De 'Ferrari' a 'Senna', Gabriel Leone dá vida a 2 pilotos em seguida por 'coincidência': 'Não tinha nenhum conhecimento de Fórmula 1' | Cinema | G1

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Por Cesar Soto, g1


Gabriel Leone explica 'coincidência' de viver dois pilotos em 'Ferrari' e em 'Senna'

Gabriel Leone explica 'coincidência' de viver dois pilotos em 'Ferrari' e em 'Senna'

Quem fica sabendo que o ator brasileiro Gabriel Leone interpretou dois pilotos automobilísticos reais, um depois do outro, pode achar que ele é algum fanático pelo esporte.

Justo. Afinal, depois de dar vida ao espanhol Alfonso de Portago (1928-1957) em "Ferrari", que estreou nesta quinta-feira (22), ele ainda vai protagonizar a série "Senna". Previstos para 2024, os seis capítulos vão retratar a vida do ícone nacional que morreu na pista em 1994.

Acontece que na verdade o jovem de 30 anos nunca foi um grande fã de corridas . A sequência é, como ele mesmo classifica, uma grande "coincidência".

"Eu sou de 93. Não tinha nem um ano quando ele morreu. Eu já nasci assim no Brasil meio de luto, sabe, em relação ao automobilismo, à Fórmula 1", diz Leone em entrevista ao g1. Assista a um destaque no vídeo acima ou leia a íntegra mais abaixo.

"É claro que eu tenho o Senna como um ídolo, por uma questão quase de osmose, de ser brasileiro, e isso acaba entrando em algum momento. Então, não tinha nenhum conhecimento a respeito de Fórmula 1, de automobilismo. E aí veio essa coincidência que a minha carreira me proporciona, né?"

Em "Ferrari", novo filme do celebrado diretor Michael Mann ("Fogo contra fogo"), o ator deu o pontapé inicial a uma carreira internacional com o pé direito ao interpretar um piloto com papel crucial na história do protagonista.

Jack O'Connell e Gabriel Leone em cena de 'Ferrari' — Foto: Lorenzo Sisti/Divulgação

Estrelado por Adam Driver (da nova trilogia de "Star Wars"), a obra retrata um período conturbado na vida de Enzo Ferrari, o fundador da fábrica italiana de carros esportivos e competitivos.

Além de Leone, o elenco ainda tem Penélope Cruz ("Mães paralelas"), Shaylene Woodley ("Dinheiro fácil") e Patrick Dempsey ("Grey's anatomy").

"Não podia ter porta de entrada melhor. Não só pela qualidade e pela consistência da cinematografia do Michael", fala o brasileiro.

"Ainda tem outros grandes artistas como Adam, como uma Penélope. Claro que atrai atenção. As pessoas vão querer assistir. Diretores, produtores, etc."

"Ele ficou, sei lá, quase 20 anos financiando esse filme. Eu sempre falo que é como se o Michael estava me esperando para fazer esse filme (risos). Porque foi a hora certa, assim. O timing certo do nossos caminhos se cruzarem."

Na entrevista abaixo, editada para clareza, o ator fala sobre sua relação com o diretor americano (antes e depois de conhecê-lo), a coincidência da sequência de trabalhos e como se prepara para interpretar pessoas reais (ele também deu vida a Roberto Carlos no filme "Minha fama de mau").

Leia a entrevista:

G1 - Como foi trabalhar com Michael Mann, um dos maiores diretores de todos os tempos? Você chegou a sentir alguma pressão?

Gabriel Leone - Para mim foi um sonho, né? Como você falou, o Michael é sem dúvidas um dos grandes todos os tempos. E o cara tá vivo ainda, né? Produzindo, filmando.

Eu até sempre conto uma história, uma relação anterior, emotiva para mim. Eu lembro eu molequinho. Meu pai me botou para assisti a "O último dos moicanos" com ele. Esse filme me marcou muito. É muito chocante, né? Eu lembro que fiquei uns dias sem dormir depois disso.

Sempre me acompanhou de alguma forma. Essa trilha sonora é a minha trilha sonora favorita de todas. E depois disso, quando eu virei ator — enfim, comecei a estudar, correr atrás das coisas — reassisti a esse filme milhões de vezes e entendi a grandeza da direção dele, do trabalho do Daniel Day-Lewis. Enfim, aí eu fui atrás dos outros filmes dele também.

Enquanto eu estava filmando, lá na Itália, o meu pai e o meu irmão foram me visitar. Meu pai foi ao set um dia assistir à filmagem. O Michael estava lá me dirigindo e eu apresentei ele no final.

Michael foi super carinhoso com meu pai. Fizemos fotos. Foi um momento super especial para mim. De lembrar aquele garotinho assistindo a "O último dos moicanos" com meu pai e aí agora o meu pai está ali assistindo a esse cara me dirigir.

Então, é isso. Eu sempre admirei muito ele, e trabalhar com ele só fez crescer essa admiração.

Em relação a pressão, é lógico que eu estava ansioso e animado para viver essa experiência, assim. Eu sabia que o filme seria muito grandioso, uma grande produção e tal.

Primeira vez sendo dirigido, e falando e atuando, em inglês, etc, mas desde o primeiro momento — assim que eles me aprovaram, eu tive uma reunião por vídeo com o Michael —, ele sempre me passou muita confiança. Sempre falou: "ó, você foi feito para esse personagem. Esse personagem foi feito para você."

Foi ao longo do processo inteiro assim. Como eu falei, filmar com ele só reforçou tudo o que eu já achava a respeito dele. Eu entendi por que que os atores amam tanto trabalhar e filmar com ele.

Ele é um cara totalmente detalhista, perfeccionista, e ele tem um processo de repetir as cenas, repetir tomadas e experimentar coisas diferentes.

Enfim, é um artista muito inquieto, muito preocupado com essa de chegar ali na essência da história dos personagens, no que de melhor a gente pode tirar dali. Sempre jogando muito junto com os atores.

Então, para mim, foi um processo de muito aprendizado ter essa primeira experiência no mercado americano, atuar em inglês pela primeira vez, logo com esse cara. É uma honra. Foi um sonho.

E é isso, de ter construído uma relação com ele não só profissional, (mas) de admiração mútua, de ter um carinho. A gente fala de vez em quando, troca a mensagem. Enfim, foi incrível para mim.

G1 - E já ter começado logo com alguém como o Michael facilita o futuro da sua carreira internacional? Tira um pouco dessa ansiedade?

Gabriel Leone - Cara, eu encaro minha carreira, as escolhas que eu faço, da mesma maneira lá fora — nos Estados Unidos, seja onde for — como eu encaro aqui, sabe?

Estou atrás de de bons projetos, bons personagens, artistas que me interessam trabalhar, projetos que me desafiem.

Mas é como você falou, não podia ter porta de entrada melhor. Não só pela qualidade e pela consistência da cinematografia do Michael.

Enfim, o filme é bom, né? Eu tenho um puta de um orgulho do filme e do meu trabalho nele.

E ainda tem outros grandes artistas como Adam, como uma Penélope. Claro que atrai atenção. As pessoas vão querer assistir. Diretores, produtores, etc.

Ao mesmo tempo, eu estou muito tranquilo em relação a sequência sabe dos dos próximos passos, os próximos projetos. Não estou querendo me afobar com nada. Muito pelo contrário. Além do lançamento de "Ferrari", tem o lançamento do "Senna". Mais para o final do ano tem a última temporada do "Dom".

Tem "Barba ensopada de sangue", o filme que eu fiz baseado no livro do Daniel Galera dividido pelo Aly Muritiba.

É um ano de grandes lançamentos para mim. Estou indo com calma. Indo na boa, assim, porque eu tenho certeza de que tudo que eu plantei eu vou colher frutos incríveis.

G1 - E o Enzo teve uma vida fantástica. O filme se baseia em um livro que aborda muito mais do que foi retratado. Você chegou a conversar com o Michael sobre por que escolheram esse recorte particular para o filme?

Gabriel Leone - Sim. Na verdade, lógico que o moto do filme é escolha do Michael. Eu não conheço a vida inteira do Enzo em detalhes. Claro que você tem vários outros momentos importantes que dariam filmes, assim como a vida em geral das pessoas, né.

Mas eu acho muito acertada a escolha do Michael. Acho biografia sempre muito difícil -- você filmar a vida de alguém em duas horas, sabe.

E eu acho que a escolha de você querer dar conta de tudo vira, na minha opinião, quase um videoclipe. Você acaba tendo que fazer saltos temporais, não consegue se aprofundar em nada.

Acho muito inteligente a escolha dele de ter pego um recorte muito pequenininho — meses na vida do Ferrari — e usar o recurso de um flashback ou outro pontual. Não é uma coisa cansativa que fica o filme todo.

Adam Driver e Gabriel Leone em cena de 'Ferrari' — Foto: Divulgação

Mas por que eu acho esse recorte específico acertado do Michael? Porque eu acho que era um momento de grande virada, de encruzilhadas, de escolhas da vida do Enzo.

Ele já estava estabelecido como o Enzo Ferrari. A Ferrari já tinha uma potência e uma dimensão muito grande, mas, naquele momento, ele está passando por um drama pesadíssimo na vida pessoal dele.

Ele tinha acabado de perder o filho e, paralelamente a isso, ele tem um filho com uma outra mulher fora do casamento. Então, tem uma questão familiar ali fortíssima nesse período.

E na vida profissional dele a fábrica está indo mal. É um momento em que ele tem que tomar decisões cruciais para para a existência não só do Ferrari o homem, mas a Ferrari a marca.

E eu dei sorte, nesse caso, pelo recorte que ele escolheu, por causa do meu personagem, né? É um personagem que, em nível de Fórmula 1, historicamente ele não tem uma relevância tão grande. Ele fica muito pouco tempo não só dirigindo Fórmula 1, mas na Ferrari inclusive.

Mas, nesse período exato, tem uma relação dele com o Ferrari. Tem uma coisa que acontece no filme e também é determinante para os rumos do Ferrari e, logo, da Ferrari.

Eu brinco que os astros se alinharam assim. O recorte que ele fez, ele ficou, sei lá, quase 20 anos financiando esse filme. Eu sempre falo que é como se o Michael estava me esperando para fazer esse filme (risos). Porque foi a hora certa, assim. O timing certo do nossos caminhos se cruzarem.

G1 - Bom, não chega a ser spoiler o que acontece com o seu personagem, já aconteceu há muito tempo. Como foi a sua reação ao ver aquela cena sua, que é bem forte, pela primeira vez?

Gabriel Leone - É muito, né? Assim, é trágico, mas era era muito comum na época esse tipo de situação.

Tem um dado de que acho que, nessa época, 40 pilotos morriam por ano. A Fórmula 1 era, não que não seja mais, mas era um esporte muito perigoso, em uma época em que você não tinha absolutamente segurança nenhuma.

As tragédias eram chocantes, mas eram comuns de alguma forma. Eu não tinha conhecimento nem da Fórmula 1 dessa época, nem da história do de Portago, quando entrei em contato com o roteiro e com a pesquisa com imagens, com tudo. Lógico que é muito chocante.

E eu não fiz a cena, de certa forma, né? Assim, a cena é muito feita por efeito (visual), mas eu li a cena. Eu sabia o que ia acontecer, e eu confesso que tinha dúvidas se ela ia ela ia pegar o corte final da maneira que estava descrita.

Isso é uma característica do cinema do Michael, essa reconstrução, essa obsessão pelo realismo, pela verdade, a ponto de trazer as pessoas para dentro. A ponto das pessoas se sentirem dentro de um carro de corrida ao longo da experiência do filme.

O corte final é exatamente como está escrito no roteiro e é muito chocante. É muito brutal. A primeira vez que eu vi pronto na sala, eu sabia que o que ia acontecer, mas foi uma pancada para mim também.

Mas, em todas as outras vezes em que eu assisti, começou a virar uma diversão para mim ver a reação das pessoas no cinema. É sempre impagável, o que me deixa muito feliz, porque significa que a gente — lógico, graças aos efeitos e a Montagem — conseguiu construir um momento ali muito especial a ponto de realmente impactar as pessoas.

G1 - Como você mesmo já falou de "Senna", eu gostaria de falar sobre isso. Você já disse que foi uma coincidência fazer dois pilotos com finais trágicos seguidos. Como foi esse processo?

Gabriel Leone - Foi uma coincidência total, assim. Eu sempre fui muito fã de esportes. Sempre pratiquei diversos esportes e sempre gostei de acompanhar, mas eu não tinha tanta relação com automobilismo, porque o Senna morreu em 94.

Eu sou de 93. Então, eu não tinha nem um ano quando ele morreu. Eu já nasci assim no Brasil meio de luto, sabe, em relação ao automobilismo, à Fórmula 1.

É claro que eu tenho o Senna como um ídolo, por uma questão quase de osmose, de ser brasileiro, e isso acaba entrando em algum momento.

Então, não tinha nenhum conhecimento a respeito de Fórmula 1, de automobilismo. E aí veio essa coincidência que a minha carreira me proporciona, né?

De você mergulhar, através da pesquisa, no universo e enfim começar a entender e virar fã eventualmente como aconteceu comigo.

Cena do filme 'Ferrari' — Foto: Eros Hoagland/Divulgação

Quando eu estava filmando "Ferrari", eu fui ao GP de Monza na Itália. Eu filmei um trecho do filme no Autódromo de Ímola, que foi onde o Senna bateu e faleceu. Onde tem uma estátua linda do lado de fora, no parque, em homenagem a ele.

Eu fui até a estátua. Eu já sabia na época que ia fazer "Senna" também, enquanto eu filmava "Ferrari".

Mas os personagens são muito diferentes, né? Acho que a única coisa realmente em comum é a relação com Fórmula 1, mas são épocas completamente opostas e personalidades diferentes.

Eu diria que a única coisa que realmente foi interessante, enquanto bagagem de um para o outro, foi a prática que eu tive no "Ferrari" de Autódromo, depois nas cenas dirigindo e tal. Isso me deu uma noção maior sabe a respeito de pilotar um carro de corrida, de detalhes, de características desse universo, né?

Foi um mergulho que eu tive ali no universo da Fórmula 1 que me serviu obviamente muito para o "Ferrari", mas que ficou comigo também e, sei lá, um ano depois ainda estava dentro de mim e que eu consegui carregar também para o "Senna".

Mas são projetos completamente não tem nada a ver um com o outro. O personagem não tem nada a ver com o outro, nem caracterização, nem jeito, nem nada.

Em "Ferrari", o de Portago, primeiro por ser um filme também, ele está ali dentro desse recorte como a gente falou, né? A gente conta a relação desse personagem com o Ferrari.

Totalmente diferente do mergulho e do desenvolvimento que eu tive com o Senna, que é fazer uma série de seis episódios a respeito da vida dele. Então, assim, um mergulho com uma profundidade, com um desafio maior ainda, né?

Gabriel Leone, Malu Rodrigues e Chay Suede no filme 'Minha fama de mau' — Foto: Páprica Fotografia / Divulgação

G1 - São pessoas muito diferentes, mas você também no cinema já interpretou outro personagem desses, que são maiores do que a vida, que foi o Roberto Carlos no "Minha Fama de Mau". Como é o seu estudo para fazer esses personagens que são tão conhecidos? Você tenta consumir tudo o que há sobre eles? Imagino que com o de Portago não tivesse muita coisa.

Gabriel Leone - Eu gosto muito desse processo de antes da filmagem. Da composição do personagem. O momento da pesquisa, do estudo, dessa proximidade. Então, eu procuro me dedicar e fazer o máximo que eu posso.

Como você já antecipou, o de Portago não tinha tanta coisa. Eu achei um livro dele, meio que uma biografia com algumas informações. Achei um LP com uma entrevista que ele deu para uma rádio falando em inglês.

Então, a gente tinha algumas fotos algumas coisas, mas não muito mais do que isso, né?

Aí, é lógico que existem as referências do projeto. No caso do de Portago, desde a entrada do personagem, o roteiro descrevia ele com uma coisa de Marlon Brando jovem em "O selvagem".

Assim, pela pela vestimenta dele, cigarro na boca, óculos escuros. A energia dele, essa coisa meio playboy, meio Rebelde e tal, por mais que o de Portago fosse um nobre. Ele era um marquês, neto de um rei espanhol.

Então, o Michael me sugeriu fazer aula de dança pra encontrar uma postura, um encaixe. A questão da adrenalina, do carro e a prática que a gente teve — tudo isso são peças que vão somando.

Já no caso, por exemplo, do Roberto. No filme, é um Roberto que muita gente nem lembra direito, né, que era uma TV ali em preto e branco ainda. Época da Jovem Guarda. Você não tem tantos registros em vídeo. Naquela época, que a gente fez, ainda não tinha tantos livros disponíveis, pesquisas e tal.

No caso do Senna já é oposto. É material que não acaba mais, porque ali ele teve a vida quase toda registrada em foto, em vídeo, em documentos, etc.

Dá até uma certa ansiedade, às vezes, de querer dar conta de tudo, ler tudo, ver tudo, mas é impossível.

Mas o que eu te diria é que acima de tudo eu sempre tenho um cuidado muito grande de evitar qualquer tipo de imitação ou de caricatura. Então, a minha busca é de encontrar eles, é de construir eles dentro de mim, que vou ser esse canal para "viver" aquele recorte, a vida a vida desse personagem dentro da ficção.

Todas as vezes que o público começa a assistir a um trabalho nosso é um pacto que a gente faz, que eu estou emprestando meu corpo e a gente está recontando aquela história, que é uma ficção.

É lógico que a gente vai em busca da maior verdade possível, mas eu acho que essa coisa da transformação da incorporação, às vezes a sensação é que uma performance brilhante está mais focada em si do a serviço da história.

Então, é óbvio que eu quero que as pessoas se identifiquem para que esse combinado aconteça, mas ao mesmo tempo eu estou ali a serviço da história, a serviço desse personagem. A minha performance e o meu ego — nada disso pode ser maior.

Mas eu adoro, cara, me transformar, mudar de sotaque, fisicamente, etc. É a coisa que mais me dá prazer na minha profissão.

Gabriel Leone em cena de 'Ferrari' — Foto: Lorenzo Sisti/Divulgação

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