Ditadura da dieta, transtornos e mais: o que fotos de Nicole Kidman revelam sobre distorção da autoimagem | Saúde | G1

Por Poliana Casemiro, g1


Nicole Kidman publicou fotos com uma aparência extremamente magra — Foto: Reprodução/Instagram

As fotos recentes da atriz Nicole Kidman com uma aparência extremamente magra levantaram a discussão sobre a questão do baixo peso como padrão de beleza. Famosa pela sua altura de 1,80m, a atriz, segundo sites estrangeiros, estaria pesando cerca de 47,5 kg.

Frequentes nas redes sociais, as imagens de celebridades magras reforçam padrões inalcançáveis que podem servir de gatilho para a distorção da autoimagem.

As pessoas estão expostas o tempo todo a modelos de beleza inalcançáveis para a vida cotidiana. Além disso, um ambiente de terrorismo alimentar que tem deixado as pessoas preocupadas com o que comem, com quanto comem e isso vem refletindo em doenças como transtornos alimentares, depressão e ansiedade.
— Fabio Salzano, psiquiatra no Ambulim, especializado no atendimento de transtornos alimentares.
O ‘padrão de corpo’ feminino ao longo do tempo

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A pressão on-line

A idealização de corpos e a pressão estética vieram antes da internet e das redes sociais, só que nunca antes estivemos expostos a tantas fotos de "corpos perfeitos". Isso tem a ver com como a própria rede social funciona: é completamente visual (alimentada por fotos e vídeos).

💃 Se, nos anos 60, Marilyn Monroe, com seu corpo curvilíneo de pernas grossas, era um símbolo de beleza. Nos anos 80 e 90, isso mudou para um modelo mais magro, como de Cindy Crawford e depois Kate Moss – que representava o estilo heroin chic, que classificava como auge de beleza o corpo magro, com ossos expostos, como de usuários de heroína.

A trajetória dos padrões não é linear: os modelos de corpos e tendências vão mudando ao longo do tempo. Ou seja, ficam impossíveis de acompanhar. E a exposição de corpos on-line tem colocado mais pressão.

🔎 Um estudo feito pela Meta (empresa dona do Facebook e Instagram) em 2021 mostrou que parte das usuárias da plataforma se sentia mal com o próprio corpo e que o Instagram as fazia se sentir pior.

O relatório, que era secreto, mas foi vazado pelo The Wall Street Journal, dizia ainda que o comportamento de comparação no Instagram podia mudar a forma como as jovens se viam.

Personal mostra como influenciadoras editam os corpos para parecerem mais magras online

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🚨 Se já é difícil alcançar um padrão, imagina quando ele é, na verdade, resultado de edição, plásticas e ângulos escolhidos para parecerem o que não são? O que existe on-line nem sempre é real ou é só uma parte da história.

A nutricionista Marina Nogueira, criadora do projeto Não Conto Calorias, que fala contra a pressão estética on-line e terrorismo alimentar, diz que as redes mudaram o conceito de corpo que as pessoas têm com ideais descolados da realidade.

Precisamos olhar para o mundo real. Se você olhar no digital só vai ser gente magra e sarada. Mas, se for à praia, qual corpo vai ver? Estamos presos em um surto coletivo, ninguém está olhando para ninguém no mundo real, que é muito diferente do que está on-line.
— Marina Nogueira, nutricionista.

As exigências não são uma realidade apenas para pessoas comuns, mas até mesmo celebridades se dizem pressionadas pelos padrões.

Nesta semana, a cantora Sandy se tornou assunto nas redes ao admitir que não anda sem maquiagem nem mesmo em casa por não se reconhecer “desmontada” e que não publica imagens suas sem filtro ou maquiagem.

"Eu vejo vocês postando foto sem filtro, eu não consigo", disse a cantora.

Sandy diz que não anda sem maquiagem: 'Não me acho bonita, e não me sinto confortável'

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A prática, além de ter uma questão psicológica, ainda pode causar problemas de pele, com a obstrução dos poros e aumento da oleosidade.

Ditadura da dieta

Para alcançar corpos mais próximos do que é exibido on-line, as pessoas se submetem a vários tipos de dietas. Jejum intermitente, low carb, paleolítica, Dukan, sem glúten ou sem lactose são algumas das receitas famosas. Muitas são divulgadas por celebridades que mostram sua rotina de alimentação e exercícios.

🚨No entanto, é preciso cautela com o que é compartilhado on-line porque nem tudo é fato.

Em 2017, por exemplo, a empresária e influenciadora Bianca Andrade (Boca Rosa) compartilhava sua rotina de dietas que a fez perder cerca de 12 kg.

Mais tarde, porém, ela revelou que, além da rotina, o resultado havia sido tonificado por uma lipoaspiração (cirurgia para retirada de gordura abdominal) que fez, mas que não compartilhou com os seguidores.

Dietas restritivas

Biologicamente, para perder peso é preciso comer menos do que o corpo precisa para ter energia para vivermos. É o chamado déficit calórico. Com isso, o organismo vai usar o que há de reserva e o resultado é a perda de peso.

🚨 Especialistas explicam, porém, que a conta não é tão simples. Até é possível perder peso com as dietas citadas acima, que são as chamadas restritivas (quando há restrição de determinados tipos de alimentos), mas há grande chance de recuperar o peso e até em mais volume do que se tinha antes.

As pessoas se tornam reféns de dietas e começam a fazer sem se perguntar o porquê precisam entrar nisso. Nesse processo, cria-se um ambiente de terror alimentar que pode causar transtornos alimentares.
— Manoela Figueiredo, nutricionista especialista em transtornos da alimentação pela USP

📽️ No vídeo abaixo, entenda por que as pessoas não conseguem manter uma dieta restritiva:

Por que as pessoas não conseguem manter uma dieta restritiva?

Por que as pessoas não conseguem manter uma dieta restritiva?

Agora, entenda como funciona o corpo durante a dieta restritiva:

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Transtornos alimentares

Na tentativa de ter o resultado que é vendido on-line, a pessoa em dieta pode acabar em um ambiente de terror.

🚨 Já sentiu que parece que é só estar de dieta que vê comida que não pode em todo lugar? Ou que alivia com pedaços de pizza a mais no fim de semana depois de comer frango com salada a semana toda?

Esses comportamentos podem parecer inofensivos, mas segundo especialistas, são um sinal de alerta. Os episódios podem se tornar recorrentes e criar uma relação ruim com a comida e até doenças, como os transtornos alimentares.

Costumo dizer que nem toda dieta leva a um transtorno alimentar, mas todo transtorno alimentar começa com uma dieta. A pessoa engajada em uma dieta restritiva tem quadros de ansiedade agravados, distorce sua autoimagem e prejudica sua vida social.
— Fábio Salzano, psiquiatra do Ambulim especializado no atendimento de transtornos alimentares

Os transtornos alimentares mais comuns são:

  • Anorexia nervosa: a pessoa não se alimenta ou restringe a alimentação para forçar uma perda de peso.
  • Bulimia nervosa: a pessoa tem episódios de compulsão (come uma quantidade alta de alimentos em um curto espaço de tempo) e depois vomita, faz uso de laxantes ou exercício físico em excesso para evitar o ganho de peso.
  • Compulsão alimentar: a pessoa come em grande quantidade, sem conseguir parar.

De acordo com a Associação Brasileira de Psiquiatria, estima-se que mais de 70 milhões de pessoas no mundo sejam afetadas por algum transtorno alimentar.

🚨 Nem todo mundo vai desenvolver um transtorno alimentar. No entanto, há outros efeitos colaterais de uma vida com restrições que também precisam de acompanhamento, como a culpa ao se alimentar, a necessidade de compensação com exercícios após uma refeição e medo de alguns alimentos. (Faça aqui um quiz para entender como é a sua relação com a comida)

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