Quem é Ed Kemper, assassino-chave para FBI definir o que é um serial killer - Revista Galileu | Sociedade
  • Giuliana Viggiano
Atualizado em
Criminoso é retratado na série "Mindhunter". De acordo com ele, sua mãe é responsável pelos 10 assassinatos que cometeu (Foto: Reprodução youtube)

Criminoso é retratado na série Mindhunter. De acordo com ele, sua mãe é responsável pelos 10 assassinatos que cometeu (Foto: Reprodução youtube)

Ed Kemper havia dirigido a noite toda de sua casa, na Califórnia, até a cidade de Pueblo, no Colorado, quando resolveu ligar para a polícia. Horas haviam se passado desde que deixara sua mãe e a melhor amiga dela mortas em sua residência, mas o fato ainda não havia sido noticiado no rádio, então o rapaz resolveu informar a polícia sobre o ocorrido.

As autoridades não acreditaram no jovem. Horas depois, ele fez outro telefonema, desta vez pedindo para conversar com um oficial que já conhecia. Ao que tudo indica, Ed foi mais convincente e a polícia resolveu investigar. Os oficiais não demoraram a confirmar não só o assassinato e a decapitação das duas vítimas, mas também a autoria de seis outros crimes.

Diferentemente de outros serial killers, Ed não entrou em contato com a polícia para se gabar ou debochar dos oficiais: para ele, o “jogo” havia acabado com a morte da mãe. Por isso, esperou em seu carro até as autoridades virem buscá-lo e prendê-lo, sem resistir. Quando perguntado sobre o motivo de ter se entregado, afirmou: “O propósito original se foi... Não estava servindo a nenhum propósito físico, real ou emocional. Foi apenas pura perda de tempo... Emocionalmente, eu não conseguiria lidar com isso por muito mais tempo”.

Garoto prodígio
Edmund Emil Kemper III nasceu em 18 de dezembro de 1948, em Burbank, na Califórnia. Dono de um intelecto invejável, o garoto sofria bullying na escola por conta de seu tamanho: ainda adolescente, ele chegou a medir 2,06 metros de altura. O garoto também era notavelmente antissocial, o que o levou a se tornar cada vez mais solitário.

Tal como outros serial killers, Kemper dissecava animais para “saber como eram por dentro”, mas seu comportamento só passou a ser questionado após o divórcio de seus pais, Edmund e Clernell Kemper.

Ainda novo, o garoto era negligenciado pela mãe e impedido de conviver com as irmãs. Houve vezes em que a mãe fez Ed dormir no chão do sótão com o pretexto de que ele “apresentava ameaça para as meninas da casa”. Foi por isso que, quando seus pais se separaram, ele resolveu morar com o pai — o que não deu muito certo.

Kemper culpou a mãe Clarnell  pelos assassinatos que cometeu (Foto: Reprodução)

Kemper culpou a mãe Clarnell pelos assassinatos que cometeu (Foto: Reprodução)

Ed descobriu que o pai havia se casado de novo e vivia com a esposa e o filho dela. Por isso, resolveu ir morar com os avós paternos, mas também não se contentou: para ele, o avô era senil e a avó tirava sua virilidade. Foi aí que seus crimes começaram.

Driblando especialistas
Após uma acalorada discussão com a avó, o jovem Kemper, de apenas 15 anos, encontrou a espingarda de seu avô e atirou duas vezes contra a senhora. Mesmo ela já estando morta, o rapaz esfaqueou seu corpo. Pouco depois, quando chegou em casa, o avô também foi assassinado pelo neto. Kemper, então, ligou para sua mãe e comunicou a polícia sobre seus atos, com a mesma atitude que repetiria no futuro: sentou e esperou que as autoridades viessem prendê-lo.

Kemper foi parar em um centro de detenção para jovens com problemas psiquiátricos, onde permaneceu anos sob a supervisão de especialistas e autoridades. Lá, sua astúcia foi um tanto útil: além de se tornar um dos pacientes preferidos de todos, Kemper virou assistente de seu psicólogo.

A amizade lhe rendeu acesso antecipado ao exame que deveria realizar para provar que estava “curado” e voltar, assim, a viver em sociedade. Decorou as respostas do teste e gabaritou a prova -  o que, em 1969, aos 21 anos, lhe concedeu o passaporte para a liberdade e ainda garantiu que sua ficha fosse arquivada.

Juventude problemática
Quando saiu do centro psiquiátrico, Kemper voltou a morar com a mãe, com quem ainda mantinha uma relação conturbada. Isso foi no início dos anos 1970 e, para o rapaz, ter uma vida social se tornou ainda mais complicado.

Como relatou em entrevistas futuras, Kemper passou a frequentar bares e tentar se infiltrar na vida noturna, mas o comportamento dos jovens o incomodava. Como fora criado por figuras femininas severas, que o obrigavam a seguir uma vida regrada, entrar em contato com drogas, bebidas e libertinagem o incomodava.

Foi por isso que Kemper tentou entrar para a polícia da Califórnia. Contudo, mais uma vez, seu tamanho se mostrou um empecilho. Foi a gota d'água para que o rapaz optasse por seguir o caminho cruel e obscuro de se tornar um assassino em série - e ele se tornou um dos tipos mais perigosos: aquele que comete crimes de tempos em tempos, o chamado serial killer "de temporada".

Kemper colecionava "souvenirs" para lembrar de suas vítimas (Foto: Reprodução)

Kemper colecionava "souvenirs" para lembrar de suas vítimas (Foto: Reprodução)

No início, Kemper apenas oferecia carona para jovens universitárias e as deixava ir sem grandes problemas — em entrevista, ele afirmou ter feito isso mais de 150 vezes até começar a matar. Entre maio de 1972 e fevereiro de 1973, o serial killer confessou ter sequestrado seis garotas, as quais assassinou de diferentes formas: estrangulando ou esfaqueando, por exemplo.

Então, ele prosseguia para atos de necrofilia: em alguns casos, decepava as jovens e se masturbava com suas cabeças, guardando-as em seu refrigerador para utilizá-las diversas vezes. Como relatou aos investigadores, Kemper costumava “sair para caçar” após brigas ou atitudes autoritárias de sua mãe. Em um dos casos, o criminoso afirmou ter enterrado um dos corpos no jardim de sua casa voltado para a janela do quarto de sua mãe, pois ela "gostava de ter um olhar superior sobres os outros”.

Foto tirada pela polícia 1973 (Foto: Wikimedia Commons)

Foto tirada pela polícia em 1973 (Foto: Wikimedia Commons)

Fim dos problemas?
O fim da “temporada” de assassinatos de Kemper veio em 20 de abril de 1973, quando sua mãe, Clarnell, voltou de uma festa e o jovem encontrou-a em seu quarto: “Suponho que você vá querer sentar e conversar a noite toda”, teria dito ela, ao que Kemper afirma ter respondido: “Não, boa noite”.

Foto tirada pela polícia 1973 (Foto: Wikimedia Commons)

Foto tirada pela polícia em 1973 (Foto: Wikimedia Commons)

O jovem, então, esperou a mãe adormecer e para espancá-la até a morte com um martelo. Depois, Kemper a decapitou e estuprou sua cabeça decepada, antes de colocá-la em uma prateleira e usá-la como alvo para jogar dardos. Como se não bastasse, o criminoso cortou a língua e a laringe, colocou-as no lixo, e tentou triturar suas cordas vocais, mas não conseguiu — o que, para ele, foi engraçado: era como se até o triturador não pudesse aguentar suas reclamações.

Então, Kemper convidou a melhor amiga de sua mãe para ir até a casa fazer uma visita. Foi aí que o jovem matou a mulher e roubou seu carro, dirigindo por horas até ligar para polícia e se entregar.

“Amigo” do FBI
Depois de ser preso e tentar se safar da prisão alegando insanidade, Ed Kemper se tornou uma importante fonte de informações para o FBI — questão retratada na série Mindhunter.

Em diversas entrevistas, o assassino explicou para os oficiais John Douglas e Mark Olshaker o que considerava estar por trás de suas atitudes. Seus depoimentos foram essenciais para o desenvolvimento do método utilizado até hoje pelas autoridades para identificar serial killers, e até para a prisão de outros criminosos — como mostra a série da Netflix.

Kemper foi apelidado de "Co-Ed Killer", porque a maior parte de suas vítimas estudava em instituições co-educacionais (Foto: Reprodução)

Kemper foi apelidado de "Co-Ed Killer", porque a maior parte de suas vítimas estudava em instituições co-educacionais (Foto: Reprodução)

Dentre suas falas mais marcantes, está o momento em que confessa ter coletado “souvenirs” de cada vítima, para poder se lembrar do crime. Seu relato sobre retornar à cena do crime também foi crucial para os investigadores: de acordo com Kemper, para um serial killer, é irresistível voltar ao local onde cometeu os assassinatos e, assim, “reviver” a situação prazerosamente.

Kemper se mostrou arrependido de ter matado as jovens, culpando a mãe inteiramente por suas atitudes. Contudo, outros depoimentos revelam a mente macabra do assassino: quando chamado de “um cara comum”, fez questão de corrigir seu interlocutor: “Eu vivia como um cara comum”. Ao se entregar para a polícia, Kemper fez questão de ressaltar que ele só foi preso porque quis se entregar, caso contrário, nunca teria sido descoberto.

Kemper ainda está vivo. Hoje com 70 anos, ele vive em uma prisão no estado da Califórnia, onde cumpre sentença perpétua e espera sua próxima oportunidade de tentar cumprir a pena em regime semiaberto, o que só deve acontecer em 2024. Ele ainda concede entrevistas e surpreende a todos com sua inteligência — seu Q.I. foi medido em 145, o que o classifica como “superinteligente”.

Foto tirada pela polícia em 2011  (Foto: Wikimedia Commons)

Foto tirada pela polícia em 2011 (Foto: Wikimedia Commons)

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