teor de Tetrahidrocanabinol (THC) para a produção de medicamentos e outros subprodutos com fins exclusivamente medicinais, farmacêuticos ou industriais.

O tema é objeto do Incidente de Assunção de Competência 16 (IAC 16), instaurado em 7 de março de 2023 na Primeira Seção, que tem como relatora a ministra Regina Helena Costa.

Segundo a ministra, a convocação da audiência pública se deve à relevância jurídica, econômica e social da matéria e tem o objetivo de subsidiar os membros da Primeira Seção com informações técnicas e científicas para o julgamento do IAC.

A relatora informou que, no total, foram recebidos 55 pedidos de pessoas e instituições interessadas em participar da audiência, sendo 48 favoráveis à autorização para importação e cultivo das variedades de cannabis com baixo teor de THC, e sete defensoras da tese de que não há amparo técnico ou científico para tal medida. Foram selecionados 24 expositores – os sete contrários e os demais favoráveis.

Também acompanharam a audiência presencialmente os ministros Herman Benjamin e Rogerio Schietti Cruz.

Desconhecimento e necessidade de legislação específica

Primeiro a falar no painel 1, o representante da empresa DNA Soluções em Biotecnologia Eireli, Arthur Ferrari Arsuffi, recorrente no IAC, destacou que esse tema enfrenta muita resistência em razão do desconhecimento e do preconceito. “O IAC trata da possibilidade de importação de sementes e de plantio de cânhamo industrial, que é uma variante da cannabis, mas que, diferentemente da planta usada como droga, somente tem potencial para uso farmacêutico, medicinal e industrial. Não se discute aqui a descriminalização das drogas”, ponderou.

De acordo com ele, esses medicamentos têm se mostrado muito eficazes para o tratamento de várias doenças. Porém, o representante da empresa observou que, por conta da restrição regulatória, toda a matéria-prima precisa ser importada.

“É um protecionismo às avessas: podemos produzir os medicamentos aqui, mas temos que importar a matéria-prima. Quem se beneficia com isso? Não é o cidadão brasileiro, cujos produtos acabam encarecendo”, questionou. Na sua avaliação, o cultivo das sementes no país vai gerar redução de custos para a população e para o próprio Estado, pois o Sistema Único de Saúde (SUS) fornece esses medicamentos em algumas situações.

Renata de Morais Souza, especialista da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), fez um apanhado da legislação sobre o assunto, abordando as convenções das Nações Unidas de 1961 e de 1971, ratificadas pelo Brasil, que estabeleceram a proibição do uso da cannabis, exceto para fins médicos e científicos, e lembrou que a Lei de Drogas (Lei 11.343/2006) também permite o plantio para uso medicinal ou científico.

Também em nome da Anvisa, o gerente de medicamentos João Paulo Silvério Perfeito afirmou que é preciso mostrar que o uso medicinal e científico da cannabis é seguro, eficaz e de qualidade. “Hoje, há uma variedade enorme de produtos com composições diversas, usadas em apresentações diversas, para finalidade diversas, que nos coloca em uma posição desafiadora sobre as necessidades específicas de cada produto”, ressaltou.

Bruno César Gonçalves da Silva, representante do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária do Ministério da Justiça e Segurança Pública, afirmou que esse tema está dentro de uma questão mais ampla, que é a política de drogas. Segundo ele, há um grupo de trabalho no conselho que aborda especificamente a questão da cannabis medicinal, em especial diante de casos de pessoas que enfrentam acusações criminais por cultivar a planta para fins medicinais.

“Há pessoas que possuem autorização para importar, mas não têm condições financeiras para isso nem conseguem pelo poder público o medicamento a tempo, e buscam a alternativa de cultivar, mas sofrem o risco de serem enquadradas na Lei de Drogas”, comentou. Para ele, é fundamental uma disposição normativa para o Poder Judiciário lidar com essas situações, e o órgão é favorável à regulamentação da matéria. “É um caso de saúde, e não de polícia. Temos que tirar essa situação do âmbito penal”, concluiu.

Fiscalização da entrada de sementes e uso do óleo no tratamento de doenças

Eduardo Porto Magalhães, do Ministério da Agricultura e Pecuária, lembrou que a pasta é responsável pela fiscalização de qualquer importação de material vegetal, incluindo sementes, cujo intuito é impedir a propagação de doenças e pragas. Segundo informou, atualmente não existe nenhum requisito para a importação das sementes de Cannabis sativa, o que configura a proibição de sua entrada no país. Ele afirmou que o ministério estuda os riscos relacionados a essas sementes, já tendo sido identificadas algumas pragas danosas para a agricultura nacional.

Além dessas questões, a auditora fiscal federal Izabela Mendes Carvalho ressaltou que a responsabilidade do ministério está relacionada à regulamentação dos produtos de origem vegetal, de todas as espécies, não sendo competente para regulamentar formas específicas. Desse modo, afirmou que, uma vez autorizada a importação de sementes da cannabis pelos órgãos competentes, os procedimentos do ministério serão os mesmos utilizados para qualquer outra importação.

Cláudia Marin, representante da Associação Canábica em Defesa da Vida, fez um relato emocionado sobre a condição do filho, que tem epilepsia de difícil controle. Ele foi o primeiro paciente de Marília (SP) a usar cannabis medicinal. Segundo ela, o filho chegava a ter 80 convulsões por dia, e reduziu esse número para 50 após o uso do óleo de canabidiol (CBD). Porém, só depois da administração do óleo de espectro amplo produzido por terapeuta é que as crises convulsivas cessaram, em quatro dias.

“A maconha medicinal fez diferença na vida do meu filho, mas poderia ter feito antes. Maconha é remédio que salva vidas”, declarou. Ela questionou a política de drogas por comprometer o tratamento de muitos pacientes, cujas famílias dependem desses medicamentos para ter qualidade de vida.

Possíveis impactos da regulamentação do cultivo de cannabis

Presidindo o segundo painel da manhã, o ministro Rogerio Schietti Cruz ressaltou a importância de debater o tema com olhar cuidadoso, sem nenhum tipo de preconceito e pautado na ciência.

“Já passou do tempo de deixarmos de tratar o assunto como política criminal; devemos tratá-lo como uma política de saúde pública. Não é mais possível ver tantos brasileiros sendo perseguidos criminalmente por estarem cuidando de sua saúde”, asseverou Schietti.

Os representantes da Associação Brasileira de Estudos da Cannabis Sativa abriram as exposições do painel 2. A psiquiatra e diretora-geral da organização, Eliane Lima Guerra Nunes, destacou a necessidade de regulamentação da cannabis para prescrição de seu amplo espectro de componentes. “Não podemos ser punidos por falar da importância de substâncias proscritas para realizar nosso trabalho”, afirmou. Konstantin Gerber, doutor em direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), defendeu que as associações tenham uma regulamentação distinta daquela exigida para empresas.

Para o vice-presidente da Comissão Especial de Direito da Cannabis Medicinal do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Rodrigo Melo Mesquita, o tema merece uma solução definitiva e informada para suprimir a atual omissão regulatória. “A regulação de mercados não serve para satisfazer interesses ideológicos ou puramente morais”, disse ele.

Representando o Grupo de Atuação Estratégica das Defensorias Públicas Estaduais e Distrital nos Tribunais Superiores (GAETS), as defensoras públicas Anelyse Santos de Freitas e Patrícia Landim Salha apresentaram as dificuldades que os assistidos das defensorias experimentam para ter acesso ao medicamento canábico. “Regulamentar os critérios técnicos para o cultivo das variedades de cannabis contribuiria para a diminuição do custo do canabidiol não apenas para o consumidor, mas também para o SUS”, avaliou.

André Estevão Ubaldino, procurador do Ministério Público de Minas Gerais e professor da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-MG), destacou a necessidade da ponderação, sob uma perspectiva não preconceituosa, a respeito dos efeitos danosos e efeitos benéficos da planta: “Devemos ter cuidado para que o remédio não se converta em veneno”.

O diretor jurídico do Instituto de Pesquisas Sociais e Econômicas da Cannabis, Pedro Gabriel Lopes, deu contribuições sob a perspectiva do controle internacional de drogas. Segundo o pesquisador, as convenções internacionais não estabelecem restrições sobre sementes e folhas, o que facilitaria a regulamentação para o cultivo no Brasil. “Qualquer tipo de decisão a ser tomada a respeito do tema será estritamente baseada em parâmetros nacionais”, defendeu.

https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/2024/25042024-Expositores-defendem-uso-medicinal-da-cannabis-na-primeira-parte-da-audiencia-publica.aspx

 

Discussão sobre benefícios da cannabis medicinal e críticas ao cultivo marcam encerramento da audiência pública

De um lado, reflexões sobre os potenciais benefícios do uso da cannabis medicinal – não só à saúde, mas à indústria e ao sistema econômico; de outro, argumentos sobre possíveis perigos da autorização indiscriminada para importação de sementes e plantio. Essas posições marcaram o encerramento da audiência pública realizada nesta quinta-feira (25), no Superior Tribunal de Justiça (STJ).

O tema é objeto do Incidente de Assunção de Competência 16 (IAC 16), que tramita na Primeira Seção e tem como relatora a ministra Regina Helena Costa.

Abrindo o terceiro painel de discussão, o advogado Emílio Figueiredo falou em nome da Rede Jurídica pela Reforma da Política de Drogas (Rede Reforma). Em sua apresentação, ele fez um apanhado histórico sobre a regulação da cannabis e estabeleceu diferenças entre o uso terapêutico e o uso industrial da planta. “O IAC 16 está afetando principalmente associações de pacientes que submeteram à jurisdição o direito de cultivar a cannabis e estão com suas ações suspensas”, lembrou.

Em seguida, falaram em nome do Laboratório de Produtos Naturais e Fitoterápicos da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) o pró-reitor de inovação da instituição, Geraldo Pereira Jotz, e o secretário de desenvolvimento tecnológico, Flávio Anastácio de Oliveira Camargo. Eles demonstraram preocupação com as possíveis formas de controle do cultivo familiar da cannabis.

“O canabidiol, falando como médico, é excelente, mas onde está o controle quando se autoriza o cultivo familiar? Temos que enxergar a medicina daqui a dez ou 20 anos. A repercussão do THC no cérebro de uma criança é irreparável. O Estado precisa ter esse controle”, afirmou o pró-reitor de inovação da UFRGS.

A advogada Bruna Barbosa Rocha abordou aspectos econômicos ao representar a Associação Brasileira da Indústria de Canabinoides (BRCann). Ela citou um estudo conjunto da Confederação Nacional da Indústria (CNI), da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan) apontando a fuga de cerca de R$ 453 bilhões devido à existência de um mercado não regulado de cannabis no Brasil.

“Há a necessidade de se estabelecer uma base jurídica a partir das autoridades competentes. Viabilizar que o Poder Judiciário alimente ações sem amparo legal é facilitar que dados como esse cresçam”, refletiu a advogada.

Uso industrial do cânhamo possibilita novos negócios

A fundadora do Instituto InformaCann, Manuela Borges, destacou os possíveis usos do cânhamo industrial – uma subespécie da planta Cannabis sativa que não contém psicoatividade. “Ela é uma solução ecologicamente correta que pode substituir uma série de produtos derivados do petróleo. Seu cultivo tem sido usado como moeda no mercado de crédito de carbono e representa produção de emprego e renda, que estão saindo do Brasil”, observou.

Ainda sobre as possibilidades do uso do cânhamo, o advogado André Tadeu de Magalhães Andrade expôs a posição da Associação Brasileira de Cannabis e Cânhamo Industrial. Ele lembrou que a Convenção Única sobre Entorpecentes da Organização das Nações Unidas (ONU) excluiu, em seu artigo 28, a possibilidade de repressão ao uso da cannabis para fins exclusivamente industriais.

No âmbito nacional, segundo o advogado, a Lei 11.343/2006 (Lei de Drogas) “está preocupada com a produção não autorizada e com o tráfico ilícito de drogas, o que em muito difere da atuação daqueles trabalhadores e empreendedores que pretendem lidar com uma commodity agrícola materialmente incapaz de originar drogas”, ressaltou.

Representando o Conselho Federal de Química, Luiz Miguel Skrobot Júnior lembrou que é possível o controle do cânhamo industrial por meio de rastreabilidade. “Há projetos em andamento nesse sentido que utilizam biomarcadores em sementes. O controle já existe também com o petróleo e a gasolina”, exemplificou.

Para SBPC, estudo controlado pode ampliar base de informações sobre usos indicados da cannabis

Primeira a falar no painel 4, a professora da Universidade de Brasília (UnB) Andrea Donatti Gallassi, representante da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), destacou as evidências científicas do potencial terapêutico da cannabis na saúde pública.

“Para doenças como epilepsia, dor crônica/neuropática, fibromialgia e esclerose múltipla, muitos estudos colocam o uso do canabidiol, com baixo teor de THC, como uma grande indicação terapêutica. Para avançarmos mais nesses estudos com relação a outras doenças, precisamos de uma produção nacional de produtos à base de cannabis, pois conseguiríamos ter um ambiente de estudo controlado”, disse.

Já os representantes da Associação Brasileira das Indústrias de Cannabis (Abicann), Ana Fábia Martins e Rafael Medeiros Popini Vaz, ressaltaram que mais de 20 milhões de pessoas no Brasil já poderiam estar fazendo uso de produtos à base de cannabis para tratar cerca de 500 tipos de patologias diferentes. “Estamos sendo obrigados a judicializar o que devia ser legislado e regulamentado. Mas, felizmente, temos essas decisões para proteger o direito à saúde e ao bem-estar”, declarou Ana Fábia Martins.

Para Fabian Borghetti, doutor em biologia molecular e representante do Conselho Federal de Biologia (CFBio), a Cannabis sativa apresenta um repertório químico e farmacológico extremamente rico, o que possibilita seu uso para inúmeros tratamentos. “A Anvisa, a Fiocruz e a ONU reconhecem a potencialidade da cannabis. O seu plantio traz outros benefícios, como a retirada de metais pesados do solo, a regeneração de solos degradados, alta incorporação de gás carbônico – que contribui no combate às mudanças climáticas – e, além disso, o cultivo geraria aumento de emprego e renda”, disse.

Associação aponta potencial do Brasil na exploração do cânhamo industrial

O diretor de relações institucionais da Associação Nacional do Cânhamo Industrial, Marcelo Alexandre Andrade de Almeida, ressaltou que o Brasil tem um enorme potencial para a exploração do cânhamo industrial. Segundo ele, o cânhamo é uma cultura muito versátil e multiúso, utilizável em ampla gama de produtos baseados na biodiversidade, o que desperta o interesse em diversos mercados.

“Tecidos, equipamentos para a construção civil, manejo sustentável do setor agrícola e uma série de outras circunstâncias que nada têm a ver com a ilicitude carreada pelos narcotraficantes. Estados Unidos, Canadá, Inglaterra, Portugal e Argentina são alguns dos países que comercializam cânhamo industrial normalmente. Precisamos incorporar isso aos nossos ordenamentos para que o desenvolvimento da atividade econômica com base no cânhamo industrial tenha segurança e solidez jurídica”, declarou.

Para finalizar o painel, falaram as professoras da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) Claudia Fegadolli e Luciana Surjus. A primeira ressaltou que a população brasileira tem acesso a cerca de 33 produtos com extratos de Cannabis sativa e canabidiol. “No entanto, as empresas brasileiras só podem produzir com a importação dos insumos, o que se traduz em preços bastante elevados. Entre 2015 e 2023, por exemplo, cerca de R$ 165,8 milhões foram gastos pela União para fornecer os medicamentos”, explicitou.

Já Luciana Surjus ponderou que a restrição ao plantio de Cannabis sativa tem impedido a ampliação do tratamento a pessoas de baixa renda. “Devemos regulamentar o cultivo no nosso país, lembrando de garantir mecanismos de continuidade do tratamento para quem já conquistou essa proteção jurídica e comportando também aqueles que buscam o acesso lícito para as suas atividades, que são essenciais para um acesso equânime e sustentável no Brasil”, apontou.

Segundo Osmar Terra, mundo passa por momento de “glamourização proposital” da maconha

No último painel da audiência, conduzido pelo ministro Sérgio Kukina, a representante da Federação das Associações de Cannabis Terapêutica do Brasil, Maria Ângela Aboin Gomes, afirmou que a chamada “guerra às drogas”, em seu modelo atual, impede as pessoas de terem acesso a tratamentos com base em cannabis, além de dificultar pesquisas científicas sobre o assunto.

Maria Ângela Gomes também manifestou preocupação em relação à polinização cruzada entre plantas fêmeas – voltadas para o cultivo de cannabis – e machos – relacionadas ao cultivo de cânhamo –, situação que, segundo ela, pode inclusive prejudicar o cultivo doméstico e trazer riscos a pessoas já em tratamento.

Na visão do deputado federal e médico Osmar Terra, existe, no momento atual, uma espécie de “glamourização proposital” da maconha, uma tentativa de legalização da droga no Brasil.

Citando possíveis perigos relacionados à autorização do plantio, Osmar Terra relacionou a maconha a esquizofrenia, psicose, suicídios, retardo mental e mortes no trânsito. “Legalizando o plantio da maconha, o que se legaliza, na prática, é a maconha”, sustentou.

Representante do Conselho Federal de Medicina (CFM), Emmanuel Fortes Silveira Cavalcanti destacou que já há autorização da entidade para o uso da cannabis em doenças específicas, como a epilepsia, mas demonstrou preocupação com o crescimento exponencial de prescrições médicas com produtos derivados da planta.

Para Cavalcanti, essas preocupações se estendem ao cultivo doméstico da maconha medicinal. “Existem perspectivas alvissareiras, mas elas não podem permitir que haja um plantio expansivo porque, para o CFM, somente as síndromes convulsivas têm prescrição oficial. As demais prescrições precisam passar pelo crivo da avaliação científica. Fazer um plantio extensivo, com um universo tão pequeno de pessoas que oficialmente podem se beneficiar, não é adequado”, ponderou.

Relatora vê necessidade de resposta da Justiça para uma demanda social importante

No encerramento dos trabalhos, o subprocurador-geral da República Aurélio Virgílio Veiga Rios destacou as questões mais relevantes tratadas na audiência – como a atualização normativa do tema, os impactos socioeconômicos e os possíveis benefícios e malefícios do cultivo – e apontou a possibilidade de algum tipo de solução consensual sobre o assunto. “É possível fazer conciliações de interesses, desde que sejam vencidos preconceitos”, afirmou.

A ministra Regina Helena Costa ressaltou a importância dos debates realizados durante o dia e a sua contribuição para a análise da controvérsia. “Existe uma demanda social por uma resposta”, disse a relatora.

https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/2024/25042024-Discussao-sobre-beneficios-da-cannabis-medicinal-e-criticas-ao-cultivo-marcam-encerramento-de-audiencia-publica-.aspx

30/04/2024

Quarta Turma decide que tempo da prisão por dívida de alimentos deve ter fundamentação específica

Para a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), é obrigação do juízo fundamentar – de maneira individualizada, razoável e proporcional – o tempo de prisão civil decorrente do não pagamento da dívida alimentícia. O colegiado concluiu que a fundamentação, necessária em qualquer medida que envolva coerção à pessoa, evita que o período de restrição da liberdade seja fixado de maneira indiscriminada pelo juízo.

Com esse entendimento, a turma julgadora fixou no mínimo legal de um mês o tempo de prisão de um devedor de alimentos. No decreto original de prisão, o juízo havia se limitado a indicar o prazo de três meses, sem, contudo, apresentar justificativa específica para esse período.

“Não se pode admitir que uma decisão superficial e imotivada, com a mera escolha discricionária do magistrado, venha a definir o tempo de restrição de liberdade de qualquer pessoa, sob pena de se incorrer em abuso do direito e arbítrio do magistrado, impedindo a ampla defesa e o contraditório pelo devedor, além de inviabilizar o controle das instâncias superiores pelas vias recursais adequadas”, afirmou o relator do recurso em habeas corpus, ministro Raul Araújo.

O decreto prisional foi mantido em segundo grau, sob o entendimento de que não há ilegalidade se a decisão respeita o prazo máximo de três meses previsto no artigo 528, parágrafo 3º, do Código de Processo Civil (CPC).

Motivação das decisões judiciais é garantia constitucional e limita o poder estatal

O ministro Raul Araújo lembrou que, conforme previsto no artigo 93, IX, da Constituição Federal, a motivação das decisões judiciais é elemento fundamental de proteção e garantia da liberdade, além de servir como ferramenta de limitação do próprio poder do Estado.

“Visando dar concretude aos ditames constitucionais é que o Código de Processo Civil de 2015 dispôs, de forma expressa, sobre o dever de fundamentação analítica e adequada de todas as decisões judiciais (artigo 489, parágrafo 1º), em substituição ao livre convencimento e em repulsa às interpretações arbitrárias e solipsistas”, completou o ministro.

Apesar dessas premissas, Raul Araújo apontou que tem havido divergência nos tribunais brasileiros a respeito da necessidade de motivação do decreto de prisão civil no tocante ao tempo de encarceramento, ou seja, se é necessário haver uma espécie de “dosimetria” ou se o período está inserido na discricionariedade do juízo.

Reincidência e consequências da dívida podem embasar escolha do tempo de prisão

O relator comentou que a prisão civil é um instrumento legal para coagir o devedor de alimentos a cumprir sua obrigação de forma mais rápida. Como qualquer medida coercitiva, apontou o ministro, é necessário haver uma justificativa adequada para sua imposição, especialmente porque envolve direitos fundamentais da pessoa executada.

“Nessa perspectiva, deve prevalecer o dever de fundamentação analítica e adequada de toda decisão determinante de prisão civil do devedor de alimentos, seja quanto ao preenchimento dos requisitos – requerimento do credor; existência de débito alimentar que compreenda até três prestações anteriores ao ajuizamento da execução; não pagamento do débito em três dias; ausência de justificação ou de impossibilidade de fazê-lo (CPC, artigo 528) –, seja quanto à definição do tempo de constrição de liberdade entre o mínimo e o máximo (um a três meses) estabelecidos pela legislação”, detalhou.

Entre os elementos que podem auxiliar o juízo na determinação do tempo de prisão, o ministro apontou a capacidade econômica do devedor e o valor da dívida; o comportamento do devedor (se age de boa-fé ou se é reincidente); as características pessoais (se está desempregado, se tem outros filhos ou é doente); e as consequências do não pagamento para o alimentando (abandono de escola ou danos à saúde, por exemplo).

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/2024/30042024-Quarta-Turma-decide-que-tempo-da-prisao-por-divida-de-alimentos-deve-ter-fundamentacao-especifica.aspx

 

Lei das S.A. rege nulidades em assembleia quando decisões afetam apenas relações intrassocietárias

Ao discutir o regime de nulidades das deliberações da assembleia nas sociedades por ações, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu que a legislação específica – Lei 6.404/1976, a chamada Lei das S.A. – se aplica prioritariamente às relações intrassocietárias – entre os acionistas ou entre eles e a própria sociedade –, remanescendo a disciplina geral do Código Civil para as situações em que os efeitos das deliberações da assembleia alcancem a esfera jurídica de terceiros.

No caso em julgamento, às vésperas da assembleia geral de aprovação de contas, um sócio administrador transferiu a totalidade de sua participação acionária para uma sociedade empresária da qual detinha, juntamente com a esposa, a totalidade do capital social, e que votou de maneira determinante para a aprovação das contas, configurando vício do voto.

Regime especial de invalidades das deliberações assembleares

O relator do caso, ministro Antonio Carlos Ferreira, explicou que há uma aparente incompatibilidade entre o artigo 286 da Lei das S.A. e a disciplina das nulidades dos negócios jurídicos em geral, prevista no Código Civil. No primeiro, esclareceu, a sanção é em regra a anulabilidade, que permite convalidação do ato; já no regime civil, a sanção prevista depende da gradação do vício previsto em lei.

Na sua avaliação, uma primeira solução para esse conflito é o critério da especialidade, segundo o qual prevalece a norma especial (Lei das S.A.) sobre a geral (Código Civil). Contudo, o relator destacou que há divergências na doutrina sobre a forma de aplicar cada um desses regimes: enquanto alguns defendem o uso exclusivo da lei especial, outros sustentam a aplicação do regime geral de invalidades a todas as relações jurídicas obrigacionais, e uma terceira corrente prega a aplicação do regime especial de nulidades com uso do sistema civil, a depender do interesse violado.

Para o ministro, diante desse regime especial de invalidade das deliberações da assembleia, o uso das normas gerais do direito civil deve ocorrer com prudência, “sendo possível desde que haja omissão e seja substancialmente compatível com a disciplina especial, partindo-se, em princípio, da previsão de sanção de anulabilidade aos vícios e considerando-se como referência fundamental o interesse violado”.

Fraude a votos em assembleia atinge interesses da empresa e é causa de anulabilidade

Antonio Carlos Ferreira verificou que, no caso julgado, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) concluiu pela nulidade da assembleia, ao fundamento que houve fraude à Lei das S.A., que veda ao administrador votar nas deliberações da assembleia geral relativas à aprovação de suas contas (artigo 115, parágrafo 1º). Esse vício, entendeu o tribunal paulista, causa a nulidade do ato, segundo o Código Civil (artigo 166, VI).

Segundo o relator, contudo, embora essa proibição imposta ao acionista administrador tenha significativo fundamento ético, ela envolve interesses dos acionistas e da própria companhia, mas não interesses da coletividade ou de terceiros.

Desse modo, afirmou, a questão é de anulabilidade da deliberação, e não de nulidade. “Embora a proibição legal não possa ser desconsiderada pelas partes interessadas – notadamente sócios e a própria sociedade –, é possível sua convalidação, seja por nova deliberação assemblear livre do vício (sem o voto do sócio administrador) ou pelo transcurso do tempo necessário à ocorrência da extinção, pela decadência, do direito formativo à decretação de sua nulidade”, esclareceu.

Por fim, o ministro lembrou que a jurisprudência do STJ exige a prévia desconstituição da decisão que aprovou as contas para o ajuizamento da ação de responsabilização e, como os acionistas minoritários não haviam ajuizado aquela ação, a ação de responsabilidade foi extinta sem resolução do mérito.

Leia o acórdão no REsp 2.095.475.

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL – STF

01/04/2024

Partido questiona prorrogação de contrato de transporte coletivo em São José do Rio Preto (SP)

Para o PSB, a prorrogação do contrato, na forma como foi feita, viola princípios constitucionais.

O Partido Socialista Brasileiro (PSB) ingressou com a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 1138, no Supremo Tribunal Federal (STF), na qual questiona lei do Município de São José do Rio Preto (SP) que prorrogou a concessão do serviço público de transporte coletivo de passageiros na cidade por mais 10 anos. A ADPF foi distribuída ao ministro Cristiano Zanin.
Segundo o partido, a Lei municipal 13.995/2021, ao permitir a prorrogação do contrato sem a realização de nova licitação, de forma automática, violou os princípios constitucionais da legalidade, da impessoalidade e da eficiência e também a jurisprudência do STF sobre a matéria.
Na ação, a legenda afirma que a lei foi apresentada e aprovada às vésperas do prazo final do contrato, sem que a administração municipal apresentasse dados técnicos e orçamentários que comprovassem que a medida era vantajosa para o interesse público. Também não exigiu contrapartidas da empresa concessionária. “A prorrogação efetuada pela lei municipal impugnada não preenche os requisitos constitucionais mínimos para sua validade”, destaca.
VP/AD/CV

 

https://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=531157&ori=1

09/04/2024

STF decide que cabe ao Plenário julgar recursos contra decisões de ministros sobre ADIs estaduais

Entendimento fixado pela Corte abrange competência para julgar recursos internos contra decisões monocráticas em RE ou ARE.

Compete ao Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) analisar recursos internos (agravos internos e embargos de declaração) contra decisões individuais de seus ministros em recursos extraordinários apresentados contra acórdãos de ações diretas de inconstitucionalidade estaduais. Esse foi o entendimento unânime do Supremo firmado na sessão virtual finalizada no dia 22/3.

Obrigatoriedade

A Corte analisou questão de ordem no Recurso Extraordinário (RE) 913517, acompanhando voto do relator, ministro Gilmar Mendes. A decisão passa a valer, obrigatoriamente, para todos os julgamentos iniciados a partir da publicação da ata do julgamento, mantida a validade de todas as decisões do STF anteriores a essa data.

ADI estadual

O recurso extraordinário foi apresentado pela Associação Brasileira dos Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee) contra decisão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP) que manteve a validade da Lei Estadual 13.747/2009, obrigando fornecedores de bens e serviços a fixar data e turno para realizar serviços ou entrega de produtos aos consumidores. Para o TJ, a lei questionada não envolve matéria sobre distribuição de energia elétrica, mas apenas estabelece turnos para realização de serviços ou entrega de produtos.

Com base em jurisprudência pacífica do STF sobre competência privativa da União para legislar sobre energia, o ministro Gilmar Mendes deu provimento ao recurso extraordinário para reformar o acórdão do TJ-SP e afastar a incidência da Lei estadual 13.747/2009 sobre os serviços de energia elétrica.

A Assembleia Legislativa de São Paulo apresentou embargos de declaração informando que, pouco antes da decisão do ministro Gilmar Mendes, a Lei estadual 13.747/2009 havia sido revogada pela Lei estadual 17.832/2023. Com isso, a Assembleia pretendeu saber se a legislação superveniente teria sido alcançada pela conclusão do relator. Por sua vez, o governador interpôs agravo regimental no qual sustenta que a revogação da Lei estadual de 2009 implicaria a perda de objeto do RE.

Questão de ordem

Ao analisar os autos, o relator considerou necessário submeter questão de ordem ao Plenário a fim de definir qual o órgão competente (Plenário ou Turma) para apreciar recursos internos interpostos contra decisões proferidas por ministros do STF, em recursos extraordinários e recursos extraordinários com agravo, que questionam acórdãos apresentados em ações diretas estaduais.

Na sessão virtual, os ministros acompanharam o voto do relator pela competência do Plenário do STF em tais casos. Ao citar doutrina e jurisprudência do Supremo, o ministro Gilmar Mendes reconheceu que cabe ao Plenário examinar, em quaisquer hipóteses, os recursos internos interpostos em relação a aspectos processuais, ao tema de fundo e ao alcance da decisão.

O relator verificou que os pronunciamentos do STF no âmbito de recursos extraordinários interpostos contra acórdãos proferidos em controle concentrado de constitucionalidade estadual, quando dizem respeito ao mérito da controvérsia, apresentam efeito vinculante e eficácia para todos. Assim, a seu ver, é inevitável reconhecer a competência do Plenário para apreciar recursos internos.

EC/CR//AD/CV

https://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=531797&ori=1

 

11/04/2024

CNC contesta no STF revogação de benefícios às empresas do setor de eventos

Para entidade, MP que revogou o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos não reúne os requisitos de urgência e relevância, além de causar insegurança jurídica às empresas.

A Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) questiona no Supremo Tribunal Federal (STF) trechos da medida provisória que revogaram os benefícios fiscais previstos no Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse).

Segundo a entidade, a Medida Provisória (MP) 1.202/2023 revogou o Perse, instituído pela Lei 14.148/2021 e que valeria até março de 2027. As empresas beneficiadas voltarão a pagar o Imposto de Renda com alíquota normal a partir de 1º/1/2025 e, desde 1º de abril deste ano, foram retomadas as alíquotas normais de CSLL, PIS/Pasep e Cofins.

Pandemia

A CNC lembra que o programa foi criado para compensar os efeitos decorrentes das medidas de isolamento na pandemia de covid-19. Na sua avaliação, a MP viola o artigo 62 da Constituição Federal, porque não reúne os requisitos de urgência e relevância e por tratar de tema recentemente aprovado pelo Congresso Nacional.

A confederação sustenta que o Congresso Nacional ratificou a instituição do Perse por cinco anos ao aprovar a Lei 14.592/2023. Aponta que o presidente da República poderia ter vetado a norma, mas não o fez.

Assim, não caberia a edição da MP, pois o uso da medida provisória para tratar de temas recém deliberados pelo Parlamento é vedado pela Constituição Federal.

Insegurança jurídica

Ao pedir uma liminar na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7625 para suspender dispositivos da MP, a entidade alega que a norma já começou a produzir efeitos, gerando profunda insegurança jurídica para as empresas, que passarão a ter que suportar uma carga tributária nova e não esperada.

A ação foi distribuída para o ministro Cristiano Zanin.

RP/AS//CV

Processo relacionado: ADI 7625https://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=532093&ori=1

 

 

TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO – TST

10/04/2024

Norma coletiva pode permitir desconto salarial de banco de horas negativo

Para a 2ª Turma, não se trata de direito indisponível

A Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho manteve a validade de uma norma coletiva que autorizava o desconto de banco de horas negativo ao final de cada período de 12 meses ou nas verbas rescisórias em casos de pedido de demissão ou dispensa por justa causa. De acordo com o colegiado, essa disposição normativa não trata de direito absolutamente indisponível assegurado pela Constituição Federal e tratados internacionais ou em normas de saúde e segurança no trabalho e, portanto, pode ser limitado por meio de negociação coletiva.

Banco de horas

Os acordos coletivos de trabalho firmados entre 2012 e 2014 entre o Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Metalúrgicas de Londrina e Região e a PZL Indústria Eletrônica Ltda. previam que o período de apuração dos créditos e dos débitos do banco de horas seria de 12 meses. Caso houvesse débito, as horas seriam descontadas como faltas, e os créditos seriam pagos como horas extras. Caso o empregado fosse dispensado pela empresa, o saldo negativo seria abonado. Se pedisse demissão ou fosse demitido por justa causa, haveria desconto.

Prejuízos

Em ação civil pública, o Ministério Público do Trabalho (MPT) argumentou, entre outros pontos, que não havia autorização legal para os descontos e que as cláusulas violariam direito indisponível e trariam prejuízos aos empregados, pois transferiam a eles os riscos da atividade econômica.

Direito disponível

As pretensões foram rejeitadas nas instâncias inferiores. O entendimento firmado foi de que o conteúdo da convenção coletiva não tratava de direito indisponível nem era abusivo, uma vez que também criava o dever da empresa de pagar adicional de 50% sobre as horas de um eventual saldo positivo no banco de horas.

Transferência do risco

A ministra Maria Helena Mallmann, relatora do recurso de revista do MPT, observou que a jurisprudência anterior do TST era de que a dispensa da prestação de serviços, mesmo que solicitada pelo empregado, atende aos interesses do setor econômico. Portanto, a falta de compensação dessas horas ao longo de um ano e os possíveis prejuízos resultantes deveriam ser assumidos pelo empregador, não pelo empregado.

Tese de repercussão geral do STF

Entretanto, Mallmann destacou que essa interpretação foi alterada. Após a tese vinculante de repercussão geral fixada pelo STF (Tema 1.046), apenas os direitos absolutamente indisponíveis garantidos pela Constituição Federal, tratados internacionais ou normas de saúde e segurança no trabalho não podem ser reduzidos por negociação coletiva. No caso, ela concluiu que a implementação do banco de horas nesses termos não envolve direito irrenunciável e, portanto, é válida a convenção coletiva firmada entre o sindicato e a empresa.

A decisão foi unânime.

(Bruno Vilar/CF)

Processo: RR-116-23.2015.5.09.0513

https://tst.jus.br/web/guest/-/norma-coletiva-pode-permitir-desconto-salarial-de-banco-de-horas-negativo%C2%A0

02/04/2024

Justiça do Trabalho pode julgar ação para reparação de perdas em aposentadoria complementar

Para a 8ª Turma, as perdas decorreram de ato ilícito da empregadora

A Oitava Turma do Tribunal Superior do Trabalho reafirmou a competência da Justiça do Trabalho para julgar uma ação em que um aposentado da  Petróleo Brasileiro S.A. (Petrobras) pede reparação por receber complementação de aposentadoria inferior ao valor devido, porque a empresa descumpriu cláusulas contratuais. Para o colegiado, não se trata de revisão do benefício, mas de indenização por danos materiais decorrentes de suposto ato ilícito da empregadora.

Prejuízos

Na ação, o aposentado argumentou que o prejuízo foi gerado porque, durante o contrato, a Petrobras teria deixado de pagar verbas salariais posteriormente reconhecidas na Justiça, e essa diferença teria repercutido nos valores da aposentadoria, que não podem mais ser ajustados.

Segundo ele, sobre essas parcelas não pagas deveria incidir a contribuição para o plano de previdência complementar gerido pela Fundação Petrobrás de Seguridade Social (Petros) que, por sua vez, iria compor o cálculo da suplementação de aposentadoria.

Previdência privada

A Petrobras, em sua defesa, sustentou a incompetência da Justiça do Trabalho, por entender que a ação tratava de diferenças na suplementação de aposentadoria e, portanto, se inseria na temática mais ampla da previdência complementar privada”.

Pretensão indenizatória

O juízo de primeiro grau acolheu o argumento da petroleira e extinguiu o processo, mas o Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região (BA), para quem a pretensão exposta na ação é indenizatória e está direcionada ao empregador.

Segundo o TRT, o que está em discussão não é o benefício previdenciário em si, mas os prejuízos causados pelo descumprimento de obrigações trabalhistas pelo empregador. Assim, a ação envolve exclusivamente os sujeitos da relação trabalhista.

Privações econômicas

O descumprimento contratual, conforme o TRT, acarretou ao trabalhador privações econômicas que se manifestam paulatinamente e vão além do contrato de trabalho, na medida em que afetaram o valor de sua aposentadoria.

Com isso, deferiu indenização correspondente à diferença entre o valor da suplementação recebida atualmente e aquele a que teria direito, caso as parcelas reconhecidas pela justiça tivessem sido incorporadas ao cálculo.

Ato ilícito

A relatora do agravo pelo qual a Petrobras pretendia rediscutir o caso no TST, ministra Delaíde Miranda Arantes, observou que o Supremo Tribunal Federal definiu que a competência para o processamento de ações ajuizadas contra entidades privadas de previdência complementar é da Justiça comum (Tema 190 da repercussão geral). Ocorre que, no caso julgado pela Turma, a pretensão não é de revisão de benefício, mas de indenização por danos materiais decorrentes de supostos ilícitos praticados pela ex-empregadora.

Nesse sentido, ela lembrou que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) também já definiu, em recurso especial repetitivo (Tema 1021), que é da Justiça do Trabalho a competência para julgar ação indenizatória para ressarcimento de prejuízos causados ao trabalhador em razão de ato ilícito praticado pelo empregador.

A decisão foi por maioria, vencido o ministro Sergio Pinto Martins.

(Lourdes Tavares/CF)

Processo: AIRR-553-66.2020.5.05.0039

https://tst.jus.br/web/guest/-/justi%C3%A7a-do-trabalho-pode-julgar-a%C3%A7%C3%A3o-para-repara%C3%A7%C3%A3o-de-perdas-em-aposentadoria-complementar%C2%A0

Dirigente sindical é demitido por justa causa por falar mal da empresa

A 2ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou o exame do recurso de um motorista de uma transportadora de Umuarama (PR) que foi demitido por justa causa após falar mal da empresa para o chefe por WhatsApp e, depois, mostrar as mensagens aos colegas, entre outras atitudes. A Justiça do Trabalho reconheceu que ele cometeu faltas graves que afastaram sua garantia de emprego por ser dirigente sindical.

O artigo 543, parágrafo 3º, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) dá a dirigentes sindicais a garantia de emprego a partir do momento do registro de sua candidatura ao cargo até um ano após o fim do seu mandato. A dispensa só é admitida em caso de falta grave devidamente apurada, ou seja, se for por justa causa.

O motorista tinha garantia de emprego até 18 de novembro de 2023. Após promover uma auditoria interna e suspender o contrato do motorista em 19 de março de 2019, a transportadora pleiteou o reconhecimento judicial de três faltas graves para embasar a justa causa. No pedido, relatou que o empregado já sofrera, desde 2017, diversas advertências por não cumprir normas internas, avariar cargas, fazer horas extras sem autorização e causar prejuízos a terceiros.

A principal falta grave apontada para a justa causa, porém, foram mensagens de WhatsApp em que, com termos ofensivos, o motorista afrontava o chefe com frases como “mande embora se vc tiver capacidade para isso”, e dizia que tinha vergonha de dizer que trabalhava em um “lixo de empresa”. Para a companhia, isso configura ato lesivo à honra e à boa fama do empregador.

Como desdobramento da falta grave, o motorista, no pátio da empresa, teria mostrado as mensagens aos demais colegas e novamente falado mal da empregadora, dizendo que ela não poderia demiti-lo em razão da estabilidade sindical. O ato foi classificado como mau procedimento. Além disso, ele teria se recusado a abrir conta para receber o salário, atitude considerada insubordinação.

Provas abundantes

O juízo de primeiro grau confirmou a justa causa. Com base nas provas apresentadas pela empresa, inclusive prints das telas de celular com as mensagens trocadas com o chefe, e nos depoimentos de testemunhas, a conclusão foi de que os incidentes diziam respeito apenas à esfera individual do trabalhador. Não foi comprovada atuação sindical ou em defesa dos demais trabalhadores, nem perseguição pelo mandato sindical.

O Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (PR) manteve a sentença, observando que o empregado já tinha histórico de advertências por descumprir obrigações e, quando passou a exercer mandato sindical, praticou as três faltas graves indicadas pela empresa.

O motorista tentou rediscutir o caso no TST, reconhecendo que sua conduta foi reprovável, mas “não foi praticada de má-fé, nem acarretou prejuízos à empresa”. Ele sustentou também que não foi observada a gradação pedagógica das penas e que a dispensa foi desproporcional e inadequada.

Gradação das penalidades

A relatora da matéria, desembargadora convocada Margareth Rodrigues Costa, observou que o TRT analisou os fatos e as provas da causa e verificou a reiteração de condutas inadequadas no ambiente de trabalho. Também constatou a gradação das penalidades pelo empregador, que tentou corrigir a conduta do trabalhador aplicando as punições de advertência e suspensão.

Na avaliação da magistrada, invalidar essa conclusão demandaria reexame de fatos e provas, não cabível na esfera do TST. Ela ressaltou que os TRTs são soberanos na avaliação do conjunto fático-probatório e que ao TST, como corte revisora, cabe somente a apreciação das questões de direito. Com informações da assessoria de imprensa do TST.

Clique aqui para ler o acórdão
AIRR 436-05.2019.5.09.0749 

https://www.conjur.com.br/2024-abr-02/dirigente-sindical-e-demitido-por-justa-causa-por-falar-mal-da-empresa/

Empresa tem de pagar horas extras em revezamento acima de 6 horas

A 3ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou o agravo de uma indústria contra sua condenação ao pagamento de horas extras além da sexta hora diária a um auxiliar de operação que fazia turnos ininterruptos de revezamento com jornada de 12 horas durante quatro dias consecutivos. A decisão que a empresa pretendia reformar considerou nula a cláusula coletiva que ampliava a jornada dos turnos para além de oito horas.

Segundo seu relato na reclamação, o auxiliar trabalhava em 2018 na indústria, na cidade de Serra (ES), no sistema de 12 horas diárias de trabalho, durante quatro dias, e quatro dias de folga (4 x 4), com alternância entre o horário diurno e o noturno. O regime era autorizado por norma coletiva.

Ainda segundo o trabalhador, a jornada de 12 horas durante quatro dias seguidos era “extremamente extenuante”. Por isso, ele pediu que as normas coletivas fossem declaradas inválidas e que lhe fossem pagas horas extraordinárias além da sexta.

Ao examinar o caso, o Tribunal Regional do Trabalho da 17ª Região (ES) manteve a sentença que havia considerado regular a jornada adotada, em razão da autorização na norma coletiva, e não deferiu as horas extras pretendidas pelo trabalhador.

Limite constitucional

O ministro Mauricio Godinho Delgado, relator do recurso de revista do auxiliar, destacou, em decisão monocrática, que o acordo coletivo pode estabelecer turnos ininterruptos de revezamento, desde que limitados a oito horas por dia, conforme estabelece o artigo 7º, inciso XIV, da Constituição Federal. Ultrapassado esse limite, considera-se irregular a cláusula coletiva (Súmula 423 do TST).

Com a nulidade da cláusula, o relator condenou a empresa ao pagamento das horas excedentes da sexta diária e da 36ª semanal como extraordinárias.

O agravo interposto pela empresa foi distribuído à desembargadora convocada Adriana Goulart de Sena Orsini. Segundo ela, as normas jurídicas que regem a duração do trabalho são, de maneira geral, imperativas. “Embora exista um significativo espaço à criatividade autônoma coletiva privada para criar regras específicas, há claros limites.”

A relatora observou que o Supremo Tribunal Federal, no Tema 1.046 de repercussão geral, reiterou que há limites objetivos à negociação coletiva, com a percepção de que determinados direitos são indisponíveis. A seu ver, o limite de oito horas por dia para os turnos de revezamento se enquadram nessa definição e representam patamar mínimo. Por unanimidade, o colegiado negou provimento ao agravo da empresa. Com informações da assessoria de imprensa do TST.

Clique aqui para ler o acórdão
RR 884-64.2018.5.17.0013 

https://www.conjur.com.br/2024-abr-02/empresa-tem-de-pagar-horas-extras-por-turno-de-revezamento-acima-de-6-horas/

05/04/2024

Vendedora consegue anular pedido de dispensa durante gravidez sem homologação sindical

O pedido de demissão da empregada estável só é válido com a assistência do sindicato

A Quarta Turma do Tribunal Superior do Trabalho anulou o pedido de demissão feito por uma vendedora da Amony Comércio de Artigos Infantis, pequena empresa de São Paulo, que estava grávida na ocasião. A nulidade decorreu do fato de a rescisão não ter sido homologada por sindicato ou autoridade competente, como determina a CLT, quando se trata de pedido de demissão de pessoa com direito à estabilidade.

Pedido de demissão

A vendedora disse que havia sido forçada a pedir demissão, durante a gravidez, após sofrer assédio de um cliente, fato que já havia sido comunicado a seu chefe. Outro motivo foi o medo de pegar covid-19, porque, segundo seu relato, a empresa não fornecia proteção e expunha empregados e clientes ao vírus.

Estabilidade da gestante

Contudo, pediu a nulidade da dispensa e o reconhecimento do direito à estabilidade, com indenização compensatória por esse período. Entre outros pontos, ela alegou que o pedido de demissão não havia sido homologado pelo sindicato, como exige o artigo 500 da CLT em casos que envolvem a estabilidade.

O juízo da 54ª Vara do Trabalho de São Paulo (SP) julgou improcedentes os pedidos, e o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região manteve a decisão. Para o TRT, a Constituição protege as gestantes apenas de despedidas por iniciativa do empregador, e o artigo 500 da CLT só se aplica a empregados com estabilidade por tempo de serviço.

Direito irrenunciável

A ministra Maria Cristina Peduzzi, relatora do recurso de revista da trabalhadora, afirmou que, de acordo com a jurisprudência do TST, é necessária a homologação, independentemente da duração do contrato de trabalho. “O reconhecimento jurídico da demissão da empregada gestante só se completa com a assistência do sindicato profissional ou de autoridade competente”, assinalou, lembrando que a estabilidade provisória é direito indisponível e, portanto, irrenunciável.

Por unanimidade, a Turma declarou nula a dispensa e determinou o retorno do processo ao TRT para que examine outros pedidos da vendedora.

(Guilherme Santos/CF)

Processo: RR-1000170-73.2021.5.02.0054 

https://tst.jus.br/web/guest/-/vendedora-consegue-anular-pedido-de-dispensa-durante-gravidez-sem-homologa%C3%A7%C3%A3o-sindical

Norma coletiva afasta pagamento de horas extras a representante comercial de cigarros

Segundo a cláusula, não era necessário controlar a jornada de vendedores e viajantes

A Quinta Turma do Tribunal Superior do Trabalho isentou a Souza Cruz Ltda. de pagar horas extras a um representante de marketing. Para o colegiado, deve ser respeitado o acordo coletivo que afasta a aplicação das normas de controle de jornada sobre a categoria de vendedores e viajantes em São Paulo.

Horas extras

O representante de marketing sustentou, na reclamação trabalhista, que trabalhava das 6h às 20h e, em alguns dias por mês, até às 22h. A jornada começava e terminava na loja física, onde pegava o veículo e a rota de atividades pela manhã e, à noite, fechava as contas e entregava os pedidos.

Atividade externa

A empresa se defendeu com o argumento de que, apesar de alguns momentos presenciais, o carro poderia ficar fora do estabelecimento quando não tivesse serviço e que não era possível controlar o tempo de trabalho. Pediu, assim, a aplicação do artigo 62, inciso I, da CLT, que exclui do controle de jornada os empregados que exercem atividade externa incompatível com a fixação de horário de trabalho.

Possibilidade de controle

O juízo da 32ª Vara do Trabalho de São Paulo (SP) determinou o pagamento das horas extras. Segundo a sentença, não se deve confundir a impossibilidade de controle da jornada com a ausência de controle. No caso, entendeu que a Souza Cruz deixou de controlar a duração do trabalho por sua livre e espontânea vontade, mas havia essa possibilidade, segundo testemunhas.

Sem autonomia

A sentença, porém, foi mantida. Segundo o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, o representante não tinha autonomia para definir seus horários porque tinha roteiro fixo e dava baixa das visitas pelo celular corporativo.

Função externa

Ao recorrer contra a condenação, a empresa sustentou que a não marcação de jornada tinha respaldo em norma coletiva firmada com o Sindicato dos Empregados Vendedores e Viajantes do Comércio do Estado de São Paulo. Pela cláusula, empresa e sindicato aceitam e reconhecem que os empregados que exercerem função externa e têm autonomia para definir seus horários e a forma de cumprimento de seu itinerário não são subordinados a horário de trabalho, conforme prevê o artigo 62 da CLT.

Vontade coletiva

Para o relator do recurso de revista da Souza Cruz, ministro Breno Medeiros, o TRT, ao afastar a norma coletiva que exclui o controle de jornada, acabou por desprestigiar a autonomia da vontade coletiva das partes e decidiu de forma contrária à tese firmada pelo Supremo Tribunal Federal sobre a matéria. No Tema 1.046 de repercussão geral, o STF definiu que são constitucionais os acordos e as convenções coletivas que, com base na adequação setorial negociada, limitam ou afastam direitos trabalhistas, desde que respeitados os direitos absolutamente indisponíveis. “Essa questão da jornada não é direito absolutamente indisponível nem constitui objeto ilícito”, concluiu o ministro.

A decisão foi unânime.

Processo: RR-1000634-37.2019.5.02.0032

(Guilherme Santos/CF)

https://tst.jus.br/web/guest/-/norma-coletiva-afasta-pagamento-de-horas-extras-a-representante-comercial-de-cigarros

 

Convenções coletivas não podem mudar cálculo de cotas de aprendizes e PcD

As regras sobre cotas de aprendizagem e de pessoas com deficiência (PcD) — previstas, respectivamente, na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e na Lei 8.213/1991 — não estabelecem, nem autorizam, restrições quanto à sua esfera de incidência ou à natureza das atividades desempenhadas pelo empregador. Já o artigo 611-B da CLT impede que convenções e acordos coletivos de trabalho suprimam ou reduzam medidas de proteção legal de crianças e adolescentes e critérios de admissão de trabalhadores com deficiência.

Assim, a Subseção II Especializada em Dissídios Individuais (SDI-2) do Tribunal Superior do Trabalho proibiu sindicatos de Santa Catarina de efetivar instrumentos coletivos que alterem a base de cálculo das cotas legais de aprendizagem e PcD.

O Ministério Público do Trabalho questionou convenções coletivas que autorizavam as empresas a calcular a cota de jovens aprendizes e a de PcD com base apenas no número de empregados dos seus respectivos setores administrativos internos.

A 7ª Vara do Trabalho de Florianópolis proibiu os sindicatos de estabelecer normas coletivas com tais flexibilizações. Em seguida, o Sindicato das Empresas de Segurança Privada de Santa Catarina (Sindesp-SC) e o Sindicato das Empresas de Asseio, Conservação e Serviços Terceirizados do estado (Seac-SC) contestaram a decisão de primeira instância.

Segundo os sindicatos, o artigo 611-B da CLT não prevê uma proibição expressa à adequação das cotas para ajustar a situação fática à realidade do setor.

Sem condições dignas

As entidades alegaram que a maioria dos serviços prestados pelas empresas associadas não oferece condições dignas a PcD, nem “se apresentam como uma oportunidade de progressão social” aos aprendizes. No caso do Seac, a maioria dos trabalhadores é contratada na função de serventes.

Em seu caso específico, o Sindesp apontou que empresas de vigilância não podem contratar ninguém com idade entre 12 e 18 anos. Além diso, a Lei 7.102/1993 exige idade mínima de 21 anos e aprovação em curso de formação para o exercício da função de vigilante. Ou seja, tais empresas também não podem contratar aprendizes de 18 a 21 anos.

O Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (SC), então, anulou a decisão de primeiro grau. Por isso, o MPT recorreu ao TST.

Conflito com a CLT

O ministro Luiz José Dezena da Silva, relator do caso, considerou que a “mitigação das cotas legais” entra em conflito com a proibição estipulada pelo artigo 611-B da CLT. Ou seja, a decisão da Vara de Florianópolis foi acertada.

Ele ressaltou que o objetivo das cotas de aprendizes e PcD é “proteger seus destinatários contra a discriminação que recai sobre determinados segmentos sociais no momento de sua inserção no mercado de trabalho”.

O advogado trabalhista Ronaldo Tolentino, sócio do escritório Ferraz dos Passos Advocacia, elogia o acórdão do TST: “As questões relativas às cotas legais são referentes a políticas públicas sociais e, portanto, não estão à disposição das partes envolvidas para fins de negociação”.

Para ele, a decisão “tem um grande impacto como jurisprudência e indicativo à sociedade dos limites das negociações”.

Clique aqui para ler o acórdão
ROT 549-88.2019.5.12.0000

https://www.conjur.com.br/2024-abr-05/convencoes-coletivas-nao-podem-mudar-calculo-de-cotas-de-aprendizes-e-pcd/

08/04/2024

Consórcio de transporte coletivo é solidariamente responsável por dívida de empresa que o integrava

Para a 3ª Turma, a caracterização de grupo econômico não necessita de subordinação e hierarquia entre pessoas jurídicas

A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho reconheceu a formação de grupo econômico entre uma empresa e um consórcio formado para explorar o serviço público de transporte coletivo de Florianópolis (SC). O colegiado considerou que a existência de um interesse comum voltado para o lucro e a atuação conjunta dos integrantes do Consórcio Fênix implica a responsabilidade solidária das empresas pelo pagamento das verbas trabalhistas devidas a um motorista.

Descumprimento de acordo

Um motorista de ônibus contratado pela Insular Transportes Coletivos Ltda. ajuizou a reclamação trabalhista alegando que a empresa não teria cumprido um acordo para pagamento parcelado, em 16 vezes, das suas verbas rescisórias. Segundo ele, a empresa fazia parte do Consórcio Fênix, responsável por parte do transporte coletivo em Florianópolis.

Sem hierarquia e subordinação

As instâncias ordinárias não reconheceram o grupo econômico em razão da falta de hierarquia e subordinação entre as empresas do consórcio, mantendo a responsabilidade exclusiva da Insular, que está em recuperação judicial. Inconformado, o motorista recorreu ao TST insistindo na existência do grupo econômico e na responsabilidade solidária do consórcio.

Grupo econômico por coordenação

O relator do recurso de revista, ministro José Roberto Pimenta, destacou que a Reforma Trabalhista (Lei 13.467/2017) estabeleceu que a coordenação entre empresas é suficiente para caracterizar um grupo econômico, mesmo que não haja hierarquia ou subordinação.

Responsabilidade solidária

Freire Pimenta esclareceu que, em casos análogos, em que há esse tipo de consórcio, a jurisprudência prevalecente do TST considera incontroversa a prestação coordenada de serviços, ainda que haja autonomia das empresas, o que configura formação de grupo econômico. Em razão disso, o ministro reconheceu a responsabilidade solidária dos envolvidos pelas verbas rescisórias não pagas ao motorista.

A decisão foi unânime. Contudo, houve a apresentação de embargos de declaração, ainda não julgados.

(Bruno Vilar/CF)

Processo: RRAg-338-70.2021.5.12.0036

https://tst.jus.br/web/guest/-/cons%C3%B3rcio-de-transporte-coletivo-%C3%A9-solidariamente-respons%C3%A1vel-por-d%C3%ADvida-de-empresa-que-o-integrava

Empresa de logística vai indenizar vendedora que ficou 15 anos sem férias

Para a 6ª Turma, a não concessão de férias durante todo o vínculo de emprego configura ato ilícito grave

A Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho condenou a Nordil-Nordeste Distribuição e Logística Ltda. a pagar R$ 50 mil de indenização por danos morais por não ter concedido férias a uma vendedora em 15 anos de contrato de trabalho. Para o colegiado,  a ausência de concessão de férias durante todo o vínculo de emprego configura ato ilícito grave praticado pela empresa e implica reparação por danos morais. Haverá também o pagamento em dobro das férias dos últimos cinco anos anteriores ao fim do contrato, de acordo com o prazo de prescrição.

Sem férias por 15 anos

A vendedora pracista disse que trabalhou para a Nordil de agosto de 2002 a outubro de 2017 e, durante os 15 anos, não havia tirado nenhum período de férias. Então, na Justiça, pediu a remuneração dos descansos não aproveitados e indenização por danos morais.

Férias em dobro

O juízo da 6ª Vara do Trabalho de Campina Grande (PB) constatou as irregularidades e deferiu o pagamento em dobro das férias dos últimos cinco anos anteriores ao fim do contrato, de acordo com o prazo de prescrição de cinco anos. Porém, negou a indenização. A decisão foi mantida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 13ª Região (PB).

Descumprimento da lei

Para o TRT, a falta de férias não implica, automaticamente, o dano moral: seria necessário demonstrar que a situação violou a honra, a dignidade ou a intimidade da trabalhadora. Embora reconhecendo que a falta do descanso dificulta o convívio social e o descanso, o tribunal regional concluiu que a empresa havia apenas descumprido obrigações legais, cabendo, assim, a reparação material prevista na legislação trabalhista em relação às férias.

Bem-estar físico e mental

O relator do recurso de revista da vendedora, ministro Augusto César, explicou que as férias previstas na CLT visam preservar e proteger o lazer e o repouso da empregada, a fim de garantir seu bem-estar físico e mental,  principalmente por razões de saúde, familiares e sociais. Portanto, a ausência de férias durante todo o contrato caracteriza ato ilícito grave da empresa e motiva a reparação por danos morais à trabalhadora, além do pagamento em dobro das férias.

Indenização

Para determinar o valor da indenização, o ministro levou em conta a gravidade do caso, a extensão do dano e a capacidade econômica das partes. A seu ver, a gravidade é alta, por se tratar de ato deliberado do empregador, sem justificativa em eventual força maior. A extensão do dano também foi considerada severa, porque a não concessão não foi um fato episódico: ela se deu durante todo o vínculo de emprego. Por fim, o ministro considerou R$ 50 mil um valor razoável, diante da capacidade econômica da empresa e da vendedora.

A decisão foi unânime.

(Guilherme Santos/CF)

Processo: RRAg-905-14.2019.5.13.0014 

https://tst.jus.br/web/guest/-/empresa-de-log%C3%ADstica-vai-indenizar-vendedora-que-ficou-15-anos-sem-f%C3%A9rias

 

10/04/2024

Dispensa de motorista com câncer de rim é considerada discriminatória

A empresa não conseguiu provar outro motivo para o ato

A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho condenou a Expresso São Miguel Ltda., de Cascavel (PR), a indenizar um motorista dispensado durante tratamento de câncer. O colegiado reafirmou a jurisprudência do Tribunal de que o empregador deve provar que houve um motivo plausível para a dispensa, caso contrário presume-se que é discriminatória.

Cirurgias

Admitido em junho de 2013, o motorista passou por duas cirurgias no ano de 2017. Na primeira, retirou um câncer no rim e, quatro meses depois, passou por outra cirurgia para tirar outro câncer no músculo da coluna. Ele retornou ao trabalho, continuou o tratamento, mas foi dispensado em maio de 2019.

Na reclamação, ele disse não ter dúvidas que sua dispensa foi discriminatória, por ter ocorrido após a empresa tomar ciência dos seus problemas de saúde e avisar que precisaria se afastar pelo INSS. Na visão do trabalhador, a conduta da Expresso foi abusiva ao despedi-lo em um momento em que estava com a saúde debilitada.

Corte de gastos

Em contestação, a empresa sustentou que reduzira seu quadro funcional, fechando duas linhas e dispensando, além do motorista, mais três empregados. A Expresso afirmou ainda que não tinha ciência da doença ao demiti-lo

Comprovação

Para a 3ª Vara do Trabalho de Cascavel e o Tribunal Regional do Trabalho, a discriminação não ficou comprovada. Para o TRT, o câncer não gera estigma ou preconceito, não causa hostilidade, rejeição ou repugnância ao trabalhador. Além disso, não é uma doença infectocontagiosa, como o HIV.

Ônus

Também, segundo a decisão, o motorista deveria ter comprovado suas alegações. “Não era ônus da empresa comprovar a existência de uma causa efetiva que a tenha levado a encerrar o contrato de trabalho do motorista, mas sim do empregado comprovar, de forma cabal, que foi demitido por questões discriminatórias”.

Súmula

O ministro Alberto Balazeiro, relator do recurso da empresa, observou que, de acordo com a jurisprudência do TST (Súmula 443), é discriminatória a dispensa quando a doença causa estigma ou preconceito. Nessa circunstância, o trabalhador não tem o ônus de comprovar a discriminação. “O TRT errou ao não considerar a doença estigmatizante e errou ao atribuir o ônus da prova ao trabalhador”, observou.

Conduta mascarada

Ao afastar o ônus da prova do motorista, o ministro explicou que o empregador está em condições mais favoráveis de produzi-la. “É extremamente difícil ao empregado demonstrar a conduta discriminatória do empregador, sobretudo porque ela é discreta ou mascarada por outras motivações”.

Segundo o ministro, o empregador deve indicar algum motivo para a dispensa, o que não ocorreu nos autos. A seu ver, o fato de três colegas também terem sido dispensados na mesma época não é suficiente para demonstrar que não houve discriminação.

Com a decisão, o caso deve retornar ao Tribunal Regional para que sejam examinados os pedidos do empregado de  reintegração e indenização por dano moral.

(Ricardo Reis/CF)

Processo: RR-1055-45.2019.5.09.0195

https://tst.jus.br/web/guest/-/dispensa-de-motorista-com-c%C3%A2ncer-de-rim-%C3%A9-considerada-discriminat%C3%B3ria

11/4/24

Imóvel com uso comercial também pode ser bem de família

O local era a sede de uma escola, mas também residência do dono

A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho afastou a penhora de imóvel do dono do Colégio Teorema, de Belém (PA), para pagamento de créditos trabalhistas a um professor de geografia. Foi constatado que o imóvel penhorado, avaliado em R$ 5 milhões, onde funciona a escola, está protegido por ser bem de família.

Documentos duvidosos

A constatação de bem de família vinha sendo questionada pelo professor, que alegava que o empresário não reside no imóvel e teria outra propriedade. Segundo o docente, ele teria se instalado nas dependências da escola após o início da execução, para evitar a penhora, e apresentado “documentos duvidosos” de que o imóvel seria bem de família.

Lei

Segundo a Lei 8.009/1990, é considerado bem de família o imóvel destinado à moradia do devedor e de sua família. Ele deve ser de propriedade do casal ou da família e, nessa circunstância, é impenhorável por qualquer tipo de dívida contraída pelos cônjuges, pelos pais ou pelos filhos que sejam proprietários e nele residam.

Penhora

A sociedade de ensino foi condenada a pagar parcelas trabalhistas no valor de R$ 111 mil e, em junho de 2010, o professor pediu a execução provisória da sentença. Segundo sua lógica, em razão do alto valor, o imóvel poderia ser vendido em leilão público, deduzindo-se o valor do crédito, e, com o saldo, o empresário poderia comprar outro imóvel, assegurando seu direito de moradia. A penhora foi determinada em outubro do mesmo ano.

Documentos

Em junho de 2012, o Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região (PA/AP) confirmou a alienação do imóvel, por entender que, apesar de o empresário apresentar comprovantes de residência, notas fiscais de compra de mobília e recibos de Imposto de Renda informando o endereço do imóvel, entre outros documentos, nenhum era suficiente para provar que o imóvel se enquadrava como bem de família.

Moradia

O empresário recorreu, argumentando que, embora o imóvel seja a sede do Colégio Teorem, foram apresentados documentos que comprovam que ele também lhe serve de moradia e, portanto, seria impenhorável.

Proteção

Para o relator do recurso de revista, ministro Hugo Scheuermann, o imóvel penhorado goza da proteção conferida ao bem de família. Ele explicou que, não havendo prova da existência de outros imóveis utilizados como moradia permanente, o fato de o local também ser utilizado com finalidade comercial não afasta sua natureza de bem de família.

O ministro assinalou que o alto valor também não a proteção e que a alegação de que o empresário mora de forma fraudulenta no imóvel tem de ser provada pelo professor, mas não há nenhuma menção a esse respeito na decisão do TRT.

(Ricardo Reis/CF)

Processo: Ag-RR – 108100-45.2009.5.08.0015

https://tst.jus.br/web/guest/-/im%C3%B3vel-com-uso-comercial-tamb%C3%A9m-pode-ser-bem-de-fam%C3%ADlia

15/04/2024

Hamburgueria é responsável por acidente de trajeto que deixou atendente paraplégico

Empregado dormiu pilotando moto após jornada noturna exaustiva

A Subseção I Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1) do Tribunal Superior do Trabalho reconheceu a responsabilidade da FCD Hambúrgueres Comércio de Alimentos Ltda. (Rede Bob’s) pelo acidente sofrido por um atendente de balcão da loja do Aeroporto Internacional de Belo Horizonte, em Confins (MG), após uma jornada de trabalho exaustiva. Ele dormiu enquanto pilotava sua motocicleta no trajeto para casa e ficou paraplégico.

O colegiado restabeleceu decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (MG) que havia reconhecido a relação entre o acidente e o trabalho e deferido indenização por danos morais e materiais. Com isso, o processo retorna à Quarta Turma do TST, que havia decidido em sentido contrário.

Paralisia

O atendente trabalhava das 21h50 às 5h50, e o acidente ocorreu por volta das 6h da manhã, provocando lesão na coluna e paralisia irreversível das pernas. Na ação trabalhista, ele sustentou que, naquele turno de 25 para 26/5/2015, tinha sido submetido a trabalho exaustivo, em razão da falta de oito empregados da sua equipe de 13 pessoas. O cansaço teria reduzido sua atenção na condução do veículo.

Prova oral

O pedido de indenização foi julgado improcedente pelo juízo de primeiro grau. Mas o TRT da 3ª Região destacou que a empresa não havia comprovado seus argumentos sobre a jornada do empregado naquele dia, pois o controle de ponto não tinha sido preenchido. Também levou em conta o depoimento do gerente relatando que, no dia, muitos empregados haviam faltado.

Considerando as condições físicas do trabalhador e o fato de o trabalho ter contribuído para o evento (concausalidade), o TRT condenou a empresa a pagar indenização de R$ 200 mil por dano material e de R$ 80 mil por dano moral.

Menor movimento

Ao examinar o recurso de revista da empresa, a Quarta Turma do TST isentou-a de responsabilidade pelo acidente, por entender que não ocorrera uma ausência significativa de empregados no dia e que a jornada do atendente não tinha sido estendida. Ainda de acordo com a Turma, “o turno noturno é o que tem menor movimento”.

Sem respaldo

Para o relator dos embargos do trabalhador à SDI-1, ministro Cláudio Brandão, a constatação da Quarta Turma de que o turno noturno é menos movimentado não tem respaldo na decisão do TRT, pois não há nenhuma afirmação a respeito. Além disso, a conclusão de que não teria havido faltas significativas  nem elastecimento da jornada do atendente não combina com o contexto fático-probatório delineado no voto vencedor do TRT, que registrou que o gerente havia admitido essas circunstâncias.

Voto vencido

Brandão constatou que a Turma, para absolver a FCD, considerou fundamentos do voto vencido no TRT. Ocorre que a SDI-1 pacificou o entendimento de que só é possível usar fatos registrados no voto vencido quando não sejam contrários aos delineados no voto vencedor, como no caso.

A decisão foi unânime.

(Lourdes Tavares/CF)

Processo: RR-10535-68.2016.5.03.0179

https://tst.jus.br/web/guest/-/hamburgueria-%C3%A9-respons%C3%A1vel-por-acidente-de-trajeto-que-deixou-atendente-parapl%C3%A9gico

 

19/04/2024

 

Greve de rodoviários de Recife é declarada não abusiva por empresas descumprirem acordo

Sindicato patronal tinha se comprometido a não exigir acúmulo de funções de motorista e cobrador

A Seção Especializada em Dissídios Coletivos (SDC) do Tribunal Superior do Trabalho declarou não abusiva a greve feita pelo sindicato da categoria dos rodoviários em Recife e nas regiões metropolitanas da Mata Sul e do Norte de Pernambuco em 22 e 23/12/2020. Para essa decisão, o colegiado considerou que o sindicato patronal não respeitou o compromisso entre as partes para não exigir de seus empregados o exercício da função cumulada de motorista e cobrador, o que motivou o início da greve. A SDC determinou também o pagamento dos dias não trabalhados aos que participaram do  movimento grevista.

Pedido de abusividade da greve

O dissídio coletivo de greve foi ajuizado pelo Sindicato das Empresas de Transportes de Passageiros no Estado de Pernambuco (Urbana/PE) contra o Sindicato dos Trabalhadores em Transportes Rodoviários Urbanos de Passageiros do Recife e Regiões Metropolitana da Mata Sul e Norte de Pernambuco, requerendo o reconhecimento da ilegalidade e  da abusividade do movimento paredista. As empresas argumentaram que foram desrespeitadas as disposições contidas na Lei de Greve (Lei 7.783/89).

Por maioria, o Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região (PE), considerando os transtornos e prejuízos sofridos pela população, entendeu terem sido extrapolados os limites da Lei 7.783/89 e declarou a abusividade da greve, de 22/12/2020 ao início da tarde de 23/12/2020. Em consequência, declarou a suspensão do contrato de trabalho nesses dias, ficando os empregadores desobrigados do pagamento dos salários correspondentes àqueles trabalhadores que não compareceram ao serviço.

TST

No recurso ao TST, o sindicato dos trabalhadores alegou que não constitui abuso do exercício do direito de greve a paralisação que tenha por objetivo exigir o cumprimento de acordo. Argumentou que a greve foi motivada pelo descumprimento de três cláusulas negociadas em Audiência de Mediação, realizada em 23/11/2020, sendo uma delas o fim da acumulação de funções de motorista e cobrador. Conforme o sindicato, o “ponto central do conflito” é a recusa dos trabalhadores rodoviários em renovar a cláusula 25ª da CCT do período imediatamente anterior (2019/2020), que estabelecia o acúmulo de funções de motorista e cobrador.

Ainda conforme o sindicato, a greve foi suspensa em face da concordância da categoria patronal quanto à não prorrogação da vigência da referida cláusula 25ª, nos termos da cláusula 3ª do acordo firmado em audiência.  Apesar disso, o regime de “dupla função” foi restabelecido, o que denota o descumprimento dos termos do acordo e justifica a retomada do movimento paredista.

Descumprimento patronal de cláusula

Segundo o relator do recurso, ministro Mauricio Godinho Delgado, a própria Lei de Greve tipifica como excludentes da abusividade da greve realizada em período de vigência de instrumento coletivo negociado “os casos em que se configure o descumprimento patronal de cláusula convencional e em que ocorrer uma alteração significativa das condições pactuadas”. Ainda segundo o ministro, tem razão o sindicato dos trabalhadores quanto ao descumprimento do acordo, pois a cláusula que trata da prorrogação da vigência da CCT imediatamente anterior (2019/2020), pelo prazo de um ano, excluía, explicitamente, a Cláusula 25ª, que autorizava a cumulação das funções de motorista e cobrador, a denominada “dupla função”.

Conforme o relator, na Ata da Audiência de Mediação, o sindicato das empresas anuiu, “expressamente’, com a não renovação da Cláusula 25ª da CCT 2019/2020, que trata da permissão da cumulação de funções de motorista e cobrador, “sem registrar qualquer ressalva, inclusive no tocante à arguição de inconstitucionalidade da lei local que vedava a dupla função”.

Para Godinho Delgado, ainda que, embora portaria editada pelo Governo do Estado proibindo a dupla função de motorista com a de cobrador, em toda Região Metropolitana do Recife, tenha sido revogada em face de decisão judicial em caráter liminar que suspendeu os efeitos da lei municipal que trata do tema, “o fato é que, em audiência de conciliação pré-processual, as partes coletivas acordaram expressamente pela não prorrogação da Cláusula 25ª e 27ª da CCT 2019/2020, que trata da ‘dupla função’”.

“Resistência legítima”

Na avaliação do relator, seria “legítima a resistência dos trabalhadores em não exercer a atividade concomitante de motorista e cobrador”, pois a pretensão do sindicato patronal é manter a validade do exercício da cumulação das funções de motorista e cobrador, apesar de tal pretensão claramente contrariar o acordo celebrado com a categoria profissional.

Por isso, segundo Godinho Delgado, em face da conduta reprovável do sindicato patronal, que não respeitou o acordo entre as partes, motivando, portanto, a eclosão do movimento paredista, e das peculiaridades da greve deflagrada – cumprimento das formalidades legais e duração inferior a 48 horas -, “considera-se a greve não abusiva, nos termos do artigo 14, incisos  I e II, da Lei 7.783/89 e da jurisprudência desta SDC”.

Pagamento dos dias não trabalhados

Conforme o relator, quando se trata de greve em função do não cumprimento de cláusulas contratuais e/ou convencionais relevantes, “a greve deixa de produzir o efeito da mera suspensão” (quando os dias de greve não são pagos, conforme jurisprudência do TST). “Passa a ser enquadrada como interrupção contratual, com o pagamento dos dias não trabalhados”, concluiu.

(Lourdes Tavares/GS)

https://tst.jus.br/web/guest/-/greve-de-rodovi%C3%A1rios-de-recife-%C3%A9-declarada-n%C3%A3o-abusiva-por-empresas-descumprirem-conven%C3%A7%C3%A3o

 

TST rescinde homologação de acordo entre sindicato e empresa aérea só para um comandante

Acordo, aprovado em assembleia, determinava que aeronauta assinasse termo de adesão, o que não ocorreu

A Subseção II Especializada em Dissídios Individuais (SDI-2) do Tribunal Superior do Trabalho admitiu ação rescisória de um comandante para desconstituir, unicamente em relação a esse trabalhador, a sentença que homologou acordo judicial entre o Sindicato Nacional dos Aeronautas e a Gol Linhas Aéreas S.A. A negociação, realizada no âmbito de uma reclamação trabalhista, foi desfavorável ao aeronauta, que não deu sua concordância expressa ao sindicato em relação aos termos do acordo, o que tornou o ajuste inválido quanto ao comandante.

Acordo entre Gol e sindicato

O caso teve início quando o Sindicato Nacional dos Aeronautas ajuizou ação de cumprimento com pedido de tutela antecipada contra a VRG Linhas Aéreas S.A., adquirida pela Gol Linhas Aéreas, por ter descumprido norma coletiva. O sindicato postulou a reintegração dos aeronautas demitidos, porque a empresa não atendeu às exigências sequenciais e prioritárias nas dispensas por redução de força do trabalho. A ação foi julgada procedente e a Gol interpôs recurso, ao qual foi negado provimento.

Na sequência, a empresa tentou rediscutir o caso no TST e, ao chegar à Sétima Turma, o relator intimou as partes a se manifestarem sobre o interesse em conciliação. Após tratativas, foi celebrado acordo, abrangendo somente os comandantes, que, por maioria, concordaram com o ajuste em assembleia geral extraordinária. Ficaram de fora do acordo, homologado pelo relator, os copilotos e os comissários de bordo. Para eles, prosseguiu-se o julgamento do agravo de instrumento.

Ação do aeronauta

O comandante alegou, na ação rescisória dirigida à SDI-2, que votou contra o acordo na assembleia geral extraordinária. Argumentou que, para a validade do acordo, era imprescindível o sindicato ter autorização individual de cada substituído, que não poderia ser suprida pela realização de assembleia de trabalhadores. Alegou a ilegitimidade do sindicato para assinar o acordo, porque não houve sua anuência expressa e individual com os termos da negociação.

Valores

O relator da ação rescisória do comandante, ministro Dezena da Silva, assinalou, sobre os termos do acordo, que foram concedidas aos comandantes duas opções: indenização ou contratação. Caso o comandante optasse pela indenização, receberia R$ 78 mil. Na assembleia geral extraordinária realizada pelo sindicato para definir a posição dos 17 comandantes, a proposta foi aprovada por 11 votos a favor e 6 contra. O comandante em questão votou contra a proposta de acordo, por entender que ela não atendia a seus interesses.

Segundo Dezena da Silva, é importante destacar que o acordo foi celebrado e homologado na pendência de julgamento de agravo de instrumento em recurso de revista, interposto contra acórdão do TRT, que manteve a sentença favorável aos substituídos, entre eles, o comandante. Ressaltou que a sentença julgou procedentes os pedidos do sindicato para “determinar (…) a reintegração dos substituídos ao emprego ou os salários e todos os demais benefícios devidos na constância do contrato de trabalho, caso fosse inviável o cumprimento da ordem reintegratória”.

Para ter uma ideia do valor da indenização em discussão na ação originária referente ao comandante, demitido pela Gol em 19/6/2012, o relator fez um cálculo aproximado e chegou a R$ 2,1 milhões. Ele chegou a esse valor multiplicando o período de salários devidos (de 20/06/2012 até a data da assembleia, em 13 e 14/10/2021), que é de 111,57 meses, pela última remuneração do trabalhador, de R$ 19.190,96. A proposta de indenização do acordo, por outro lado, fixou R$ 78 mil.

Termo de adesão

Em sua fundamentação, o relator destacou que no acordo celebrado constava que, para formalizar sua opção, o aeronauta deveria preencher e assinar o termo de adesão que seria fornecido pelo sindicato. Pela cláusula 2.1, era necessário o preenchimento e a assinatura do termo de adesão pelos substituídos para a formalização da opção escolhida.

Porém, o próprio sindicato informa que “o autor da ação rescisória não assinou termo de adesão que permitisse o recebimento conforme o acordo”. Sem a anuência expressa, ainda segundo o relator, “não há como cogitar que o acordo incida de forma válida sobre os direitos do comandante, pois, para a validade do negócio jurídico, a vontade deve ser declarada ou manifestada por um agente ou sujeito capaz e legitimado”, conforme o artigo 104 do Código Civil.

Ilegitimidade do sindicato

“Diante da ausência de concordância prévia e expressa com os termos do acordo, é manifesta a ilegitimidade do sindicato para, em nome deste comandante, celebrar o acordo”, afirmou o relator. Ele ressaltou que o substituto processual, no caso o sindicato, não poderia, sem autorização,  dispor do direito material do piloto.

Portanto, o acordo firmado pelo sindicato nos autos da reclamação trabalhista matriz, sem autorização do comandante para transacionar ou renunciar a direitos, “não pode produzir os efeitos próprios da coisa julgada em relação ao autor da ação rescisória”. Dessa forma, o relator entendeu caracterizada a violação ao artigo 104, inciso I, do Código Civil, havendo fundamento para, em relação ao comandante, invalidar a transação do termo homologatório lavrado na reclamação trabalhista.

Com essa fundamentação, a SDI-2 julgou parcialmente procedente a ação rescisória para desconstituir, unicamente em relação ao autor, a sentença que homologou o acordo judicial entabulado na reclamação trabalhista e determinar, em relação a esse comandante, o regular prosseguimento da ação originária, com retorno dos autos à Sétima Turma do TST, para o julgamento do agravo de instrumento em recurso de revista.

(Lourdes Tavares/GS)

Processo: AR – 1001055-75.2022.5.00.0000

https://tst.jus.br/web/guest/-/tst-rescinde-homologa%C3%A7%C3%A3o-de-acordo-entre-sindicato-e-empresa-a%C3%A9rea-s%C3%B3-para-um-comandante

 

22/04/2024

Existência de grupo econômico define responsabilidade solidária por período misto

Vigência do contrato de professor abrangeu período antes e depois da Reforma Trabalhista

A Oitava Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou, por maioria, examinar recursos da Associação Salgado de Oliveira de Educação e Cultura e da Socol Salgado de Oliveira Construções Ltda., condenadas a pagar solidariamente, por fazerem parte do mesmo grupo econômico, verbas trabalhistas devidas a um professor de educação física de Juiz de Fora (MG), de 15/2/2017 a 15/7/2019.

Reforma Trabalhista

O caso foi destacado, porque o tempo do contrato de trabalho do professor compreende um período misto, antes e depois da entrada em vigor da Reforma Trabalhista de 2017 (Lei 13.467/17). Pela decisão, o artigo 2º da CLT, já atualizado pela Lei 13.467, deve ser aplicado às relações iniciadas ou já consolidadas antes da vigência desta lei.

A associação e a Socol contestaram a existência de grupo econômico, reconhecido pelo juízo de primeiro grau e mantido pelo Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (MG). Ao ratificar a sentença, o TRT aplicou ao caso o artigo 2º da CLT, atualizado pela Reforma Trabalhista de 2017, que considera grupo econômico quando há comunhão de interesses e atuação conjunta das empresas, o que teria sido comprovado no processo.

Dispensa em massa

Admitido pela Associação Salgado de Oliveira de Educação e Cultura em 15/02/2017 para exercer a função de gestor de curso, o professor de educação física foi dispensado em 15/07/2019. Surpreendido, juntamente com mais de 65 colegas com uma demissão em massa realizada pela Associação Salgado de Oliveira, o gestor não recebeu verbas rescisórias.

Responsabilidade solidária

Na ação trabalhista, além dos valores, ele requereu a responsabilidade solidária da Socol e da Sociedade de Ensino do Triângulo S/S Ltda., alegando que fariam parte do mesmo grupo econômico da associação.

Em sua defesa, a empregadora admitiu ter dispensado imotivadamente o professor e reconheceu que deixou de pagar o saldo rescisório por causa de crise financeira.

A 2ª Vara do Trabalho de Juiz de Fora (MG) condenou a empregadora a pagar as verbas rescisórias, ressaltando que os riscos da atividade econômica do empreendimento cabem ao empregador e que a existência de crises financeiras não autoriza o descumprimento das obrigações trabalhistas que possuem natureza alimentar.

Em relação à responsabilidade solidária, a sentença julgou procedente o pedido de reconhecimento do grupo econômico e determinou que as rés respondam solidariamente pela satisfação do crédito do trabalhador, por existir identidade dos sócios, inclusive no mesmo ramo (no caso da Sociedade de Ensino do Triângulo), presumindo também existência de coordenação entre as rés.

Recursos

Ao analisar recursos contra a sentença, o TRT da 3ª Região enfatizou que o fato de a associação ser entidade sem fins lucrativos não constitui obstáculo para a configuração de grupo econômico, como alegou a empregadora, pois não impede a formação do vínculo de emprego. Com fundamento nas provas dos autos, o TRT também concluiu pela existência de grupo econômico, porque, além da subordinação à mesma direção, controle ou administração, também ficaram demonstradas a atuação conjunta e a comunhão de interesses entre as empresas demandadas, conforme dispunha o artigo 2º, parágrafo 2º, da CLT, antes das alterações realizadas pela Lei 13.467/2017.

A associação e a Socol tentaram rediscutir o caso no TST sustentando não existir grupo econômico. A primeira alegou que é uma associação civil de direito privado, “não possuindo quadro societário, e, portanto, não se enquadra no conceito de empresa, impossibilitando a configuração de grupo econômico”. A Socol argumentou que as premissas do TRT não se enquadram na moldura legal do grupo econômico, pois não atendem “ao pressuposto de interesse integrado, atuação conjunta e totalmente hierarquizada”.

Questão nova

A relatora dos agravos na Oitava Turma, ministra Delaíde Miranda Arantes, destacou tratar-se de questão nova relativa à configuração de grupo econômico, devido às alterações ocorridas com a Lei 13.467/2017. Ela assinalou que o TST uniformizou seu entendimento de ser necessária, para a configuração do grupo econômico, a constatação de relação de subordinação hierárquica entre as empresas e que o simples fato de haver sócios em comum ou relação de coordenação não implicaria por si só o reconhecimento do grupo econômico.
Aplicação antes e depois da Lei 13.467/17

No entanto, a ministra enfatizou que, com a entrada em vigor da Reforma Trabalhista, o artigo 2º da CLT foi alterado e incluído o parágrafo 3º, “para contemplar a modalidade de grupo econômico formado a partir da comunhão de interesses e atuação conjunta das empresas”. Além disso, segundo ela, esse artigo também deve ser aplicado às relações iniciadas ou já consolidadas antes da vigência da Lei 13.467/17.

Delaíde Arantes frisou que, no caso, o contrato do professor foi encerrado em 2019, já sob a vigência da Lei 13.467/2017, que imprimiu nova redação ao artigo 2º, parágrafo 2º e acresceu o parágrafo 3º, da CLT, “para admitir a caracterização do grupo econômico por coordenação, em consonância com a tese eleita no acórdão do TRT”.

Na avaliação da relatora, caracterizada pelo Tribunal Regional a existência de sócio em comum, de atuação conjunta e comunhão de interesses entre as empresas demandadas, não houve violação a dispositivo legal ou constitucional, como alegado pela associação e pela Socol, pois a situação fática não pode ser reexaminada pelo TST.

Por maioria, vencido o ministro Sérgio Pinto Martins, que dava provimento aos apelos, a Oitava Turma negou provimento aos agravos.

(Lourdes Tavares/GS)

Processo: AG-AIRR – 11077-25.2019.5.03.0036 

https://tst.jus.br/web/guest/-/exist%C3%AAncia-de-grupo-econ%C3%B4mico-define-responsabilidade-solid%C3%A1ria-por-per%C3%ADodo-misto

 

25/04/2024

Data de fim do contrato por rescisão indireta não precisa ser a do ajuizamento da ação

A data da dispensa deve ser a da decisão que declarar a rescisão ou o último dia de trabalho efetivo

A Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho decidiu que a data do fim do contrato de uma empregada da JBS S.A. que pediu rescisão indireta não deve ser o dia em que ela apresentou a ação para terminar a relação de emprego. Como ela continuou a trabalhar lá após o início do processo, o dia da baixa na CTPS será a data da decisão definitiva reconhecendo a rescisão ou do efetivo término da prestação de serviços, o que ocorrer primeiro. Caso o contrário, ela terá prejuízo.

Insalubridade

A rescisão indireta do contrato, prevista no artigo 483 da CLT, se dá quando o empregador comete alguma falta grave que inviabilize a continuidade da prestação de serviço. No caso, a trabalhadora atuava no ajuste dos cortes de carne na fábrica da JBS em Araputanga (MT), e alegou na reclamação trabalhista que o ambiente era insalubre, sem proteção, e que não havia autorização para estender a jornada nessas condições. Ainda mencionou como motivos o não pagamento integral de horas extras e a não concessão integral dos intervalos térmicos.

Risco à saúde

O juízo da Vara do Trabalho de Mirassol D’Oeste (MT) negou o pedido da empregada, mas o Tribunal Regional do Trabalho da 23ª Região entendeu que ficou comprovado que o serviço gerava risco à saúde da funcionária, até porque a empresa havia feito acordo coletivo para começar a pagar adicional de insalubridade meses antes de ela apresentar a ação. Nos oito anos anteriores, ela exerceu atividade insalubre sem compensação.

Com isso, o TRT declarou o contrato encerrado em 7 de outubro de 2021, dia em que a trabalhadora havia ajuizado a ação. No recurso ao TST, a refiladora pediu a alteração da data, uma vez que havia continuado a trabalhar após apresentar a reclamação trabalhista.

Prejuízo

A relatora, ministra Liana Chaib, explicou que o artigo 483, parágrafo 3º, da CLT permite que a pessoa, ao pedir a rescisão indireta do contrato de trabalho, permaneça em serviço até a decisão final do processo. No caso, ao determinar que a baixa fosse na data do ajuizamento causou prejuízos à empregada, em razão da sua repercussão nas verbas rescisórias e no saldo do FGTS, entre outras parcelas.

A decisão foi unânime.

(Guilherme Santos/CF)

Processo: RR-716-49.2021.5.23.0091

https://tst.jus.br/web/guest/-/data-de-fim-do-contrato-por-rescis%C3%A3o-indireta-n%C3%A3o-precisa-ser-a-do-ajuizamento-da-a%C3%A7%C3%A3o

 

29/04/2024

Família não será indenizada por morte de motorista em acidente causado por excesso de velocidade

Segundo a perícia, ele dirigia a 132 km/h numa rodovia em que a velocidade máxima era 60 km/h

A Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou o recurso da família de um caminhoneiro de Presidente Venceslau (SP) que pedia a responsabilização da VMH Transportes Ltda. pelo acidente que vitimou o motorista. Prevaleceu o entendimento de que houve culpa exclusiva da vítima, que estava dirigindo em alta velocidade.

Caminhão puxando para a esquerda

O acidente ocorreu em novembro de 2017 na Rodovia MT-130, em Poxoréo (MT). O caminhão saiu da pista e tombou para a esquerda numa curva acentuada. Aos  52 anos, o motorista deixou a mulher e três filhas que, segundo o processo, dependiam dele.

Na ação trabalhista, uma das filhas relatou que o pai, dias antes, em conversa por aplicativo, havia reclamado que o caminhão estava puxando para a esquerda. A mensagem foi utilizada para compor a tese de responsabilidade da empresa pelo ocorrido.

Estradas acentuam riscos

Dentro da mesma tese, o advogado da família sustentou que o motorista estava exposto a risco muito mais acentuado se comparado com as demais atividades, sobretudo em razão das condições das estradas brasileiras.

Motorista tinha diversas multas

A empresa, em sua defesa, alegou que o veículo era seminovo e estava em perfeitas condições. “Se tivesse realmente algum problema, ele deveria ter reportado à empresa”, afirmou. A VMH também apresentou laudo pericial do Instituto de Criminalística da Polícia Civil do Estado de Mato Grosso que concluía que o condutor trafegava pelo trecho em velocidade acima da permitida. Informou ainda que o motorista havia recebido diversas multas por excesso de velocidade durante o contrato de trabalho.

Perícia comprovou alta velocidade

Para o juízo da Vara do Trabalho de Presidente Venceslau, o laudo pericial revelou boas condições de pista e tráfego e, por outro lado, não constatou problemas mecânicos no veículo. Segundo a perícia, o caminhão trafegava a 132,6 km/h no momento do acidente, numa pista em que a velocidade máxima era de 60 km/h. A sentença concluiu que não poderia prevalecer o critério objetivo de responsabilização quando o acidente decorre de culpa exclusiva da vítima”.

A decisão foi mantida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (Campinas/SP).

Ato voluntário contra regras de segurança

O relator do recurso de revista da família, ministro Amaury Rodrigues, observou que o caso não é de falha humana (que poderia ser inserida no âmbito do risco), mas de ato voluntário e contrário às mais elementares regras de condução do caminhão. A seu ver, não há dúvida de que o acidente ocorreu não em razão do risco de dirigir nas estradas, mas em consequência da excessiva velocidade com que o veículo foi conduzido.

Ainda de acordo com o ministro, o risco de acidentes nas estradas decorre, em grande medida, do comportamento de motoristas que desrespeitam as mais básicas regras de trânsito.

A decisão foi unânime.

(Ricardo Reis/GS/CF)

Processo: Ag-AIRR-10642-52.2019.5.15.0057

https://tst.jus.br/web/guest/-/fam%C3%ADlia-n%C3%A3o-ser%C3%A1-indenizada-por-morte-de-motorista-em-acidente-causado-por-excesso-de-velocidade

 

TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA PRIMEIRA REGIÃO – TRT 1

03/04/2024

Juiz do RJ nega vínculo de emprego entre vendedor de seguros e seguradora

Por constatar que o contrato de franquia condizia com a realidade das atividades, o juiz Bruno Andrade de Macedo, da 37ª Vara do Trabalho do Rio de Janeiro, negou o vínculo de emprego entre um vendedor de seguros de vida — chamado de life planner — e a seguradora Prudential, dona de uma rede de franquias.

O autor da ação alegou ter sido forçado a formalizar um contrato de franquia por meio de sua pessoa jurídica. Ele disse que, na verdade, era empregado e pediu o reconhecimento do vínculo de emprego.

O juiz explicou que as partes formalizaram um contrato de franquia, nos termos da nova Lei de Franquias. A norma define o sistema de franquia empresarial como aquele em que um franqueador autoriza um franqueado a usar marcas e outros objetos de propriedade intelectual mediante remuneração, sem que isso caracterize relação de consumo ou vínculo de emprego.

Com base no próprio depoimento do autor, o julgador concluiu que não havia subordinação jurídica na relação entre o vendedor de seguros e a seguradora.

O profissional afirmou que contratou um contador próprio para abrir sua empresa; que arcava com as despesas do negócio, sem direito a reembolso dos custos da venda; que a captação de clientes acontecia por sua própria iniciativa, sem que a Prudential fornecesse lista de potenciais clientes; e que ele emitia nota fiscal dos valores recebidos.

Pessoa esclarecida

Macedo ressaltou que o autor é uma “pessoa esclarecida”, com formação de nível superior e pleno “conhecimento das
cláusulas do contrato de franquia celebrado com a ré”. Ou seja, o life planner não pode ser considerado “parte vulnerável da relação jurídica”.

Também não havia prova de “coação ou vício de consentimento na celebração do contrato”. O juiz destacou que o autor “aderiu livremente ao modelo de negócios” da Prudential, de maneira informada e consciente.

Além disso, o vendedor recebia “rendimentos consideráveis”, o que o afasta “claramente da figura do hipossuficiente submetido à coação econômica”.

Por fim, Macedo lembrou da Lei 4.594/1964, que regulamenta a profissão de corretor de seguros. O artigo 17 da norma proíbe de forma expressa a existência de vínculo de emprego entre o corretor e a seguradora.

Atuou no caso a equipe do escritório Barreto Advogados & Consultores Associados. O advogado Danilo Xavier, representante da Prudential na ação, afirma que, quando há uma relação comercial, o Supremo Tribunal Federal vem afastando a competência da Justiça do Trabalho e atribuindo à Justiça Comum

Enxurrada de ações

Como já mostrou a revista eletrônica Consultor Jurídico, a defesa da Prudential entende que a empresa vem sendo vítima de advocacia predatória devido ao grande número de ações judiciais que buscam o reconhecimento de vínculo de emprego nos contratos de franquia firmados com corretores.

A seguradora já obteve diversas vitórias em casos do tipo — em primeira instância, em diferentes TRTs (das  e 18ª Regiões, por exemplo), no Tribunal Superior do Trabalho e nas duas turmas ( e ) do Supremo Tribunal Federal.

O argumento mais usado pela Justiça é o de que o STF tem reconhecido de forma reiterada as formas de divisão de trabalho não reguladas pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

O principal exemplo é o julgamento de repercussão geral que validou a possibilidade de terceirização ou qualquer outra forma de relação de trabalho entre pessoas jurídicas distintas, independentemente do objeto social.

O TST recentemente reafirmou a competência da Justiça comum para julgar ações relacionadas a contratos de franquia.

https://www.conjur.com.br/2024-abr-03/juiz-do-rj-nega-vinculo-de-emprego-entre-vendedor-de-seguros-e-seguradora/

 

23/04/2024

Juiz nega ingresso da OAB-RJ em ação civil pública contra escritório

O juiz Leonardo Campos Mutti, da 22ª Vara do Trabalho do Rio de Janeiro, negou o pedido de ingresso da seccional fluminense da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-RJ) em uma ação civil pública do Ministério Público do Trabalho contra um escritório de advocacia.

Na ação, o MPT sustentou que a banca tem desvirtuado sistematicamente contratos de advogados e apontou uma série de irregularidades relatadas por profissionais que passaram pelo escritório, como jornadas longas e extenuantes, além de pressão desmedida.

No pedido de ingresso na ação, a OAB-RJ afirmou que cabe ao Conselho Federal da entidade regular o modelo de sociedades advocatícias. A seccional também alegou que a interferência de terceiros na profissão justifica o seu interesse institucional no processo.

Ao analisar o pedido, porém, o magistrado entendeu que não havia interesse legitimo da OAB-RJ. “O interesse da OAB/RJ está diretamente relacionado ao julgamento favorável do feito a uma das partes, no caso, um escritório de advocacia, em prejuízo de profissionais cujos interesses também merecem tutela do conselho de classe, no caso, os advogados associados individualmente considerados”, criticou o julgador.

Por fim, ele afirmou que o contexto da atuação da OAB-RJ deixa claro que a entidade “busca defender interesse privado de parte de seus associados, não havendo interesse jurídico apto a autorizar o seu ingresso como amicus curiae”.

Clique aqui para ler a decisão
Processo 0100066-69.2020.5.01.0022

https://www.conjur.com.br/2024-abr-23/juiz-nega-ingresso-da-oab-rj-em-acao-civil-publica-contra-escritorio/

 

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO – TJSP

05/04/2024

TJ-SP manda plano fornecer tratamento a mulher com fibrose pulmonar

A Súmula 102 do Tribunal de Justiça de São Paulo estabelece que nos casos em que houver indicação médica de trabalho, é abusiva a negativa de cobertura do plano de saúde sob o argumento de sua natureza experimental ou por não estar previsto no rol de procedimentos da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).

Esse foi o fundamento adotado pelo juízo da 1ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo para negar provimento a recurso de plano de saúde contra decisão que ordenou o fornecimento de tratamento de uma segurada que sofre de fibrose pulmonar idiopática.

No recurso, a operadora de plano de saúde alegou que o medicamento usado no tratamento indicado não possui cobertura contratual e também não consta no rol da ANS.

Ao analisar o caso, o relator, desembargador Rui Cascaldi, citou jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que a operadora do plano de saúde pode estabelecer quais doenças terão cobertura, mas não podem indicar o tratamento que será utilizado.

Também citou a Súmula 102 do TJ-SP e explicou que existem duas condicionantes para o fornecimento de medicamento fora do rol da ANS: comprovação da eficácia por recomendação de órgãos técnicos e indicação de bula especificamente para o quadro apresentado pelo segurado.

“No caso dos autos, o medicamento prescrito possui registro perante a Anvisa (fls. 219) e indicação em bula especificamente para o quadro apresentado pela requerente, sendo que a autora bem demonstrou que a indicação médica se baseia em dados de diversos estudos clínicos e diretrizes internacionais recentes, apontando também que as agências de avaliação de tecnologias em saúde inglesa, escocesa, canadense e australiana recomendam a incorporação do medicamento nos respectivos sistemas de saúde para o tratamento da Fibrose Pulmonar Idiopática”, registrou. O entendimento foi unânime.

A defesa da segurada ficou a cargo do advogado Luciano Correia Bueno Brandão.

Clique aqui para ler a decisão
Processo 1000698-04.2023.8.26.0577

https://www.conjur.com.br/2024-abr-05/tj-sp-manda-plano-fornecer-tratamento-a-mulher-com-fibrose-pulmonar/

 

12/04/2024

Estado é condenado a indenizar aluna PcD por discussão com professora

O juiz Iuri Sverzut Bellesini, da Vara de Nuporanga (SP), condenou o estado de São Paulo a indenizar uma estudante com deficiência por um episódio que ocorreu em escola pública da cidade. A menina, com 13 anos de idade na época dos fatos, discutiu com uma professora, que se descontrolou e agiu com agressividade.

O valor da reparação por danos morais foi fixado em R$ 100 mil para a adolescente e R$ 60 mil para cada um dos responsáveis, totalizando R$ 220 mil.

De acordo com a decisão, a aluna tem transtorno desafiador opositor e deficiência intelectual moderada. No dia dos fatos, ela e a professora discutiram, momento em que a docente afastou bruscamente a carteira da menina, determinando que fosse para a direção da escola. O incidente foi gravado por uma colega de classe.

Na sentença, o juiz Iuri Bellesini destacou que o argumento dos autores da ação não foi apenas o fato ocorrido na escola, mas uma omissão permanente do Estado, que teve seu ápice naquele dia.

“Essa análise permite uma visão maior acerca da responsabilidade do Estado no caso em comento. É porque houve reiterada e prolongada omissão do requerido em propiciar e implementar o direito social à educação da adolescente”, escreveu o julgador.

Ele também afirmou que são assegurados às pessoas com deficiência os direitos de igualdade, proteção contra a discriminação e educação pelo Estado, com um sistema inclusivo, entre outros. “Para além de permitir o acesso ‘físico’ da menor à escola (o que já era obstado), necessário se fazia, também, que os professores, especialmente aqueles que atuam no dia a dia com os demais alunos, tivessem necessária qualificação e até mesmo cuidados com a requerente, diante não apenas dos seus problemas de saúde e comportamentais, mas até mesmo diante do panorama social e familiar”, ressaltou o juiz.

“Diante do quadro, certo é que essas questões deveriam ser trabalhadas pela instituição de ensino, e não afirmadas como apontamento de uma ‘culpa exclusiva’ da jovem no que pertine aos episódios em que se envolveu, especialmente o do vertente caso.” Com informações da assessoria de imprensa do TJ-SP.

https://www.conjur.com.br/2024-abr-12/estado-e-condenado-a-indenizar-aluna-pcd-por-discussao-com-professora/

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