Evento de juristas em São Paulo ressalta a importância da liberdade de expressão - Litoral Hoje

Evento de juristas em São Paulo ressalta a importância da liberdade de expressão

O Instituto dos Advogados de São Paulo (IASP) realizou, na manhã desta quinta-feira, 16, um evento para discussão sobre o livro Liberdade de Expressão e Direito à Informação. A sessão contou com a presença do presidente do IASP, Renato de Mello Jorge Silveira, e da ex-ministra do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Eliana Calmon.

Estavam presentes também quatro dos doze coautores da obra. São eles: Carlos Alberto Dabus Maluf, Ricardo Peake Braga, Luiz Augusto D’Urso e André Marsiglia. Confira a lista completa dos responsáveis pela obra:

“Não se deve cair na tentação de um discurso fácil, de cerceio da liberdade”, afirmou o presidente do IASP, sobre a importância de lutar pela liberdade de expressão. “Pelo intelectual cabe o questionamento e o perene questionamento. Essa é a nossa missão. Essa é a missão do Instituto dos Advogados de São Paulo. Não de hoje, mas de sempre.”

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Carlos Alberto Dabus Maluf, professor titular sênior de Direito Civil da USP e conselheiro da IASP, falou sobre o histórico da liberdade de expressão. Aos 77 anos, compartilhou suas próprias vivências sobre esse tema tão importante na vida das pessoas.

“Sei o que se passou no Brasil nos últimos 60 anos”, afirmou Maluf. “Estava na faculdade. Não é que ouvi. Eu estava e vivi os anos de 1966, 1967 e 1968.”

Liberdade de expressão — o que é e o que não é

O advogado e também conselheiro da IASP Ricardo Peake Braga complementou a fala de Maluf. De maneira sucinta, o jurista explicou o que é o que não é a liberdade de expressão. Braga também percorreu pela história da humanidade e explicou que o direito de fala foi conquistado pelos povos com o passar dos anos.

“Na antiguidade não havia esse conceito de liberdade de expressão”, afirmou o jurista. “Exemplos mais conhecidos que temos disso é a condenação de Sócrates justamente por crime de opinião. E também de Jesus Cristo de certa maneira. Os puritanos na Inglaterra se viam ameaçados pela poderosa Igreja Católica, e de outro lado pela já poderosa Igreja Anglicana. Embora fossem em grande quantidade, eles se viam ameaçados por essas duas instituições. Então se tornaram grandes defensores da liberdade de expressão e da crença.”

O apresentador também citou uma frase de Cecília Meireles, na qual diz que a “liberdade é uma palavra que o sonho humano alimenta, não há ninguém que explique, não há ninguém que entenda”. No entanto, segundo ele, todos sabem o que é sentir a liberdade.

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“A liberdade está na base de toda a teologia cristã”, afirmou o advogado. “No livro Gênesis, quando Adão e Eva cometem o pecado original, estão cometendo uma liberdade que foi concedida a eles, porque Deus entendeu que só fazia sentido para o ser humano existir corretamente sendo livre, tomando sua decisão com base na sua liberdade.”

Ao citar uma passagem da mitologia grega, o profissional afirma que a liberdade de falar e se expressar é um direito de todos, independentemente do cargo exercido. “Não existe alguém que vale a mais do que o outro, porque esse dom foi distribuído indistintamente”, afirmou o conselheiro. “Isso é muito importante, ao contrário do que pensam alguns dos nossos ministros do Supremo Tribunal Federal. Eles não são mais iluminados que os outros.”

Redes sociais, fake news e liberdade de expressão

Ao avançar na linha cronológica do comportamento humano, o advogado especialista em Direito Digital, Luiz Augusto D’Urso, contextualiza a liberdade no mundo virtual. D’Urso fala sobre a censura aplicada no âmbito digital e como a regulamentação pode vir a afetar a vida das pessoas. Ele também explica como a velocidade de propagação da informação foi aumentada.

“O indivíduo que estimulava algum tipo de ódio, ou era censurado, era feito de maneira pontual”, afirmou D’Urso. “Hoje, quando o indivíduo utiliza da internet, atinge uma massa muito grande. De fato a grande imprensa tem uma forma de atingir a massa, mas a internet também. Com R$ 7 de impulsionamento, você atinge 2 mil usuários. Se você tiver um bom dinheiro, pode facilmente atingir quase a população do Brasil.”

O especialista explicou que, com o advento da internet, responsabilizar alguém ficou mais difícil por causa do anonimato dos usuários. Segundo ele, a capacidade de uma só pessoa gerenciar robôs falsos também é um perigo para a formação de opinião das pessoas. “Isso manipula”, diz. “Isso altera a própria democracia, porque se eu criar uma campanha dizendo que determinado candidato cometeu tal crime, isso muda as coisas.”

Uma publicação partilhada por IASP (@iasp.oficial)

Uma outra questão levantada pelo advogado foi sobre a censura aplicada pelas próprias plataformas. Ele alegou que os termos de uso podem vir a cortar o alcance dos usuários, caso façam algo que não esteja alinhado com as diretrizes das empresas.

“As redes sociais podem nos censurar”, afirmou o jurista. “Porque se você ferir aquele contrato de adesão que você assina sem ler, eles têm o direito de te banir, suspender conteúdo e diminuir seu alcance.”

No que diz respeito ao cerceamento da liberdade por parte das plataformas, D’Urso mencionou o ato de shadow banning. “O shadow banning é remover o alcance daquele usuário sem ele saber que ele tem restrição”, explicou. “Então, você publica hoje e atinge 10 mil usuários. No dia seguinte, você atinge 100 pessoas. E, de uma hora para outra, você não atinge mais ninguém, mesmo tendo centenas de seguidores.”

Imprensa e redes sociais não se equiparam juridicamente

O advogado constitucionalista André Marsiglia analisou todas as apresentações da mesa a partir de um ponto de vista constitucional. O jurista passou a se dedicar ao tema liberdade de expressão a partir do ano de 2019. Segundo ele, foi o primeiro advogado a integrar o Inquérito das Fake News do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes.

“Como seu primeiro ato, o ministro Alexandre de Moraes determinou a censura da revista Crusoé”, disse o advogado. “Eu, como advogado da revista Crusoé, passei a atuar no Inquérito das Fake News, mal sabendo que não iria conseguir nada. Eu tinha expectativa de que teria acesso aos autos. Claro, nada disso se comprovou.”

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Ao longo da apresentação também foi comentada a discrepância entre jornalismo e rede social. Para Marsiglia, isso não existe. As pessoas trocaram o tradicional jornal por uma informação mais rápida e objetiva — geralmente, através de um post no Instagram ou no Twitter/X.

“Existe um preconceito entre jornalismo e redes sociais e também um sentimento errado, na minha visão, de que se houver um maior controle das redes sociais, haverá uma higienização do debate público suficiente e as pessoas recorrerão a esse mundo mágico do jornalismo”, afirmou ele.

Ao comentar a regulamentação das mídias sociais, e fazendo uma ligação ao iminente perigo com a censura, o advogado relembrou a situação com um cliente. Na ocasião, foi travada uma batalha na Justiça para discutir se o conteúdo seria retirado ou não. 

“A juíza me recebeu e disse assim: ‘Doutor, qual é o problema de tirar do ar?’”, contou o advogado. “Falei: ‘excelência, a pergunta está equivocada. A pergunta é por que não deixar no ar?’, porque a exceção é retirar — a exceção não é ficar. Então, a pergunta não pode ser qual o problema de retirar. Tem todo o problema de retirar se você parte da premissa que retirar não é um problema.”

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Fonte: Revista Oeste


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