O acidente de Chernobyl: as causas do desastre nuclear na Ucrânia

O acidente de Chernobyl: as causas do desastre nuclear na Ucrânia

No dia 26 de Abril de 1986, um acidente nuclear ocorrido na Ucrânia chocou o mundo e abriu o caminho que conduziria ao final da União Soviética. Esmiuçamos cinco dados essenciais para entender as verdadeiras dimensões da tragédia.

Actualizado a

Até meados da década de 1980, poucas pessoas sabiam da existência de uma importante central nuclear perto da cidade ucraniana de Chernobyl. Era um sítio desconhecido até 26 de Abril de 1986, quando um dos quatroreactores de uma central nuclear na Ucrânia começou a arder, provocando aquele que seria o pior desastre nuclear da história, só igualado pelo ocorrido em Fukushima.

Mais de 30 anos após a catástrofe, uma famosa série de televisão recordou o acontecimento que nos fez questionar a segurança nuclear. Agora, a invasão russa reacendeu o debate e despertou antigos fantasmas sobre um possível novo acidente nuclear na região. O que correu mal em Chernobyl? Quem foi o responsável pelo acidente de Chernobyl? Até onde chegou a radiação? Quantas pessoas afectou? Como foi a zona descontaminada? O que acontecerá agora à central nuclear? As respostas abaixo. 

O que causou o acidente?

CORDON PRESS

1 / 5

O que causou o acidente?

O reactor RBMK (condensador de alta potência) número quatro da central nuclear de Chernobyl, em Pripyat, na Ucrânia explodiu. Os responsáveis pela central não cumpriram as medidas de segurança e o combustível de urânio do reactor sobreaqueceu. Aquelas centrais não dispunham daquilo que se conhece por “estrutura de contenção”, uma cúpula de betão concebida para manter a radiação no interior da central em caso de acidente.

A explosão causou a dispersão de elementos radioactivos (plutónio, iodo, estrôncio e césio), que contaminaram uma área de 142.000 quilómetros quadrados no norte da Ucrânia, no sul da Bielorrússia e na região russa de Briansk. Além disso, os blocos de grafite utilizados como protecção incendiaram-se devido às altas temperaturas quando o ar penetrou no núcleo do reactor, contribuindo para a emissão de materiais radioactivos para o meio ambiente.

Quantas pessoas afectou?

ISTOCK

2 / 5

Quantas pessoas afectou?

A explosão inicial ceifou a vida de dois trabalhadores da central nuclear. Outras 28 pessoas, incluindo bombeiros e membros dos serviços de emergência encarregados da descontaminação, morreram durante os três primeiros meses após a explosão devido a Síndrome Aguda da Radiação e um trabalhador faleceu com uma paragem cardíaca.

Os cerca de 50.000 habitantes de Pripyat, uma povoação situada a apenas três quilómetros da central, foram evacuados 36 horas após o acidente. Ao longo das semanas seguintes, foram evacuadas 67.000 pessoas que viviam em todo o perímetro contaminado.

A chuva radioactiva, 400 vezes superior à radioactividade libertada em Hiroshima, expulsou mais de 300.000 pessoas dos seus lares. Segundo a OMS, um estudo realizado por uma centena de cientistas concluiu que a radiação de Chernobyl poderia ter custado a vida a 4.000 pessoas nos primeiros 20 anos após a tragédia. No entanto, de acordo com a mesma fonte, o número de mortes atribuível ao desastre nuclear em meados de 2005 não chegava a 50.

Uma das doenças mais generalizadas entre a população afectada foi o cancro da tiróide. Pouco depois do acidente, foram documentados até 1.800 casos em crianças dos 0 aos 14 anos. A glândula tiróide dos mais pequenos é particularmente susceptível ao iodo radioactivo, que pode causar cancro. Os exames de saúde realizados aos trabalhadores encarregados de limpar a central (chamados ‘liquidadores’) não demonstraram uma correlação directa entre a exposição à radiação e o aumento de outros casos de cancro ou outras doenças. Outro factor a ter em conta são os efeitos psicológicos derivados do acidente, que continuam a causar danos 33 anos após o fatídico acontecimento, provocando vários casos de suicídio e depressão e problemas de alcoolismo.

Até onde chegou a radiação?

ISTOCK

3 / 5

Até onde chegou a radiação?

Estima-se que a contaminação alcance actualmente cerca de 150.000 quilómetros quadrados, compreendidos entre a Bielorrússia, Rússia e Ucrânia. A zona de exclusão estende-se num raio de 30 quilómetros em redor da central, abrangendo uma área aproximada de 5.200 quilómetros quadrados.

A nuvem radioactiva originada pela explosão alcançou mais de mil metros de altitude, embora os ventos favoráveis a tenham mantido longe de Pripyat, cuja população ainda não tinha sido evacuada. Se não fossem as condições meteorológicas, a tragédia poderia ter sido ainda pior.

Como foi a zona descontaminada?

ISTOCK

4 / 5

Como foi a zona descontaminada?

Nos dias após a explosão, milhares de trabalhadores, aos quais se chamou ‘liquidadores’, dirigiram-se rapidamente a Chernobyl para combater o desastre nuclear. A equipa de liquidadores era maioritariamente composta por funcionários das centrais, bombeiros ucranianos e soldados e mineiros vindos da Rússia, Bielorrússia, Ucrânia e outras partes da União Soviética.

O número exacto é desconhecido devido à ausência de dados rigorosos, mas os registos mencionam até 600.000 pessoas com diferentes funções. Alguns ocuparam-se directamente dos trabalhos de descontaminação, mas muitos outros trabalharam na evacuação e construção de povoados destinados aos trabalhadores das centrais.

Os mineiros de carvão escavaram sob a central para bombear nitrogénio líquido e arrefecer o combustível nuclear, enquanto os pilotos de helicóptero despejaram 4.500 toneladas de chumbo, areia, argila e outros materiais para abafar as chamas e absorver a radioactividade. Uma equipa de soldados realizou incursões cronometradas pelo tecto da central para limpar os restos de grafite expelidos pela explosão. Esses 3.400 homens, ironicamente apelidados de ‘bio-robots’, absorveram em poucos segundos a radiação de uma vida inteira.

O que vai acontecer à fábrica?

CORDON PRESS

5 / 5

O que vai acontecer à fábrica?

O último reactor foi selado no ano 2000, iniciando-se posteriormente os trabalhos de desmantelamento da central. O desmantelamento completo de Chernobyl implica a eliminação do combustível, a descontaminação de toda a central e da área em seu redor, incluindo a água e o solo, que podem ser radioactivos.

O destino do fatídico quarto reactor ainda não foi decidido. Os trabalhos serão realizados sob a supervisão do governo da Ucrânia, com a colaboração da Agência Internacional da Energia Atómica (IAEA).

As lições aprendidas com o acidente serviram para a IAEA identificar deficiências na Europa Central e de Leste, bem como em alguns dos países que faziam parte da antiga União Soviética. Grande parte do seu trabalho destina-se a identificar os pontos fracos das centrais e a propor melhorias no design dos reactores RMBK e VVR (reactor nuclear de água pressurizada) soviéticos. Nos últimos anos, a entidade de supervisão tem dado maior importância a outros aspectos fundamentais, como a segurança operacional e a supervisão dos sistemas de segurança.