Quando Salma Plaza recebeu a notícia de que tinha esclerose múltipla, “o tempo parou” e ela ficou “à beira de um desmaio”. "Como se minha vida escorresse repentinamente pelo ralo", diz. Ela é uma personagem fictícia, protagonista do romance "La fragilidad de los cuerpos", recentemente publicado pela editora Penguin Books.
A autora, Anita Botwin, recebeu o mesmo diagnóstico há 12 anos, mas a reação foi muito diferente.
— Sou muito hipocondríaca e, depois de sentir formigamento nas pernas e passar por uma série de exames, esperava algo muito pior. Eu tinha visto de perto a doença em minha cunhada, que conseguia levar uma vida normal. Então, senti quase um alívio quando me disseram. Pensei: pelo menos não vou morrer disso.
Botwin está ciente de que as palavras "esclerose múltipla" ressoam em muitas pessoas da mesma forma que na cabeça de seu personagem ao ouvir a notícia: "Não é possível que isso aconteça comigo. Eu não posso acabar em uma cadeira de rodas, tão jovem".
Em seu segundo livro sobre a doença — o primeiro, "Pies de Elefante", foi um ensaio —, ela acredita que pode dar "esperança" aos pacientes ou familiares de quem sofre dela.
— Principalmente para aqueles que acabaram de ser diagnosticados, e que naturalmente ficam assustados ao ouvir essas duas palavras. Mas temos muita sorte, porque foi feita muita pesquisa e tratamentos muito bons foram desenvolvidos — explica.
Nos 12 anos em que foi diagnosticada, Botwin não sofreu muitas crises, que são surtos repentinos e prolongados de determinados sintomas que, embora não sejam irreversíveis, podem levar a uma piora.
— Agora estou pior, mas também porque o tempo passou e todos estamos piores do que há 12 anos — brinca. O formigamento nas pernas desapareceu e ela não tem nenhum problema de mobilidade.
A esclerose múltipla é chamada de doença das mil faces, porque em cada paciente pode se manifestar e progredir de forma muito diferente. O principal sintoma de Botwin é a fadiga.
— A bateria se esgota mais cedo do que eu gostaria. Depois de sete horas por aí, vejo as pessoas como se nada estivesse acontecendo, e estou exausta e talvez não entenda bem as coisas. Você tem que controlar isso um pouco e planejar bastante.
A esclerose múltipla é uma doença crônica autoimune que afeta mulheres em 70% a 80% dos casos, muito frequentemente em idade reprodutiva, geralmente entre 20 e 40 anos, com uma idade média de 30 anos. No mundo, estima-se que 2,8 milhões de pessoas possuem o diagnóstico da doença, de acordo com dados da Sociedade Espanhola de Neurologia (SEN).
O que a doença faz é destruir a mielina, a camada protetora que envolve as fibras nervosas, interferindo na transmissão dos impulsos nervosos. Por isso, os sintomas são muito variados e frequentemente imprevisíveis. Eles incluem fraqueza muscular, dificuldades de coordenação e equilíbrio, problemas de visão, fadiga extrema e alterações na sensibilidade.
Seus mecanismos exatos ainda são desconhecidos, mas os pesquisadores acreditam que pode ser devido a uma combinação de fatores genéticos e ambientais e é considerada autoimune porque é o sistema imunológico que ataca por engano o próprio tecido do corpo. Recentemente, descobriu-se que o vírus Epstein-Barr, da família dos herpesvírus — responsável pela mononucleose —, é a principal causa.
Até meados dos anos 90, não havia medicamentos para a esclerose múltipla. Desde então, eles começaram a se disseminar e deram um grande salto desde 2010, mudando completamente o prognóstico dos pacientes. Ana Belén Caminero, coordenadora do Grupo de Estudo de Esclerose Múltipla da SEN, explica que antigamente, em cerca de 10 ou 15 anos desde o diagnóstico, era comum desenvolver problemas de mobilidade e, a partir daí, em mais alguns anos, acabar em uma cadeira de rodas.
Os novos medicamentos conseguem controlar os surtos. Como são relativamente novos e essa doença é de progressão lenta, não se sabe exatamente quanto tempo retardam sua progressão, mas está se observando que pelo menos conseguem prolongar a qualidade de vida por uma década.
— O que ainda não podemos fazer é controlar a progressão independente das crises. Ou seja, o processo neurodegenerativo que avança mais lentamente e se manifesta após muitos anos — explica Caminero, acrescentando que existem pesquisas avançadas tentando também atacar esse problema e que, na melhor das hipóteses, podem estar disponíveis em alguns anos.
Mudança de vida
Apesar dos avanços e de sua doença não ter piorado de forma evidente, Botwin também não quer amenizar o que significa ter esclerose múltipla. Sua vida mudou. Ela trabalhava como freelancer para meios de comunicação e percebeu que a fadiga causada pela doença não permitia que ela fosse tão produtiva quanto o exigido pelo setor.
Ela procurou alternativas, montou uma empresa com outros colegas para ver se, sendo sua própria chefe, poderia ditar o ritmo.
— Queria tentar, mas no final você trabalha mais. Com isso, também não quero desanimar ninguém, talvez você tenha esclerose múltipla e seu único sintoma seja ter uma visão um pouco embaçada, como acontecia com minha cunhada — conta. Ela decidiu mudar sua carreira profissional, estudou para um concurso público e hoje é funcionária do governo da Comunidade de Madri. Agora, ela só escreve por prazer.
Atualmente, ela é muito mais suscetível a infecções. Os tratamentos imunossupressores que ela toma "a fazem pegar todas", e durante a pandemia, por exemplo, ela foi extremamente cuidadosa. Sua perspectiva em relação à maternidade também mudou radicalmente.
— Não falo muito sobre isso, mas decidi desistir dela, e eu queria ser mãe a todo custo. É uma decisão muito difícil. É uma doença em que ninguém sabe o que vai acontecer, você não sabe como vai estar amanhã e me pareceu uma responsabilidade enorme trazer uma vida a este mundo.
Além disso, ela procura não pensar muito sobre o que o futuro lhe reserva ou como sua doença evoluirá, porque, embora os tratamentos estejam funcionando muito bem, é impossível prever seu estado daqui a 10 ou 20 anos.
— O que mais me importa é defender o sistema de saúde pública, que ainda é muito bom, porque é o que realmente pode me ajudar e a outras pessoas com esclerose múltipla — conclui.
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