10 Considerações sobre Sobre literatura e história, de Júlio Pimentel Pinto ou Como a ficção constrói a experiência

10 Considerações sobre Sobre literatura e história, de Júlio Pimentel Pinto ou Como a ficção constrói a experiência

O Blog Listas Literárias leu Sobre literatura e história: Como a ficção constrói a experiência, de Júlio Pimentel Pinto publicado pela editora Companhia das Letras; Neste post as 10 considerações de Douglas Eralldo sobre o livro, confira:


1 - Sob a forte influência de Ricardo Piglia assumida deste os princípios do livro quando o autor declara que a concepção de Piglia que "a literatura constrói a experiência" na verdade "resume os objetivos deste livro". De fato os ensaios das leituras realizadas tratam da construção dessa experiência, numa obra em que é justamente a experiência do leitor, a construção da experiência do leitor, um dos esteios do trabalho de Júlio Pimentel Pinto, professor do Departamento de História da USP com um reconhecido trabalho nas imbricações entre literatura e história;

2 - O livro, como o próprio autor declara em sua apresentação está dividido em quatro partes, Teorias, Diálogos, Leituras e Mais Teorias cuja insistência conforme o autor está "na opção pelo contato direto entre o texto histórico e o texto literário e suas estratégias de figuração", de que vale destacar, muitas vezes há maior destaque a esse ou aquele elemento, já que, no livro temos ensaios em que parece-nos, o destaque está no texto histórico enquanto em outros sobressai-se as questões do texto literário, especialmente abordagens que retomam questões saudavelmente irresolvidas da literatura: sua própria conceituação;

3 - De acordo com o autor Teoria e Mais teoria "propõem discussões gerais, circulam por possibilidades conceituais". Segundo ele, a secção de abertura, Teoria, "questiona alguns lugares-comuns da reflexão sobre o diálogo entre história e ficção". É nesta seção que está o ensaio "Do fingimento à imaginação moral: Diálogos entre ficção e história". No ensaio uma vasta argumentação referencial sobre tal imbricamento de modo que Pinto conclui "a ficção pode sim representar a história ao revés, ampliando, para nós, leitores-historiadores, a dimensão do trabalho crítico, promovendo a imaginação moral";

4 -  Teoria e Mais Teoria respectivamente abrem e fecham a publicação. O fechamento fica por conta de "Recolha de circunstâncias: o diário como álbum". No ensaio, para além da abordagem reflexiva sobre a enunciação, a autoria e o diário como gênero temos o elemento redundante que marca o leitor Júlio Pimentel Pinto: Rigardo Piglia. Embora o ensaio comece abordando o Caderno proibido, de Alba de Céspedes o texto adentrará aOs Diários de Emilio Renzi (discutido em ensaio anterior) reforçando a influência de Piglia no autor;

5 - Em Diálogos como diz o autor "põe sempre dois ou mais textos em jogo". de acordo com Pinto "em alguns casos, o diálogo é direto, resultado da leitura de uma grande autor por outro grande autor. Em outros, é produzido por leituras cruzadas". A seção (ou parte) inicia com o ensaio "Cortázar, leitor de Poe". De acordo com o autor "A presença obscura de Poe - uma latência - ultrapassa limites espaciais e temporais. Invade o texto, move parte importante de sua imaginação , insinua a figuração do monstruoso, a anormalidade injetada pelo cotidiano, os pesadelos diurnos e noturnos, a paixão pelo enigma e pelo mistério, a defesa do conto como estratégia de dominação do leitor" que reverberam na obra de Cortázar;

6 - Na sequência talvez o ensaio com maiores imbricações entre o texto histórico e o texto literário, bem como, as questões e compreensões identitárias da América Latina: "Sousândrade e Martí: A América contra a America".  No ensaio o autor estabelece diálogos entre o escritor brasileiro Sousândrade e José Martí. De acordo com Pinto "numa época em que os esforços expansionistas norte-americanos no sentido do Sul ganhavam clareza e ênfase, ambos viveram parte da vida em Nova York e escreveram contra os Estados Unidos, a America; ambos buscaram construir representações de outra América e a nomearam pelo emprego de prefixo ou de pronome possessivo: Transamérica, Nossa América." Segundo o autor "Era mais do que coincidência";

7 - A secção Diálogos traz ainda os ensaios "Crônica & crítica na ficção policial latino-americana", que traz entre outros, diálogos entre trabalhos de Cláudia Pinheiro e Miguel Sanches Neto e mais uma também a presença teórica de Ricardo Piglia. "A procura de um estilo em cinco cenas da literatura latino-americana na virada do século XXI" parte do Manifesto Crack e da discussão sobre o romance crack para evidenciar o protagonismo da América Latina na seção;

8  - Por fim, a seção Leituras. Trata-se da seção com maior número de ensaios, seis. Segundo o autor são ensaios sobre "autores fundamentais (...) para quem o enredo de suas histórias nunca esteve dissociados de indagações sérias e densas sobre o ofício de escrever e de pensar outros mundos e outras vidas possíveis". Nessa seção, destacam-s os argentinos (conforme o autor, presenças mais constantes, talvez obsessivas).  A maior de todas as presenças, claro, Ricardo Piglia é discutido em "História de um distanciamento: As memórias de Piglia nos diários de Renzi". A seção ainda traz "Um olhar distante: Piglia e a utopia de América Latina". O outro argentino na seção e que surge em mais ensaios é Jorge Luis Borges no ensaio "Borges, em busca do Sul";

9 - O autor brasileiro abordado nas leituras de Pimentel Pinto é Milton Hatoum no Ensaio "O que restou de tudo isso?: Signos da arte e da memoria (vejamos que a memória tem destaque nos ensaios do livro) em Cinzas do Norte". Em Leituras temos ainda a presença de reflexão sobre o escritor uruguaio Juan Carlos Onetti em "Sobre fantasmas e homens: passado e exílio em Onetti" e o autor mexicanp Octavio Paz num ensaio mais uma vez centrado nas questões e problematizações da identidade latino-americana no ensaio "Octavio Paz e o labirinto da América Latina";

10 - Enfim, Sobre literatura e história mais que um livro voltado aos interessados nos estudos de literatura, de história e suas imbricações, é também um livro capaz de reforçar o jogo estabelecido desta com o leitor, essa contraparte indispensável e constituinte da própria literatura. Trata-se de um livro que mais que revelar as posições acadêmicas entrega-nos o olhar de um leitor, um experiente leitor marcado pela experiência do literário que imprime-lhe seu olhar para com o mundo - nesse livro, especialmente para o olhar à América Latina. O leitor Júlio Pimental Pinto ganha destaque aqui em ensaios que não deixam de ser confessionais já que a bibliografia do leitor muito diz sobre este. De modo geral os ensaios aqui contidos reforçam a confissão do autor "é com eles que me afasto da experiência histórica para compreendê-la e para revivê no significado que narrativamente atribuímos a ela, tal qual lembrou T.S. Eliot em versos que Piglia gostava de citar: vivemos a experiência mas perdemos o significado,/E a proximidade do significado restaura a experiência/sob forma diversa, que além de qualquer significado. Como já se/[disse,/A experiência vivida e revivida no significado/Não é experiência de uma vida apenas/Mas a de muitas gerações - não esquecendo/Algo que, provavelmente, será de todo inefável:/O olhar para além da certeza/Da História documentada. a olhadela,/Por cima dos ombros, lançada ao terror primitivo."

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