Pouquíssimas seriam as pessoas que teriam a coragem de contestar o grande vencedor do Oscar de 2024, com prêmios de Melhor Filme, Diretor e Ator (para Cillian Murphy). Levando um total de sete estatuetas douradas para casa, o filme de Christopher Nolan, 'Oppenheimer', foi abraçado pelo mundo inteiro, tornando-se uma das maiores bilheterias do ano de 2023 e ainda uma das obras mais elogiadas pela crítica e cinéfilos da última temporada.
O filme sobre o pai da bomba atômica pode ter dado o que falar, mas não surpreendeu aquele que é considerado o gênio do horror, John Carpenter, que, com todas as letras, disse o badalado filme de Nolan era nada além do que 'ok'.
O fato é que no dia da maior premiação do cinema, não haviam dúvidas de qual seria o resultado final. Ainda que muitos outros dos competidores se mostrassem mais fortes, complexos e completos — isto é, o francês 'Anatomia de Uma Queda', o britânico polêmico 'Zona de Interesse', o apaixonante 'Pobres Criaturas' ou mesmo o magistral de Scorsese 'Assassinos da Lua das Flores' - nenhum conseguia se equiparar ao sucesso de 'Oppenheimer' entre o público, que acabou gerando vitórias seguidas em outras premiações que antecederam o Oscar.
É fato que sucesso comercial não é o fator de 'desempate' do Oscar, mas no caso de 'Oppenheimer' valeu muito: o nome de Nolan já era um daqueles bastante cogitados para vencer há anos, de 'Batman - O Cavaleiro das Trevas' a 'Dunkirk', e o tema do filme ainda resgatava um pedaço importante da história recente dos Estados Unidos e da identidade americana - que nunca deixou de lado a questão armamentista. É claro que a atenção veio, e não foi apenas pela lista imensa de bons atores. Outras lendas do cinema fizeram suas homenagens ao filme, acrescentando ainda mais valor ao longa de três horas e tantas.
Oliver Stone, que dirigiu 'Plattoon', JFK - A Pergunta que Não Quer Calar' e outros longas premiados, elogiou 'Oppenheimer', chamando-o de clássico e dono de um "roteiro cheio de camadas e fascinante". Ele não foi o único: Denis Villeneuve, o dono das duas partes de 'Duna' também fez questão de expressar sua admiração, além de Steven Soderbergh ('Traffic') e do roteirista (parceiro de anos de Scorsese em produções como 'Taxi Driver') e diretor Paul Schrader.
Entre uma chuva inteira de elogios e prêmios, houve um único gênio que resolveu ir contra a maré: John Carpenter. Não é necessário introduzir demais o perfil do homem para saber que ele (e consequentemente sua opinião) merecem, no mínimo, certo respeito.
O diretor de 50 anos de carreira tem no currículo filmes que podem ter sido mal compreendidos à época do seu lançamento, mas ajudaram a fundar bases em gêneros e estabeleceram padrões de qualidade irreversíveis ao mundo dos filmes.
Pelo menos, uma das suas obras-primas você já deve ter assistido.
'Halloween - A Noite do Terror' é apenas um dos primeiros, lançado em 1978, iniciando (verdadeiramente) o subgênero dos slashers na década de 1980 - que foram inspirados pelos 'Giallos' italianos, e precedidos pelos 'O Massacre da Serra Elétrica' e 'Noite do Terror' em 1974, nos EUA.
O impecável (e inspirador) 'O Enigma de Outro Mundo', de 1982, também esteve sob seu comando. Este, se você bem sabe, estabeleceu uma nova leva de filmes de terror, que apenas através da sugestão e, nesse caso, da incerteza e da desconfiança, instituía o suspense.
Filmes como os dois de Quentin Tarantino, 'Cães de Aluguel' e 'Os Oito Odiados' são óbvios sucessos que se inspiraram na narrativa de Carpenter. Outros como o indie cult 'Corrente do Mal' e a série de sucesso 'Stranger Things' são também parte da leva de hits que tem 'O Enigma de Outro Mundo' como clara inspiração.
O cômico e socialmente relevante 'Eles Vivem', de 1989, além do clássico da "Sessão da Tarde" 'Os Aventureiros do Bairro Proibido', de 1986, e o desafiador e perturbador 'À Beira da Loucura' também são do autor que desde meados da década de 1970 tem trabalhado arduamente, construindo história e legado no mundo do cinema.
Mesmo que alguns possam discordar, John Carpenter tem muito mais do que lugar de fala quando se trata de criticar um filme.
"'Oppenheimer' é apenas ok. Todos estão o elogiando como se fosse o filme do século, mas eu não tenho tanta certeza disso".
Ainda bem que, dessa vez, John Carpenter veio dar voz àqueles que discordaram da lavada do filme de Nolan na prateleira de estatuetas desse ano, provando que a arte, independentemente de seu tamanho e homogeneidade de opiniões, deve sempre ser contestada, redescoberta, analisada uma e outra vez.
Relembre o momento em que 'Oppenheimer' leva o prêmio de Melhor Filme no Oscar desse ano. Em seguida, reveja o trailer do filme de Christopher Nolan que levou sete estatuetas para casa.
*Com edição de Luís Alberto Nogueira