Três obras imperdíveis de Norman Mailer para ler em português
Por: Bertrand Livreiros a 2023-02-07
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Romancista, jornalista, realizador de cinema e polemista invertebrado, o autor norte-americano Norman Mailer completaria 100 anos no passado dia 31 de janeiro. Nascido em 1923, em Long Branch, Nova Jérsia, Norman Mailer cresceu em Brooklyn, Nova Iorque, formou-se em engenharia em Harvard e serviu durante a guerra nas Filipinas. Esses foram os anos que inspiram Os Nus e os Mortos (1948), considerada por muitos a sua obra maior.
Depois da guerra, aprofundou a sua carreira como autor e analista político, tendo fundado, em 1955, com outros intelectuais, o contestatário jornal The Village Voice, durante anos imprescindível na cena cultural nova-iorquina. Foi editor do Dissent, entre 1952 e 1963, e presidente do PEN American Centre de 1984 a 1986. Com uma carreira literária variada, controversa e brilhante no panorama literário nos Estados Unidos, viria a publicar mais de trinta títulos, entre os quais Os Exércitos da Noite (1968), pelo qual obteve um National Book Award e um Pulitzer, e O Canto do Carrasco (1980), que o distinguiu com um segundo Pulitzer. Faleceu em 2007, com oitenta e quatro anos.
1. Os Exércitos da Noite
Pela primeira vez traduzido em Portugal em 2021, foi com este romance — um dos pilares do Novo Jornalismo — que venceu do Prémio Pulitzer em 1968 e o Prémio Nacional do Livro. Numa incursão literária onde cruza ficção e não-ficção, Mailer assume um papel de personagem nesta história marcada pela sua própria biografia. Um livro-documento que retrata os acontecimentos de 21 de outubro de 1967, em Washington, dia da Marcha sobre o Pentágono, numa manifestação contra a Guerra do Vietname que culminou em violentos confrontos e com a detenção de centenas de pessoas. Nela estão presentes todos os grupos da Velha e da Nova Esquerda, hippies, liberais de classe média, militantes negros, quakers, cristãos, feministas e as mais variadas tribos urbanas. Ao destruir os moldes da reportagem tradicional, entrelaça magnificamente jornalismo, história e ficção, e reflete sobre grandes questões da sociedade contemporânea.
2. O Combate
Em 1975, no Campeonato Mundial de Boxe de Pesos-Pesados disputado em Kinshasa, Zaire, Muhammad Ali encontrou-se com George Foreman no ringue. O génio de Foreman assentava no silêncio, na serenidade e na astúcia. Nunca tinha sido derrotado. As mãos eram o seu instrumento, e «ele mantinha-as dentro dos bolsos como um caçador guarda a sua espingarda no respetivo estojo de veludo». Juntos, os dois homens fizeram da história do boxe um encontro explosivo de duas mentes brilhantes, duas vontades de ferro e dois egos colossais. Muito mais do que um livro sobre boxe, trata-se do retrato em que Mailer mergulha nos medos, inseguranças e pressões de duas das pessoas mais famosas do planeta — protagonistas daquele que é considerado um dos eventos desportivos mais relevantes do século XX. Com astúcia de jornalista e a linguagem apurada de romancista, o autor apresenta-nos a incerteza, a pobreza, a desigualdade em terras de extrema pobreza, num estilo inconfundível armado de metáforas barrocas e um humor visceral que sempre o marcou.
3. Os Nus e os Mortos
É, porventura, uma das estreias mais bem conseguidas do panorama literário norte-americano de sempre. Considerada por muitos críticos como a sua obra maior, Mailer, à época com apenas 25 anos, dá conta da história que envolve um pelotão de jovens soldados norte-americanos, que percorre o seu caminho através do terreno traiçoeiro que atravessa a ilha de Anopopei, ocupada pelos japoneses. Apanhados na confusão do combate próximo e armado, e perseguidos por atiradores furtivos, são empurrados até aos limites da resistência humana. Mantidos juntos apenas pela vontade crua da sobrevivência, e mal conseguindo manter vivos os seus sonhos no meio da voragem, cada um dos homens encontra as suas esperanças mais recônditas e medos mais profundos expostos a nu pela pressão incansável do combate. O romance, baseado na própria experiência de serviço militar de Mailer, nas Filipinas, durante a II Guerra Mundial, chegaria ao cinema em 1986, numa adaptação do realizador Raoul Walsh.