A humanidade é uma civilização isolada em nosso pequeno planeta e distante de qualquer outra forma evoluída de vida alienígena que possa existir. E como um náufrago, às margens do imenso oceano cósmico, nós lançamos nossas garrafas com mensagens, esperando que o acaso as leve até outros seres que, como nós, também anseiam por encontrar qualquer evidência que prove que eles não estão sozinhos no Universo. Mas essas mensagens, não foram enviadas em um papel enrolado dentro de uma garrafa de vidro. Elas foram gravadas em discos e placas douradas enviadas para uma viagem interestelar a bordo das sondas Pioneer e Voyager.

Só que tentar estabelecer uma comunicação com uma civilização alienígena não é uma tarefa simples. É algo ainda mais desafiador do que tentar ensinar música clássica para um gato que gosta mesmo é de funk. O problema é que não sabemos como eles percebem o Universo, quais seus sentidos, sua lógica e sua forma de processar informação. Não fazemos a menor ideia se eles se comunicam através de símbolos, sons ou qualquer outro meio que possamos imaginar. 

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Mas uma coisa é certa. Se no futuro, existir alguma civilização alienígena com tecnologia para viajar pelo espaço, e a capacidade de resgatar as nossas sondas espaciais, eles certamente vão compreender uma linguagem comum, que também guiou o desenvolvimento humano: a linguagem da Ciência.

Por isso, no início dos anos 70, quando as  sondas Pioneer 10 e 11 partiram em uma audaciosa jornada para além do Sistema Solar, levaram consigo uma mensagem escrita por cientistas, utilizando a linguagem universal da Ciência. A mensagem foi gravada em uma placa de alumínio anodizado em ouro e projetada pelo astrônomo Carl Sagan e pelo astrofísico Frank Drake, para servir como uma espécie de cartão postal interestelar endereçado ao acaso cósmico. 

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capa
[ Concepção artística da sonda Pioneer 10 – Créditos: Don Davis / NASA ]

Qualquer ser extraterrestre que possa porventura recebê-lo no futuro, saberá que em algum momento da história do Universo, se desenvolveu neste canto  da galáxia, uma forma de vida inteligente, capaz de explorar o Cosmos. No lado direito da placa está o remetente. As figuras humanas, um homem e uma mulher, foram desenhadas para representar nossa espécie e sua anatomia básica. Alguns críticos conservadores não gostaram da história de enviar nudes na primeira mensagem. Talvez preocupados com a inocência das crianças alienígenas…

Junto a estas figuras existe uma representação da própria Pioneer, fornecendo uma ideia de escala dos seres humanos. A placa também apresenta um mapa com a posição do Sol em relação a 14 pulsares conhecidos e ao centro da galáxia, e um diagrama do sistema solar, destacando o terceiro planeta como sendo a origem da sonda. E para estabelecer unidades comuns de tempo e espaço, também há uma representação da transição hiperfina do hidrogênio. Como o hidrogênio é o elemento mais abundante no Universo, Sagan e Drake consideraram que uma civilização alienígena desenvolvida poderia reconhecer o fenômeno atômico naquele diagrama. O comprimento e o período da onda eletromagnética gerada pela transição hiperfina do hidrogênio deveria ser assumidas como unidades comuns de medida de tempo e espaço. 

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[ Réplica da placa dourada enviada com as sondas Pioneer 10 e 11 para além do Sistema Solar. Acima e à esquerda, o diagrama que representa a transição hiperfina do hidrogênio. A direita, a localização do Sol em relação a 14 pulsares próximos. Abaixo, uma representação do Sistema Solar e da Pioneer partindo do terceiro planeta e, à direita, as figuras humanas com a Pioneer ao fundo – Imagem: BBC ]

Já as sondas Voyager 1 e 2, lançadas em 1977, elevaram o nível e a complexidade da mensagem. As Voyager que hoje são os artefatos construídos pelo homem mais distantes da Terra, carregam consigo o famoso “Disco de Ouro”, um disco fonográfico contendo saudações em 55 idiomas, músicas de diferentes culturas, sons da natureza e uma seleção de imagens codificadas da vida em nosso planeta.

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A capa do disco apresenta instruções detalhadas para a reprodução do conteúdo, além da localização do nosso Sistema Solar, utilizando os mesmos diagramas das placas enviadas com as Pioneers. Para evitar o cancelamento em grupos alienígenas ultraconservadores, as Voyagers não mandaram nudes desta vez… 

[ Disco de Ouro da Voyager. As figuras humanas foram substituídas por instruções detalhadas de como “tocar” o disco para reproduzir os sons e as imagens da Terra – Imagem: NASA ]

Ainda assim, o Disco de Ouro é fascinante! Uma tentativa de compartilhar a riqueza e a diversidade da vida na Terra com qualquer ser inteligente que possa encontrá-lo e decifrá-lo no futuro. Ele representa uma aposta na universalidade da ciência e da arte como formas de expressão e comunicação. Os símbolos e diagramas utilizados, baseados em princípios científicos e matemáticos, assumem que esses conceitos são compreensíveis por qualquer civilização tecnologicamente avançada. 

As placas das sondas Pioneer e Voyager são como garrafas lançadas à deriva no imenso oceano cósmico. Testemunhas da curiosidade humana, e da nossa audácia em flertar com o desconhecido. Nós sabemos que as chances de recebermos uma resposta dessas mensagens são infinitamente pequenas, dada a vastidão do Universo e a baixa velocidade com que as sondas navegam pelo espaço interestelar. 

[ Uma das imagens codificadas no Disco de Ouro da Voyager: crianças de diversas nacionalidades e etnias reunidas em torno de um globo que representa o planeta Terra – Créditos: UN Photo/Yutaka Nagata ]

Protegidas pelo vácuo do espaço, as Pioneers e Voyagers devem ter vida mais longa do que a própria humanidade. Então quem sabe, daqui alguns milhões ou bilhões de anos, alguma civilização alienígena destampe essa garrafa. Mesmo que nossos sinais de rádio já tenham se calado há muito tempo, mesmo se não houver mais nenhum vestígio dos seres humanos na superfície da Terra, as sondas Pioneer e Voyager, terão preservadas as nossas mensagens para o Cosmos. As últimas lembranças de uma civilização que habitou o terceiro planeta de uma estrela mediana da periferia da galáxia. Uma civilização capaz de explorar o espaço profundo e de bolar formas engenhosas de marcar a sua existência na história do Universo.