À sombra de uma gameleira: Os mistérios de Luíza Amélia, a 1ª poetisa piauiense - Conheca Parnaiba

À sombra de uma gameleira: Os mistérios de Luíza Amélia, a 1ª poetisa piauiense

Você vai aprender neste artigo:

A Gameleira Túmulo de Luiza Amélia

Conheça a história da primeira poetisa piauiense, Luíza Amélia!

Você sabia que ela pediu pra ser sepultada à sombra de uma gameleira?

E que mesmo não sendo atendida, teve seu desejo realizado pelo além. E hoje ela jaz à sombra de uma bela gameleira.

Você quer saber mais?

Leia agora e conheça essa história maravilhosa que aconteceu em nossa Parnaíba.

A história de Luiza Amélia

Luiza Amélia
Luiza Amélia Imagem do site (http://augustobritoomemorialista.blogspot.com)

Segundo o escritor parnaibano Daniel Ciarlini, Luiza Amélia se ostenta como uma das primeiras brasileiras a trabalhar e provar pela veia artística a capacidade feminina em um meio que só consagrava os homens como produtores de conhecimento.

Era filha de Manuel Eduardo de Queiroz e Vitalina Luiza de Queiroz. Casou-se duas vezes; a primeira em 1859, com Pedro José Nunes, que faleceu anos depois e a segunda em 26 de dezembro de 1888 com Benedicto Rodrigues Madeira Brandão, rico comerciante de alto conceito em Parnaíba, fundador e presidente entre 1901 e 1903 da Sociedade Protetora Parnaibana, além de vice Intendente Municipal no período de 1897 a 1899, na administração de Joaquim Antônio dos Santos (Ciarlini, p. 87, 2012).

Joaquim Santos foi o sexto Intendente de Parnaiba, se você quiser conhecer todos eles acesse aqui no site, Intendentes Municipais Parnaiba de 1893 a 1930.

Luiza de Queiroz, em Parnaíba, com o segundo marido, morou no velho casarão sobrado colonial revestido de azulejos  portugueses azuis, ainda existente na Avenida Presidente Vargas, vizinho à Ponte Simplício Dias da Silva.

Casa de Luisa Amélia
Casa de Luisa Amélia, hoje Funciona uma Escola

Não teve filhos nos dois casamentos. Como os dois maridos eram comerciantes, vivia quase sempre sozinha e esta solidão refletia-se em versos (Ciarlini, p. 88, 2012).

A vida e a obra da poetiza Luisa Amélia

As pesquisadoras Jaiane da Silva Santos e Geisiane Dias Queiroz em seu artigo A multiplicidade de sentimentos na poesia de Luíza Amélia de Queiroz nos trazem mais informações sobre a vida e a obra da poetiza, segundo elas:

Luíza Amélia de Queiroz nasceu no dia 26 de dezembro de 1838, na cidade de Piracu­ruca e faleceu no dia 12 de novembro de 1898, em Parnaíba – cidade que viveu maior parte da vida.

De­dicou-se aos estudos e à literatura. Publicou dois livros: Flores incultas, em 1875, obra que a faz ser reconhecida como a primeira mulher piauiense a publicar literatura, e Georgina ou os efeitos do amor, em 1898.

Capa do Livro Georgina
Capa do Livro Georgina de Luiza Amélia

Flores incultas (1875)  foi a primeira obra escrita e publicada por uma mulher no estado do Piauí, tendo como autora a poetisa Luíza Amélia de Queiroz. Esse fato ganha destaque con­siderando o contexto da sociedade do século XIX, uma sociedade em que as mulheres não chega­vam a cursar o ensino superior e o espaço reservado para elas era o lar e a posição de cuidadora da família. Luíza Amélia enfrentou essas dificuldades.

Flores Incultas é uma coletânea com quase 100 poemas escritos em épocas distintas, que traçam o perfil da autora e desenham as suas mais abstraídas ideologias. Os sentimentos estão também subscritos, cuja produção demonstra uma mulher solitária, entregue aos desencantos e às exaltações, nunca satisfeita com o derredor que lhe parecia falso e artificial, entorpecido pela inevitável superficialidade (Ciarlini, p. 91, 2012).

Luisa Amélia e a Mulher na literatura

Arissandra Andreia Santos e Josenildo Campos Brussio em: A MULHER NA LITERATURA PIAUIENSE dizem o seguinte:

Luiza Amélia de Queiroz foi pioneira ao ter conquistado um importante espaço na atuação feminina no que diz respeito aos domínios relacionados à escrita e à publicação em periódicos em meados do século XIX, na província do Piauí e em outros estados. Foi uma das notáveis do seu gênero na produção literária, ocupou a cadeira 28 na Academia Piauiense de Letras (APL), além de ser patrona da cadeira 24 da Academia Paraibana de Letras (APAL).

Contexto em que viveu Luiza Amélia

Luiza Amélia foi a primeira mulher a dedicar-se e a publicar poesias no Piauí. Lutou muito contra o preconceito ao seu gênero, teve coragem para transpassar as regras machistas, mesmo vivendo praticamente dentro de casa, como era a vida das mulheres da época. Estudou muito pouco, somente as primeiras letras, mesmo assim, produziu muitas poesias. Aprendeu sozinha e ao ter contato com obras literárias foi educando-se e aprendendo cada vez mais através delas.

Ser uma mulher letrada no final do século XIX, constituía uma exceção em uma sociedade cuja maioria da população era analfabeta; e em uma época em que a prática literária consistia em uma atividade masculina. O acesso das mulheres à instrução era a reivindicação mais frequente nos escritos de autoria feminina do século XIX no Brasil. No período em questão, a aquisição de livros, revistas, jornais e outros bens culturais eram restritos às famílias de maior poder aquisitivo da sociedade. Contudo, privilegiava-se a formação intelectual masculina. Eram os homens desse grupo social que eram preparados para ocupar posições de destaque na vida pública, como médicos, advogados, políticos e empreendedores no mundo dos negócios (ROCHA, p. 2, 2011).

Das mulheres, esperava-se que fossem filhas obedientes, esposas fiéis e mães dedicadas. (FALCI, 2000).

E o que Luiza Amélia escreveu?

Seus textos mostram características da poesia brasileira a qual Antonio Candido denominou de romantismo inicial, “caracterizado pela mistura de Arcadismo sobrevivente com traços que no futuro seriam considerados precursores” (CANDIDO, 2002, p. 16).

Nesses textos “a melancolia, por exemplo, vai sendo cada vez mais associada à noite e à lua, ao salgueiro e à saudade, sobretudo no pormenor dos lugares” (CANDIDO, 2002, p. 17), revelando o mundo privado da mulher do século XIX, quando a poesia foi o refúgio de seu isolamento doméstico e a confissão da religiosidade, apego à terra e sentimentos secretos.

Nos poemas da autora há grande presença do transcendente e da doutrina religiosa da época, bem como a memória da infância, com as lembranças de familiares e, ainda, o constante perpassar da religiosidade em seus afetos, direcionando visões de si e sua forma de sentir o mundo, novamente encontrando a tônica de sua entrada na primeira geração daquele movimento literário (SANTOS, pag. 110, 2020).

A primeira geração da literatura piauiense adotou os temas e costumes do povo, sua sentimen­talidade, sua linguagem. […]

Na realidade, interliga-se ao período romântico da literatura bra­sileira em suas linhas gerais, porém guarda diferenças. É a geração da poesia popular e da prosa regionalista, que eu batizaria de geração romântico-popular, à falta de outra denotação melhor (MOURA, 2001: 35).  

O Poema a MULHER de Luisa Amélia

Veja uma das poesias de Luiza Amélia e sinta:

A mulher que toma a pena
Para lira a transformar,
É, para os falsos sectários,
Um crime que os faz pasmar!
Transgride as leis da virtude
A mulher deve ser rude
Ignara por condição!
Não deve aspirar a glória!
Nem um dia na história
Fulgurar com distinção!
 
 
Mas eu que sinto no peito,
Dilatar-me o coração,
Bebendo as auras da vida,
Na sublime inspiração:
Eu que tenho uma alma grande,
Uma alma audaz que s’expande
No espaço a voejar.
Não posso curvar a fronte
Nesse estreito horizonte
E na inércia ficar!

No poema, A mulher, publicado no livro, Flores Incultas (1875), Luiza Amélia de Queiroz questiona o lugar da mulher na sociedade no período em questão. Considerando-se o caráter metafórico, é possível associar o título da obra da autora, com a condição feminina no período, que valorizava uma socialização feminina, para o cultivo da delicadeza, pela busca da vaidade de mostrar-se, mas eram em sua maioria incultas (ROCHA, p.01, 2011)

Casos curiosos que envolvem Luiza Amélia

Ciarlini registrou na página 120 de seu livro, A face oculta da Literatura piauense, que Antonio Rodrigues descobriu um substrato a respeito de Luiza Amélia. Que ela teria sido a responsável ainda no fim do império, por levar a doutrina espírita a Parnaíba. Registra-se no livro A Caravana da Fraternidade, 1954, de Leonardo Machado, que a doutrina realizada pela poetisa era uma mistura de umbanda, altares, velas acesas, rosários e ladainhas.

Outra curiosidade é o fato de na lápide de Luiza Amélia existir  uma inscrição em forma de epitáfio, afixada na década de 70 pelo respeitado espírita, de ilibada reputação, fundador do centro Espírita Lar de Jurema, Fenelon da Fonceca Lima. Segundo sua neta, Milena Sousa Lima, seu avô psicografava cartas e recados de variadas entidades espirituais, entre elas a que está afixada no túmulo da poetisa.

Epitáfio no Túmulo de Luiza Amélia, Psicografia a seu pedido
Epitáfio no Túmulo de Luiza Amélia, Psicografia a seu pedido (Ofereciemento Fenelon Fonseca Lima)

Psicografia de Fenelon Fonseca Lima

Memória
Não sou poeta, que ambição tão louca!
Nunca me veiu perpassar a mente.
O que desejo e que exalar procuro
São os afetos que minhalma sente..
. 

Ciarlini compara os versos psicografados com o poema “Não sou Poeta” escrito na  obra Flores Incultas e percebe pequenas diferenças entre os dois textos: a mudança de uma exclamação por uma vírgula. Luiza assim teria escrito: “Não sou poeta! que ambição tão louca”. E Fenelon  Lima: “Não sou poeta, que ambição tão louca!”

 A outra diferença ocorre quando Fenelon transcreve o terceiro verso assim: “Só o que quero, o que exalar procuro”. E no original está “Que desejo e que exalar procuro”. Segundo Ciarlini a mudança não foi semântica, visto que neste caso deseje e querer exercem a mesma função, mas estética, por conta de ter diminuído o metro do verso, por desconhecimento da estética métrica ou pelas circunstâncias psicográficas.

Aqui estão as duas quadras retiradas do livro Flores Incultas da poetisa:

Não sou poeta! que ambição tão louca
Nunca me veio perpassar á mente,
Só o que quero, o que exhalar procuro,
São os afetos que minh`alma sente
(Nunes, p.7)

Duas observações chamam a atenção de Ciarlini. No escrito de Fenelon o quarto verso termina com reticências, dando ideia de continuidade, o que corresponde ao poema  em sua fase original, já que se prolonga por mais doze quadras. Destaque ainda para a grafia diferenciada de minha alma: “minhalma”,de Fenelon  e “minh´alma” de Luiza Amélia.

Os erros nas palavras “veiu” e “minhalma” são enigmas segundo o autor. Pois se Fenelon tivesse plagiando a autora porque escreveria errado?

Segundo sua neta Milena Sousa Lima:

“Vovô tinha baixa escolaridade.
Deve ter acontecido o fenômeno de oralização da língua.
Escreveu do jeito que ouviu”.
(Milena Lima 08.03.23)

Ouça o que ela diz sobre o fato:

Audio de Milena Sousa Lima sobre seu Avô

O autor deixa duas perguntas para nossa reflexão:

Por quais motivos Fenelon teria escrito a quadra com defeitos, se tinha em mãos o raro livro Flores Incultas?

Ou seriam estes impasses resultados tanto de suas limitações ortográficas a par de uma psicografia auditiva?

Luiza Amélia e a sua Gameleira

Luiza Amélia Já à sombra de uma Gameleira
Luiza Amélia Já à sombra de uma Gameleira em Parnaiba

Dentre as curiosidades acima, a que mais chama a atenção é seguinte.

Luiza Amélia é personagem de uma lenda interessante. Segundo a lenda, ela teria escrito um poema desejando ser enterrada à sombra de uma gameleira.

Não se sabe, se o poema existe. Segundo Daniel Ciarlini, esse soneto ainda não foi encontrado.

Alguns fatos põem em questionamento esta lenda:

O mito da árvore pode ser excluído tendo visto que Luiza morreu bem antes do atual Cemitério ter sido inaugurado. E que o cemitério que Luiza teria sido sepultada localizava-se nas proximidades da Praça Antonio do Monte. E Que seus restos mortais foram transferidos anos depois de sua morte para o atual túmulo, no cemitério da Igualdade.

Se ela pediu para ser sepultada à sombra da árvore e não respeitaram seu pedido, por que transferiram seus restos mortais para o novo cemitério?

E porque somente seu túmulo tem uma gameleira encrostada nele?

Tronco da Árvore no Túmulo de Luiza Amélia
Tronco da Árvore no Túmulo de Luiza Amélia

Todas estas perguntas tornam mais intrigante a lenda.

 O fato é que hoje ela jaz à sombra de uma linda Gameleira, árvore que aflorou de dentro de seu túmulo e faz sobra em todo ele.

Atendendo ou não ao desejo da poetisa a árvore se faz presente, sendo o túmulo  de Luiza Amélia um belo lugar para se refletir sobre a vida.

Seu túmulo está no cemitério da Igualdade centro de Parnaíba, ao lado do Senai e da Av. Capitão Claro. (Detalhe! Você sabe quem foi Capitão Claro? Não? Aguarde em breve saberás aqui no site….)

Túmulo de Luiza Amélia no Cemitéirio da Igualdade em Parnaíba PI 2023

 Confira de perto, visite Luiza Amélia que Jaz em seu leito de Morte à sombra de sua linda Gameleira.

Espero que tenha gostado!

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Até o próximo post….

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