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6 de Junho de 2024
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    A Lei Complementar n. 173/2020 e a progressão funcional dos servidores públicos

    Publicado por Rodrigo Pugliesi Lara
    há 4 anos

    A Lei Complementar n. 173/2020 foi editada com o objetivo de instituir uma espécie de ‘regime fiscal provisório’ para enfrentamento à pandemia do novo coronavírus, possibilitando o reequilíbrio das finanças públicas por meio, dentre outras medidas, da suspensão do pagamento de dívidas contraídas pelos entes federativos em face da União, da distribuição de recursos públicos para o combate à doença e da restrição ao crescimento da despesas públicas, especialmente as relacionadas à folha de pagamento dos servidores e empregados públicos.

    Nesse ponto, a referida lei complementar criou uma série de restrições (artigo 8º), aplicáveis até 31 de dezembro de 2021, aos entes federativos afetados pela calamidade pública decorrente da pandemia. É o caso, por exemplo, da restrição ao aumento da remuneração dos agentes públicos, a alteração de estrutura de carreira, a admissão ou contratação de pessoal, a majoração de vantagens ou auxílios, a contagem de tempo como período aquisitivo para a concessão de adicionais por tempo de serviço e licença-prêmio, entre outros.

    Não obstante a constitucionalidade da referida lei esteja sendo discutida em diversas ações inconstitucionalidade, das quais se destaca, pela evolução de sua tramitação, a ADI 6.447-DF, é certo que muitos gestores públicos vêm manifestando uma série de dúvidas acerca da aplicação da novel legislação, sendo uma delas uma possível vedação à continuidade dos processos de progressão funcional dos agentes públicos, tendo em vista que tal medida gera impacto nas despesas com pessoal.

    Isto porque o seu artigo 8º, I, veda a concessão “a qualquer título, vantagem, aumento, reajuste ou adequação de remuneração a membros de Poder ou de órgão, servidores e empregados públicos e militares, exceto quando derivado de sentença judicial transitada em julgado ou de determinação legal anterior à calamidade pública”.

    Por sua vez, o inciso IX – talvez o mais controverso dentre todos do artigo – veda o cômputo do tempo, entre a publicação da Lei Complementar 173 e 31 de dezembro de 2021, “como de período aquisitivo necessário exclusivamente para a concessão de anuênios, triênios, quinquênios, licenças-prêmio e demais mecanismos equivalentes que aumentem a despesa com pessoal em decorrência da aquisição de determinado tempo de serviço, sem qualquer prejuízo para o tempo de efetivo exercício, aposentadoria, e quaisquer outros fins”.

    Como visto, tratam-se de medidas que objetivam a contenção de gastos com pessoal dos entes públicos que, muito embora compreensíveis diante do atual contexto de pandemia e depressão econômica, devem ser cuidadosamente interpretadas, a fim de se evitarem situações que, possivelmente, seriam revertidas pelo Poder Judiciário, implicando, a longo prazo, em maiores dispêndios de recursos públicos.

    Nesse ponto, entendemos que as referidas vedações não atingem, como regra, a manutenção dos processos de promoção e progressão funcional dos servidores públicos, seja pelo fato de tais medidas derivam de diplomas legais anteriores à declaração de calamidade pública nacional, quanto pelo fato de que a evolução de padrão remuneratório depende, como regra, do preenchimento de outros critérios por parte do servidor, além do tempo de serviço.

    Quanto ao primeiro argumento, nota-se que, em regra, a maioria dos diplomas legais que tratam de progressão funcional de servidores públicos foram editados anteriormente à declaração de calamidade pública, como é o caso, por exemplo, da Lei 10.593/2002 que, dentre outros pontos, trata da progressão dos servidores das carreiras de auditores da Receita Federal e de auditores-fiscais do Trabalho.

    Ora, uma vez que o próprio inciso I, do artigo , da Lei Complementar 173/2020, ressalva os aumentos ou reajustes derivados de determinação legal anterior à calamidade pública, é possível concluir que a progressão funcional do servidor público, quando decorrente de legislação anterior à decretação da calamidade pública nacional, não foi objeto de vedação pela novel legislação, não havendo, por exemplo, impedimento à continuidade dos processos de avaliação de desempenho e da contagem dos interstícios mínimos para fins de progressão.

    Por sua vez, quanto ao segundo argumento abordado acima, é certo que, como regra, os processos de progressão funcional dependem, além do critério puramente cronológico, também do atingimento de nota mínima pelo servidor em avaliação de desempenho individual[1].

    Nesse ponto, nota-se que o inciso IX, do supracitado artigo 8º, também não obsta a manutenção dos processos de progressão funcional, visto que tal dispositivo tem como objetivo suspender a contagem de tempo como de período aquisitivo necessário “exclusivamente para a concessão de anuênios, triênios, quinquênios, licenças-prêmio e demais mecanismos equivalentes que aumentem a despesa com pessoal em decorrência da aquisição de determinado tempo de serviço”.

    Assim, conforme explicado acima, uma vez que o tempo de serviço consiste tão somente em um dos critérios a ser considerado, é certo que a progressão funcional não decorre “exclusivamente da aquisição de determinado tempo de serviço”, inexistindo, portanto, qualquer vedação legal à sua continuidade no período compreendido entre a publicação da Lei Complementar 173/20 e 31 de dezembro de 2021.

    Vale dizer que, embora, até o momento, o referido posicionamento não tenha sido objeto de análise pelo Poder Judiciário, já vem sendo adotado no âmbito da Administração Pública Federal, consoante se extrai da Nota Técnica SEI 20581/2020 do Ministério da Economia[2] e do Parecer SEI 9357/2020 da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional[3].

    Nesse contexto, observa-se que o artigo da Lei Complementar 173/20 – em especial os incisos I, II, III, VI, VII e VIII – mostra-se, a nosso ver, muito mais dirigido ao legislador, do que propriamente ao gestor público, na medida em que evidente sua intenção essencialmente prospectiva, ao vedar a criação de novas vantagens e benefícios, bem como a majoração de remuneração e reestruturação de carreiras que não tenham como base legislação anterior à calamidade pública. Foi essa, inclusive, a conclusão a que chegou a Procuradoria Federal em consulta formulada pela Universidade Federal de Goiás[4]. Senão vejamos:

    Nesse sentido, a norma traz vedação dirigida ao legislador ordinário e as chefes de poderes, e não ao administrador público.

    A partir dessas premissas é possível concluir que não há qualquer vedação para a concessão de promoções, progressões, retribuição por titulação ou qualquer outro benefício já previsto na legislação ordinária vigente no momento da publicação da LC 173.

    Com base nesse entendimento, é possível afirmar que as vedações constantes dos incisos I, II, III, VI, VII e VIII estão dirigidas exclusivamente aos Entes Federativos, e não aos administradores, na aplicação do ordenamento jurídico vigente. (grifamos)”

    Não obstante o entendimento acima, tendo em vista que a questão já foi objeto de ação de inconstitucionalidade, resta esperarmos a posição do Supremo Tribunal Federal acerca da correta interpretação do dispositivo legal analisado.

    1. Nesse sentido, prevê a Lei 10.593/2002, em seu artigo , § 4º, inciso I, em sua redação dada pela Lei 13.464/2017:

      Art. 4º O desenvolvimento do servidor nas carreiras de que trata esta Lei ocorrerá mediante progressão funcional e promoção.

      § 4º Os critérios e procedimentos específicos para o desenvolvimento nos cargos das carreiras Tributária e Aduaneira da Receita Federal do Brasil e de Auditoria-Fiscal do Trabalho serão regulamentados por ato do Poder Executivo federal, observados os seguintes requisitos:

      I - para fins de progressão funcional:

      a) cumprir o interstício de 12 (doze) meses de efetivo exercício em cada padrão.

      b) atingir percentual mínimo na avaliação de desempenho individual, nos termos de ato do Poder Executivo federal;

    2. Disponível em: http://www.consultaesic.cgu.gov.br/busca/dados/Lists/Pedido/Attachments/893789/PEDIDO_Nota%20Tcnica%20SEI%2020581-2020%20-%20SEI_ME%208310399%20-%20com%20destaques.pdf.Acesso em 22.07.2020 às 16:25.

    3. Disponível em: http://www.consultaesic.cgu.gov.br/busca/dados/Lists/Pedido/Attachments/893789/RESPOSTA_RECURSO_1_PARECER_SEI_9357_2020_ME-1.pdf. Acesso em 22.07.2020 às 16:40.

    4. Disponível em: https://files.cercomp.ufg.br/weby/up/64/o/NOTA_DAP_PROPESSOAS_UFG.pdf?1591637101. Acesso em 23.07.2020 às 14:39.

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    Artigoshá 2 anos

    Você que é Servidor Público sabe se possui direito à Sexta-Parte?

    Alan França de Lima, Advogado
    Artigoshá 4 anos

    Estão congeladas as progressões dos servidores públicos após a Lei Complementar 173/2020?

    1 Comentário

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    Douglas Lucas
    3 anos atrás

    Sou professor e funcionário público estável. Como assegurado no Estatuto do Magistério do município aonde exerço minhas atividades, tenho direito a "progressão vertical", uma vez que terminei meu mestrado semana passada. Gostaria de saber se posso já receber essa progressão, só vou poder receber no término do tempo estabelecido pela LC 173 (31/12/2021). Desde já agradeço! continuar lendo