Resenha do Cd A F�brica Do Poema - Adriana Calcanhotto no site Galeria Musical

Resenha do Cd A F�brica Do Poema / Adriana Calcanhotto

A F�BRICA DO POEMA title=

A F�BRICA DO POEMA
ADRIANA CALCANHOTTO
1994

SONY MUSIC
Por Renan Nazzos

Quem ouve os trabalhos mais recentes da cantora e compositora Adriana Calcanhotto, percebe um processo de feitura dos discos com o corte proposital de excessos, acordes, vozes, enfeites, efeitos, repeti��es e sobras para, assim, evidenciar o que sobreviver de cada can��o e for, portanto, o essencial. Esse foi o argumento para seu disco de 2002, Cantada, e a ideia parece ter sido, de alguma forma, perseguida nos dois trabalhos seguintes � excetuando os discos sob o heter�nimo Partimpim � Mar� (2008) e o mais recente O Micr�bio do Samba (2011). Apesar disso � ou por isso mesmo -, Adriana continua produzindo discos elegantes e distantes de uma linearidade previs�vel. No entanto, foi ainda na d�cada de 1990 que a artista abusou das texturas, instrumentos, ru�dos, doses de experimentalismos e trouxe de vez a poesia para sua m�sica, naquele que � considerado por muitos o seu grande disco. Trata-se do terceiro t�tulo de sua discografia, A F�brica do Poema, gravado no inverno de 1994 e lan�ado no fim do mesmo ano, quando Adriana j� n�o usava mais os cabelos amarelos e ainda assinava seu sobrenome com um �nico T.

Depois do enorme sucesso do disco Senhas (1992), que lhe rendeu disco de ouro e exaustiva execu��o de m�sicas como Esquadros e Mentiras, Calcanhotto concebeu A F�brica do Poema para fugir da superexposi��o na m�dia, chatear imbecis e n�o ser aplaudida como anuncia na primeira can��o do disco, a deliciosa Por que voc� faz cinema?. Adriana se apropriou da resposta do cineasta Joaquim Pedro de Andrade para a pergunta-t�tulo (Joaquim Pedro de Andrade responde in �Pourquoi filmez-vous?� Lib�ration � Maio 87) e fez a melodia para o texto como quem responde por que faz m�sica. Na �ltima can��o do disco, Minha m�sica, continua respondendo o que quer sua m�sica e o que quer dela. A faixa em clima jazzy tem a participa��o de seu pai, Carlos Calcanhotto, baterista de jazz, cool jazz e bossa nova.

Sintomaticamente, h� a presen�a de poemas e poetas na f�brica de m�sica de Calcanhotto, a come�ar pela faixa t�tulo. O poema � de Waly Salom�o para a arquiteta Lina Bo Bardi e a constru��o da melodia ficou por conta de Adriana. A f�brica do poema � a can��o � tem sua atmosfera on�rica, densa e enigm�tica perfeitamente traduzida no arranjo e interpreta��o. � uma p�rola da m�sica brasileira! Inverno � mais uma bela can��o feita em parceria com um poeta, mas dessa vez o caminho foi inverso: Adriana entregou a melodia a Ant�nio C�cero para que o parceiro fizesse a letra. Inverno � um dos pontos altos dA F�brica e a can��o � lembrada at� hoje em seus shows. Adriana fabricou nesse disco outros dois sucessos que chegaram �s r�dios e tamb�m s�o cantados em coro por seu p�blico at� hoje: Cariocas e a balada Metade.

Mais poesia: agora com a participa��o dos poetas nas grava��es. O verme e a estrela � um poema de Pedro Kilkerry, poeta simbolista, musicado por Cid Campos e sacado por Adriana para seu repert�rio. Essa que �, talvez, a can��o mais rebuscada do disco ainda tem a participa��o de outro poeta, Augusto de Campos, lendo um trecho do mesmo poema. Outro caso � can��o Sudoeste; fragmento do poema Buraco negro de Jorge Salom�o, mais um a se tornar parceiro de Adriana. Eis o fragmento:

��tenho por princ�pios
Nunca fechar portas
Mas como mant�-las abertas
O tempo todo
Se em certos dias o vento
Quer derrubar tudo?� �

E o poeta vai para o est�dio quebrar copos, literalmente. Ali�s, essa � uma caracter�stica da sonoridade dA F�brica do Poema; os sons inesperados vindos de assovios, vidros quebrando, passos, maquina de escrever, batidas em objetos ajudando a criar as texturas dos arranjos com os instrumentos tradicionais. Essa vontade e liberdade para experimentar s�o evidentes, por exemplo, em Portait of Gertrude (Gertrude Stein Reads from her poetry), leitura de um poema pela escritora norte-americana Gertrude Stein, extra�da de uma fita k7.

Adriana nos engana, �s vezes. Seu canto suave e o viol�o dedilhado delicadamente disfar�am, eventualmente, uma fina ironia e at� certa f�ria. Em A F�brica do Poema, isso aparece em Roleta russa, da pr�pria Adriana, e em Bagatelas, composta por Frejat e Ant�nio C�cero, j� gravada pelo Bar�o Vermelho. Mas n�o � preciso procurar muito para comprovar o que digo. Experimente ouvir Vambora � um dos maiores sucessos de sua carreira, que seria lan�ado quatro anos depois � e perceber o tom de ordem: �Entre por essa porta agora / E diga que me adora / Voc� tem meia hora / Pra mudar a minha vida / Vem, vambora�. �, Adriana est� certa quando canta em Bagatelas �Que bom que eu n�o tinha um rev�lver�.

Adriana garimpou a obra de compositores amigos para concluir o repert�rio de sua f�brica. Aqueles que se tornariam recorrentes em sua discografia a partir de ent�o mandaram suas can��es. Arnaldo Antunes colaborou com Estrelas e de P�ricles Cavalcanti foram eleitas a bela toada romantica Aconteceu e Tema de Alice, essa �ltima Adriana j� havia cantado para a trilha do filme Mil e uma de Susana Moraes. At� Chico Buarque Adriana incluiu no repert�rio, escolhendo e gravando muito bem Morro Dois Irm�os.

Adriana Calcanhotto justificou logo cedo com A F�brica do Poema por que � considerada umas das artistas mais inteligentes e refinadas de sua gera��o. O di�logo com a poesia e experimentalismo se manteve nos discos posteriores bem como o alto padr�o est�tico que pontua este belo trabalho.

Resenha Publicada em 26/03/2012





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