Ac�rd�o do Tribunal da Rela��o de Lisboa

Ac�rd�o do Tribunal da Rela��o de Lisboa
Processo:
2402/17.4T8PDL-A.L1-6
Relator: CARLOS CASTELO BRANCO (VICE PRESIDENTE)
Descritores: CONFLITO DE COMPET�NCIA
PROCESSO TUTELAR
ALTERA��O DO EXERC�CIO DAS RESPONSABILIDADES PARENTAIS
COMPET�NCIA POR CONEX�O
N� do Documento: RL
Data do Acord�o: 04/24/2024
Vota��o: DECIS�O INDIVIDUAL
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: CONFLITO DE COMPET�NCIA
Decis�o: RESOLVIDO
Sum�rio: 1) Tendo sido instaurado - previamente aos presentes autos (de a��o tutelar comum) em 2017, relativamente � mesma crian�a - processo de altera��o da regula��o do exerc�cio das responsabilidades parentais, distribu�do ao Ju�zo de Fam�lia e Menores de Ponta Delgada – Juiz “X”, que foram, entretanto, declarados extintos, por deser��o da inst�ncia, por for�a do regime de conex�o especial, constante do artigo 11.�, n.� 1, do RGPTC, continua a ser competente para a tramita��o da a��o tutelar comum, o referido Ju�zo.
2) A circunst�ncia de a anterior a��o se encontrar finda e n�o ter tido, ali�s, seguimento, por falta de documento essencial que a parte n�o juntou, vindo ulteriormente a ser proferida decis�o de extin��o da inst�ncia por deser��o, n�o afasta a dita conex�o, sendo certo que a lei n�o faz depender a sua operatividade do estado do processo e, designadamente, de a primeira a��o se encontrar pendente ou ter findado.
Decis�o Texto Parcial:
Decis�o Texto Integral: I. O Ju�zo de Fam�lia e Menores de Ponta Delgada – Juiz “X” suscita a resolu��o de conflito negativo de compet�ncia entre ele pr�prio e o Ju�zo de Fam�lia e Menores de Ponta Delgada – Juiz 1 para a tramita��o do presente processo tutelar comum, instaurado ao abrigo do disposto no artigo 67.� do RGPTC (Regime Geral do Processo Tutelar C�vel, aprovado pela Lei n.� 141/2015, de 8 de setembro), com fundamento em que ambos se declararam incompetentes para dele conhecer.
O Ju�zo de Fam�lia e Menores de Ponta Delgada – Juiz “Y” declarou-se incompetente para tramitar o presente processo� tutelar c�vel, por despacho de 22-02-2024, com fundamento em que, relativamente � mesma crian�a, correu termos processo de altera��o da regula��o do exerc�cio das responsabilidades parentais sob n.� (…)02/17.4T8PDL, pelo Ju�zo de Fam�lia e Menores de Ponta Delgada – Juiz “X”, em conformidade com o disposto no artigo 11.�, n.� 1, do RGPTC.
Por sua vez, o Ju�zo de Fam�lia e Menores de Ponta Delgada – Juiz “X” declarou-se incompetente para a tramita��o do presente processo, com fundamento, em s�ntese, em que, muito embora tenha corrido termos processo de altera��o da regula��o do exerc�cio das responsabilidades parentais sob n.� (…)02/17.4T8PDL, a referida a��o n�o passou do requerimento inicial, porquanto a inst�ncia foi ap�s este requerimento declarada extinta por deser��o, por despacho judicial de 18-05-2018, entendendo n�o se verificarem os pressupostos para a atribui��o da compet�ncia por conex�o a que se refere o n.� 1 do artigo 11.� do RGPTC.
A requerente e o requerido foram notificados.
O processo foi continuado com vista ao Minist�rio P�blico, nos termos do artigo 112.�, n.� 2, do CPC, considerando como competente para tramitar o processo tutelar c�vel, o Ju�zo de Fam�lia e Menores de Ponta Delgada – Juiz “Y”, entendendo, em suma, que “a compet�ncia por conex�o regulada no dito artigo 11� do RGPTC, n�o afasta a possibilidade de apensa��o de um processo findo a outro pendente, havendo, contudo, que atentar se tal se justifica.
(…) A express�o “independentemente do respetivo estado” destinou-se a esclarecer que a apensa��o de processos, no �mbito da mat�ria dos autos, � obrigat�ria, n�o podendo, nomeadamente o “estado do processo”, ser invocado como inconveniente da apensa��o.
Contudo, o fim primordial da apensa��o de processos � o julgamento uniforme e coerente, para al�m da economia processual.
Ora, a justifica��o de que a� poder� existir um tratamento unit�rio de todas as situa��es que envolvam o menor em causa, de modo a que a solu��o processual a encontrar para o seu desenvolvimento / crescimento harmonioso, seja considerada � o que resulta efetivamente da raz�o de ser da norma contida no art.� 11�, n� 1.
Face aos especiais contornos do caso concreto, e assinalados na decis�o de 18-03-2024, n�o se justifica convocar o preceituado neste normativo legal, porquanto n�o est�o reunidos os pressupostos exigidos para a apensa��o determinada (…)”.
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II. Mostra-se apurado, com pertin�ncia para a resolu��o do conflito, o seguinte:
1) Por peti��o inicial apresentada em ju�zo em 18-09-2017, que deu origem ao processo n.� (…)02/17.4T8PDL, “A” veio requerer altera��o da regula��o do exerc�cio das responsabilidades parentais relativamente � sua filha menor, “B”, o que fez contra “C”;
2) Nesses autos, em 09-11-2017 foi proferido despacho a determinar que os autos aguardassem a interrup��o da inst�ncia pela instru��o do processo com assento de nascimento da menor, que n�o constava do processo;
3) Notificada a requerente desse despacho, em 17-05-2018, foi proferida decis�o de extin��o da inst�ncia, naqueles autos, por deser��o, nos termos do artigo 281.� do CPC;
4) Por peti��o inicial apresentada em ju�zo em 01-02-2024, o Minist�rio P�blico, ao abrigo do disposto no artigo 67.� do RGPTC, veio instaurar A��o Tutelar Comum, relativamente a “B”, sendo requeridos os pais desta, “C” e “A” e a sua av� materna, “D”, visando-se a altera��o do regime de exerc�cio das responsabilidades parentais – fixado no �mbito do processo de div�rcio e separa��o de pessoas e bens por m�tuo consentimento n.� (…)49/2015, que correu termos na Conservat�ria do Registo Civil de Ponta Delgada, ficando a mesma entregue � guarda e cuidados da referida av� materna;
5) A a��o referida em 4) foi distribu�da ao Ju�zo de Fam�lia e Menores de Ponta Delgada – Juiz “Y”, sob o n.� (…)5/24.7T8PDL, o qual, em 22-02-2024 proferiu despacho de onde consta, nomeadamente, o seguinte:
“(…) Nos termos do artigo 11.�, n.� 1, do RGPTC, “se, relativamente � mesma crian�a, forem instaurados, separadamente, processo tutelar c�vel e processo de promo��o e protec��o (…) ou processo tutelar educativo, devem os mesmos correr por apenso, independentemente do respetivo estado, sendo competente para deles conhecer o juiz do processo instaurado em primeiro lugar”.
Retornando ao caso em apre�o, o presente processo tutelar c�vel respeita � crian�a “B”, nascida a (…)/(…)/2009, n�o se podendo olvidar que correu, quanto a esta, o processo de altera��o da regula��o do exerc�cio das responsabilidades parentais sob n.� (…)02/17.4T8PDL, pelo Ju�zo de Fam�lia e Menores de Ponta Delgada – Juiz “X”.
Considerando o disposto nos referidos normativos conclui-se que o presente processo tutelar c�vel tem, necessariamente, de correr por apenso ao identificado processo.
Em conformidade com o exposto, e face � regra de conex�o referida, declaro a incompet�ncia do Ju�zo de Fam�lia e Menores de Ponta Delgada – Juiz “Y” para tramitar os presentes autos e, nessa sequ�ncia, determino a sua remessa para apensa��o ao processo de altera��o da regula��o do exerc�cio das responsabilidades parentais, que correu termos pelo Ju�zo de Fam�lia e Menores de Ponta Delgada – Juiz “X” (proc. n.� (…)02/17.4T8PDL).”.
6) Remetidos os autos ao Ju�zo de Fam�lia e Menores de Ponta Delgada – Juiz “X”, a� foi proferido despacho, em 18-03-2024, de onde se l�, nomeadamente, o seguinte:
“Efetivamente a 18-09-2017 foi instaurada no Ju�zo de Fam�lia e Menores de Ponta Delgada – J”X”, por “A”, a��o de altera��o do exerc�cio das responsabilidades parentais, regulado anteriormente na Conservat�ria do Registo Civil, em refer�ncia � menor “B”, contra o progenitor desta, “C”, � qual foi atribu�do o n.� (…)02/17.4T8PDL.
Sucede que tal a��o n�o passou do requerimento inicial, porquanto a inst�ncia foi ap�s este requerimento declarada extinta por deser��o, por despacho judicial de 18-05-2018, em virtude da Requerente n�o ter instru�do o processo, conforme foi convidada, com o assento de nascimento da menor, necess�rio a se aferir da situa��o da menor em termos de regula��o do exerc�cio das responsabilidades parentais.
Neste contexto, n�o se verificam os pressupostos substantivos subjacentes � atribui��o da compet�ncia por conex�o ao Juiz 2 do Ju�zo de Fam�lia e Menores para conhecer do presente processo tutelar c�vel, prevista no artigo 11�/1 do RGPTC, a saber, nas palavras de Paulo Guerra (in Lei de Prote��o de crian�as e Jovens em Perigo, Almedina, 2016, 2� edi��o) �possibilitar que o decisor tenha uma vis�o global do hist�rico ou “percurso processual” da crian�a, de todas as interven��es, medidas e provid�ncias de que j� beneficiou ou a que foi sujeito, evitando-se assim interven��es e medidas com pouca ou nenhuma possibilidade de sucesso ou mesmo contraproducentes – o que � de todo desej�vel. Mas tamb�m, ainda, a ideia de responsabiliza��o do magistrado decisor relativamente a tudo o que for o “itiner�rio processual” de uma concreta crian�a�.
Pelo exposto, declaro o Juiz 2 do Ju�zo de Fam�lia e Menores de Ponta Delgada incompetente para tramitar os presentes autos e competente, o Juiz “Y” do Ju�zo de Fam�lia e Menores de Ponta Delgada, onde a a��o foi primeiramente instaurada tomando o n.� (…)85/24.7T8PDL.”.
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III. Nos termos do n.� 2 do artigo 109.� do CPC, h� conflito, positivo ou negativo, de compet�ncia quando dois ou mais tribunais da mesma ordem jurisdicional se consideram competentes ou incompetentes para conhecer da mesma quest�o.
N�o h� conflito enquanto forem suscet�veis de recurso as decis�es proferidas sobre a compet�ncia (cfr. artigo 109.�, n.� 3, do CPC).
Quando o tribunal se aperceba do conflito, deve suscitar oficiosamente a sua resolu��o junto do presidente do tribunal competente para decidir (cfr. artigo 111.�, n.� 1, do CPC).
Entendem ambos os tribunais, n�o serem competentes para dirimir o presente processo.
A Lei n.� 141/2015, de 08 de setembro veio aprovado o Regime Geral do Processo Tutelar C�vel (abreviadamente RGPTC) estabelecendo “o processo aplic�vel �s provid�ncias tutelares c�veis e respetivos incidentes” (cfr. artigo 1.�).
O artigo 11.� do RGPTC regula os casos de “compet�ncia por conex�o”, dispondo o seguinte:
1 - Se, relativamente � mesma crian�a, forem instaurados, separadamente, processo tutelar c�vel e processo de promo��o e prote��o, incluindo os processos perante a comiss�o de prote��o de crian�as e jovens, ou processo tutelar educativo, devem os mesmos correr por apenso, independentemente do respetivo estado, sendo competente para deles conhecer o juiz do processo instaurado em primeiro lugar.
2 - O disposto no n�mero anterior n�o se aplica �s provid�ncias tutelares c�veis relativas � averigua��o oficiosa da maternidade ou da paternidade, nem �s que sejam da compet�ncia das conservat�rias do registo civil, ou �s que respeitem a mais que uma crian�a.
3 - Estando pendente a��o de div�rcio ou de separa��o judicial, os processos de regula��o do exerc�cio das responsabilidades parentais, de presta��o de alimentos e de inibi��o do exerc�cio das responsabilidades parentais correm por apenso �quela a��o.
4 - Quando o processo tutelar c�vel respeitar a mais do que uma crian�a, pode ser instaurado um �nico processo e, tendo sido instaurados processos distintos, pode proceder-se � apensa��o de todos eles ao que foi instaurado em primeiro lugar, se as rela��es familiares assim o justificarem.
5 - A incompet�ncia territorial n�o impede a observ�ncia do disposto nos n.os 1, 3 e 4.”.
Da conjuga��o do n.� 1 com o n.� 5 do preceito, resulta que a compet�ncia “por conex�o”, a que se refere o primeiro, sobreleva sobre a compet�ncia territorial.
Da interpreta��o do n.� 1 do artigo 11.� do RGPTC resulta a consagra��o de 4 regras:
“- a 1� imp�e (“devem”) a apensa��o entre o processo tutelar c�vel e o processo de promo��o e prote��o ou o processo tutelar educativo (e somente entre estes);
- a 2� que a apensa��o opera em qualquer estado dos processo (mesmo que findos);
- a 3� (impl�cita), estabelece a ordem ou preced�ncia da apensa��o (ao processo instaurado em 1� lugar);
- a 4� instituindo um regime especial de compet�ncia territorial (o tribunal onde primeiramente se instaurou qualquer dos referidos processos)” (assim, a decis�o do Vice-Presidente do STJ de 21-04-2023, P� 2600/14.2TBALM-B.L1.S1, rel. NUNO GON�ALVES, dispon�vel em https://www.dgsi.pt).
O regime de compet�ncia estabelecido no n.� 1 do artigo 11.� do RGPTC traduz um regime especial de compet�ncia, dito “por conex�o”, que sobreleva sobre a compet�ncia territorial (cfr. n.� 5 do mencionado artigo 11.� do RGPTC).
“A atribui��o de compet�ncia por conex�o constitui uma exce��o � regra geral da compet�ncia territorial. (…). A compet�ncia por conex�o � prevista nos artigos 11.� n. �1 do RGPTC, 81.� n. �1 da LPCJP. Salienta- se o seu car�cter especial e deste modo prevalecente em rela��o �s regras de compet�ncia territorial, atribuindo a compet�ncia a quem j� tem para conhecer o outro processo. A conex�o processual mant�m-se mesmo com a transi��o para outro Tribunal” (assim, Ana Catarina Martins Sousa; A harmoniza��o das decis�es relativas � crian�a e ao jovem; Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa, mar�o de 2019, pp. 44-45, texto consultado em: https://run.unl.pt/bitstream/10362/77155/1/Sousa_2019.pdf).
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IV. Conhecendo:
Em face do regime especial de compet�ncia “por conex�o”, resultando do n.� 1 do artigo 11.� do RGPTC, “sendo instaurado relativamente � mesma crian�a ou jovem um processo (…) tutelar c�vel (…), e anos depois � instaurado novo processo, nomeadamente um processo tutelar c�vel (…), estando aquele ou aqueles j� arquivados, o tribunal e juiz que o decidiu, ainda que estejam findos, continua a manter a sua compet�ncia material para todos estes processos (pressupondo que continua a manter compet�ncia material para o efeito) (…)”, o que “significa que a exist�ncia de qualquer um dos apontados processos determina, no futuro, a compet�ncia desse tribunal para todos os demais processos supervenientes relativamente � mesma crian�a, independentemente de outras vicissitudes ou circunst�ncias, exigindo-se, apenas, que esse tribunal continue a manter a necess�ria compet�ncia material para o efeito” (assim, Tom� D’Almeida Rami�o; Regime do Processo Tutelar C�vel, Anotado e Comentado, 4.� ed., Quid Juris, 2020, p. 59).
Ora, conforme resulta do exposto, previamente aos presentes autos – de a��o tutelar comum – foi instaurado, em 2017, relativamente � mesma crian�a, processo de altera��o da regula��o do exerc�cio das responsabilidades parentais, sob o n.� (…)02/17.4T8PDL.
Tais autos, distribu�dos ao Ju�zo de Fam�lia e Menores de Ponta Delgada – Juiz “X” foram, entretanto, declarados extintos, por deser��o da inst�ncia.
Ulteriormente, foram instaurados os presentes autos de a��o tutelar comum, por peti��o inicial apresentada em ju�zo em 01-02-2024, tendo sido distribu�dos ao Ju�zo de Fam�lia e Menores de Ponta Delgada – Juiz “Y”.
Verifica-se que, entre os referidos processos h� uma rela��o de anterioridade do processo de altera��o da regula��o das responsabilidades parentais, que foi instaurado em primeiro lugar.
A circunst�ncia de a anterior a��o se encontrar finda e n�o ter tido, ali�s, seguimento, por falta de documento essencial que a parte n�o juntou, vindo ulteriormente a ser proferida decis�o de extin��o da inst�ncia por deser��o, n�o afasta a dita conex�o, sendo certo que a lei n�o faz depender a sua operatividade do estado do processo e, designadamente, de a primeira a��o se encontrar pendente ou ter findado.
Do exposto resulta que, por for�a do supra referido regime de conex�o especial, constante do artigo 11.�, n.� 1, do RGPTC, continua a ser competente para a tramita��o do presente processo tutelar comum, o Ju�zo de Fam�lia e Menores de Ponta Delgada – Juiz “X”.
Pelo exposto, sem necessidade de mais considera��es, decido este conflito, declarando competente para a presente a��o, o Ju�zo de Fam�lia e Menores de Ponta Delgada – Juiz “X”.
Sem custas.
Notifique-se (cfr. artigo 113.�, n.� 3, do CPC).
Baixem os autos.

Lisboa, 24-04-2024,
Carlos Castelo Branco (Vice-Presidente, com poderes delegados).