Preta Gil, Simony e Fabiana Justus são três figuras que nos últimos anos falaram abertamente sobre tratamentos de câncer nas redes sociais. O movimento das três, dizem especialistas em saúde, ajuda a iluminar o caminho de quem passa por diagnósticos semelhantes e ajuda a afastar o tabu ao redor da doença.
— A rede social utilizada enquanto uma ferramenta de suporte coletivo é muito salutar, pois um paciente vai apoiando outro, que apoia outro, e assim por diante. São redes de solidariedade que funcionam muito bem — diz Alfredo Scaff, consultor médico da Fundação do Câncer. — As redes ajudam a quebrar um tabu, por falar abertamente disso. O diagnóstico de câncer não é uma coisa fácil, afeta toda a família.
Os especialistas chegam a celebrar esse tipo de movimento, pois há não muito tempo, alguns pacientes se recusavam até mesmo a falar a palavra “câncer” tamanho o estigma. O medo de lidar com o tratamento, e seus efeitos adversos, ainda aparece nos consultórios, é evidente, mas falar abertamente sobre o tema com uma comunidade que entende suas dificuldades ajuda o paciente a atravessar essa fase com mais serenidade e a entender que certos temores e inseguranças fazem parte do caminho.
— Antes das redes, as pessoas assistiam muito aos filmes sobre pessoas com câncer. A referência que eles tinham era que todos que faziam químio ficavam logo carecas, vomitavam em baldes pois passavam muito mal o tempo todo. Quando vou começar com a químio com algum paciente, peço para eles se livrarem dessa ideia mais antiga — afirma Emili Galvani, oncologista do Hospital Oswaldo Cruz. — As redes ajudam a aliviar o medo e a angústia. As pessoas hoje contam no consultório outras experiências que ouviram de pessoas que vivem coisas parecidas e tornaram isso público.
A psicóloga Vera Bifulco, do comitê científico do Instituto Lado a Lado pela Vida, explica que falar publicamente sobre o tratamento é uma forma de ter suas emoções e experiencias validados, passo importante para lidar com o momento desafiador.
— Todos queremos ser ouvidos. Na grande maioria das vezes, o paciente se beneficia muito ao contar como se sente em relação ao que está passando. É preciso, porém, estar preparado (para essa exposição) — avalia a especialista. — É muito importante saber que outra pessoa em situação semelhante também teve medo. Por mais esperançosos que sejamos, momentos de incertezas são comuns.
nutricionista Paula Monteiro, de 41 anos, em tratamento para câncer de mama, foi uma das pessoas que sentiu essa onda de carinho ao se abrir em seu perfil no Instagram, que antes era utilizado para divulgar seu trabalho. Com o diagnóstico, veio a vontade de contar um pouco mais sobre a quimioterapia.
— Foi difícil começar a falar, mas logo que iniciei, passei a receber mensagens lindas de pessoas conhecidas. Aos poucos, outras mulheres que não eram próximas, me escreveram dizendo que estavam com exames atrasados e decidiram fazer após ver minhas postagens. Respeito meu tempo (entre uma postagem e outra), pois depois da químio tenho dias difíceis, mas assim que me sinto melhor volto a postar— afirma. — Recebo lindos textos de força, de carinho, tanto de família quanto de pessoas que nem conheço. Há pessoas na cidade em que moro, em Arujá, na Grande São Paulo, que me conhecem de vista, mas ao saberem do tratamento, me procuram para me desejar força.
Ao receber o diagnóstico, Paula entrou em um grupo de conversa com diversas mulheres que têm diagnósticos semelhantes, mas estão em fases distintas do tratamento.
— Estamos inclusive combinando de nos encontrar pessoalmente — alegra-se.
Também com câncer de mama, mas já em estado remissivo, a esteticista Nathalia Pazetti, de 31 anos, passou a postar nas redes o avanço de seu tratamento desde a segunda semana de cuidados.
— Muitas pessoas que me seguem também fazem o mesmo tratamento. É uma espécie de diário, no qual eu poderei, no futuro, revisitar tudo o que eu passei e ver até onde cheguei — afirma. — Há quem diga que a minha mensagem leva apoio, conforto, recebo muitos relatos desse tipo por quem segue. Nas redes encontramos um tipo de entendimento que talvez não seja fácil de achar em outro lugar.
Fake news
Os médicos, contudo, alertam que esse tipo de contato é benéfico quando não sugere mudanças no tratamento medicamentoso. Esse tipo de relação, explicam os especialistas, deve manter-se na ala do apoio mútuo, sem influenciar nas orientações do consultório.
— Nesses momentos, vale ter o mesmo cuidado necessário com qualquer informação que se vê na internet. Um exemplo, é buscar informações em páginas de especialistas médicos — afirma Tatiane Montella, Oncologista da parceria Casa de Saúde São José e Oncoclínicas. — Independentemente do que vê na internet, o paciente deve tirar suas dúvidas com seu time de especialistas multidisciplinares, que o acompanha no consultório.