Comandante da Marinha critica homenagem a João Cândido, o Almirante Negro, líder da Revolta da Chibata: 'abjetos marinheiros' | Política | G1

Por g1


João Cândido, o Almirante Negro — Foto: Agência Senado

O comandante da Marinha, Marcos Sampaio Olsen, enviou carta à Comissão de Cultura da Câmara dos Deputados com críticas ao projeto de lei que inclui João Cândido, o Almirante Negro, no Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria.

Na quarta-feira (24), a Comissão realizou uma audiência sobre o projeto, que já foi aprovado no Senado.

João Cândido Felisberto foi o líder da Revolta da Chibata, em 1910, um motim contra a aplicação de castigos físicos – como chibatadas – aos marinheiros, em sua maioria negros, por parte dos oficiais, e virou ícone da luta contra o racismo.

Com apoio de dois mil marinheiros, os revoltosos tomaram o controle de embarcações da Marinha na Baía de Guanabara, no Rio de Janeiro, fizeram os oficiais reféns – alguns foram executados – e apontaram os canhões dos navios para a cidade, então capital do Brasil.

“Nós marinheiros, cidadãos brasileiros e republicanos, não podendo mais suportar a escravidão na Marinha Brasileira, a falta de proteção que a Pátria nos dá, e até então não nos chegou, rompemos o véu negro que nos cobria aos olhos do enganado e patriótico povo", dizia o ultimato enviado pelos amotinados ao presidente da República, Hermes da Fonseca.

Depois da revolta, João Cândido ficou detido por 18 meses em uma prisão subterrânea, internado em um hospital de alienados e, novamente preso. Após solto, viveu como mercador de peixes no Rio de Janeiro, onde morreu em 1969 na miséria.

A história inspirou a música O mestre-sala dos mares, de João Bosco e Aldir Blanc e, em 2024, foi tema do desfile da escola de samba do Rio de Janeiro Paraíso do Tuiuti. Em 2019, Cândido foi reconhecido como herói do estado do Rio de Janeiro.

Em 2018, um projeto de lei para incluir João Cândido na lista de heróis nacionais – ao lado de nomes como Zumbi dos Palmares, Zilda Arns e Chico Mendes – foi apresentado ao Senado e aprovado pela casa em 2021.

"O reconhecimento oficial de João Cândido como herói nacional não apenas honraria sua trajetória, mas também reforçaria o compromisso do país em enfrentar o racismo institucional e promover a justiça histórica para a população negra", disse o Ministério Público Federal em manifestação favorável ao projeto.

Na carta à Câmara para contrapor a homenagem federal, Olsen – o atual comandante da Marinha –disse que, para a Força, a Revolta da Chibata (ou dos Marinheiros, como é chamada no documento), é um "fato opróbio [vergonhoso]" em que "abjetos marinheiros" desrespeitaram a hierarquia e a disciplina e usaram equipamentos militares para "chantegear a nação".

Olsen afirma que "além do justo pleito de revogação da prática repulsiva do açoite", os marinheiros que participaram da revolta da Chibata "buscavam, deliberadamente, vantagens corporativas e ilegítimas", e que "(...) resta notável diferença entre reconhecer um erro e enaltecer um heroísmo infundado", afirma o documento.

"Nos dias atuais, enaltecer passagens afamadas pela subversão, ruptura de preceitos constitucionais organizados e basilares das Forças Armadas e pelo descomedido emprego da violência de militares contra a vida de civis brasileiros é exaltar atributos morais e profissionais, que nada contribuirão ao pleno estabelecimento e manutenção do verdadeiro Estado Democrático de Direito", diz o texto.

Com a aprovação do projeto, João Cândido faria parte do Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria junto a nomes como o de Zumbi dos Palmares, Zilda Arns e Chico Mendes.

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Trecho da carta do comandante da Marinha sobre João Cândido — Foto: Reprodução

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